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Mercado

Açúcar: Precisamos melhorar sempre

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*Por Arnaldo Correa

A semana foi de queda para o contrato futuro de açúcar em NY. Março/22, o primeiro vencimento, encerrou a sexta-feira cotado a 19.77 centavos de dólar por libra-peso, uma retração de 29 pontos em relação à semana anterior, representando um encolhimento de 6.40 dólares por tonelada. O vencimento maio/22 encerrou com apenas 9 pontos de baixa. Todos demais contratos na curva que vai de julho/22 até julho/24 tiveram variação positiva de 5 dólares por tonelada em média.

Correndo o risco de soar como um disco quebrado, o fato é que a atividade no mercado físico diminuiu, afirmação que pode até ser contraditória diante dos fortes fundamentos do açúcar, mas a nosso ver, apenas reflete a desaceleração do giro comercial global com as empresas trabalhando da mão pra boca, reduzindo estoques e postergando novas compras até que se sintam confortáveis com a eventual recuperação do mercado.

Entra no racional das tradings – provocando essa desaceleração – a elevação no preço dos fretes marítimos que tem sugado as margens de lucro. Especialistas no mercado de frete marítimo não acreditam que ele chegue aos níveis palatáveis para as tradings antes do último trimestre de 2022.

No médio prazo, acredito que a perspectiva dos preços do açúcar é positiva. As usinas brasileiras devem estar fixadas hoje perto de 40% do volume a ser exportado na safra 22/23, que se inicia em abril do próximo ano. Nesse momento, ninguém acredita em produção de cana no Centro-Sul em 22/23 superior a 550 milhões de toneladas de cana, que pode impactar os preços, pois esse volume vai ser insuficiente para atender à demanda crescente de combustíveis no País e os compromissos de exportação de açúcar.

O petróleo continua galgando preços mais altos no mercado internacional reforçando a tese de que podemos ver três dígitos nos preços no ano que vem. Ou seja, aproximadamente 25% de aumento. O impacto de uma elevação dessa magnitude para o consumidor dada a estrutura na formação de preços da gasolina no Brasil é de 10% de aumento que – se combinado com o enfraquecimento do real em ano de eleições presidenciais turbulentas – pode ser explosiva.

O maior risco que o setor corre hoje é ver a mistura de etanol na gasolina ser reduzida pelo governo federal por conta de um potencial problema de desabastecimento. Esse é um cenário que deve ser evitado a qualquer custo, pois coloca em xeque a expansão, a consolidação e a sustentabilidade do setor.

Outro risco é a migração dos produtores de cana para outras culturas que oferecem melhor rentabilidade, maior flexibilidade e maior disponibilidade de instrumentos financeiros que lhes permitam maximizar os ganhos na produção. Veja a soja, por exemplo. O produtor da leguminosa consegue por meio de uma operação de barter, com emissão de CPR junto às principais empresas de fertilizantes e insumos trocar sacos de soja por unidades desses produtos, se livrando do risco nocivo de variações de preço. O fornecedor/produtor de cana não encontra essa facilidade.

Outro ponto que merece ampla discussão é o Consecana (metodologia que define a remuneração do produtor de cana) que sempre buscou representar com maior transparência possível o valor da cana dentro da cadeia produtiva. Ninguém duvida que se trata de um modelo que fez sucesso a ponto de ser copiado por outros produtos agrícolas. No entanto, modelos precisam ser atualizados de tal maneira que melhorem a efetividade e otimizem resultados na continua busca pela eficiência.

Mas, o que está faltando ao Consecana? Já há alguns anos tenho alertado acerca da ineficiência do indicador quando nos deparamos com mercados invertidos, que é o caso agora. Primeiramente, vamos explicar o que é um mercado invertido: é quando o preço dos contratos futuros com vencimento mais curto é maior do que o preço dos contratos futuros com vencimento mais longo. Isso normalmente ocorre quando existe uma disponibilidade menor do produto ou quando a curva da moeda (real) distorce os preços futuros em centavos de dólar por libra-peso em função da disparidade entre as taxas de juro interna e externa, que é o caso agora. Há outras razões, mas vamos ficar apenas com essas.

E como isso pode afetar o Consecana? Pois bem, relembro o mês de novembro de 2016 quando o açúcar em NY negociava 21.90 centavos de dólar por libra-peso para o vencimento maio/17, primeiro da safra 17/18, que se iniciaria dali a cinco meses. Naquela ocasião, nós recomendávamos a fixação de preços em NY devido a enorme rentabilidade que ela daria.

As usinas resistiram em fixar preços da parte correspondente à cana de terceiros pelo risco de NY continuar subindo e a usina ver minguar a esperada rentabilidade por conta de um Consecana maior. O que ocorreu quando chegamos em abril/2017? Ora, o mercado de açúcar derretera 600 pontos (hoje equivalente a R$ 720 por tonelada). Perderam dinheiro a usina que não fixou porque a cana era de terceiros e o fornecedor de cana porque seu pagamento depende da fixação da usina.

É óbvio que o sistema necessita de ampla discussão para que situações como essa — que ocorrem hoje, por exemplo — não se repitam. Precisamos criar um mecanismo robusto para que todos tirem o maior proveito possível, a usina e o fornecedor/produtor de cana. Do jeito que está, é um sistema perde-perde. Funciona razoavelmente bem em mercados de carrego (o oposto do invertido, ou seja, aqueles em que o preço futuro é maior do que o preço com vencimento mais curto), mas é ineficiente em mercados que demandam um pouco mais de criatividade.

*Arnaldo Luiz Corrêa é diretor da Archer Consulting

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