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Acordo UE-Mercosul acirra tensão entre agricultores e governo francês

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A Comissão Europeia pediu nesta quarta-feira, 3, que os 27 países do bloco aprovem rapidamente o tratado comercial com o Mercosul, prometendo garantias “sólidas” aos produtores rurais, o que foi bem recebido por Paris.

Os comissários europeus aprovaram o texto do acordo no início da tarde, dando o primeiro passo para que o tratado de livre comércio seja submetido aos países membros e ao Parlamento Europeu. Mas o principal sindicato agrícola da França, o FNSEA, diz que ele não é “aceitável”.

“Os receios dos agricultores são conhecidos. Trata-se da importação de carne bovina produzida com aceleradores de crescimento, de aves produzidas com hormônios, com produtos que são proibidos na Europa há 20 anos. Eu respeito todas as formas de agricultura do mundo. Simplesmente, estabelecemos regras na Europa”, afirmou o presidente do sindicato, Arnaud Rousseau.

“Não podemos aceitar que, quando vêm de fora, essas regras não sejam respeitadas. É simples de entender. Ouvimos dizer que a produção de automóveis pode ser motivo de preocupação, mas sempre temos a sensação de que a questão alimentar é um assunto secundário. E o futuro, qual é? É o futuro da nossa produção de carne bovina, que já está em forte declínio”, acredita Rousseau.

Para ele, o futuro da produção de açúcar da França enfrenta “muitos problemas”. “Estou falando do açúcar, estou falando do etanol, é o futuro do mel nacional, que já está em dificuldades com baixas produções e com os impactos das mudanças climáticas”, enumerou.

Ele ainda completa: “Não se pode dizer que, quando se trata da França, as exigências são mais elevadas, o que é compreensível para garantir aos consumidores uma alimentação de qualidade, e quando se trata de outros países, todas as barreiras são eliminadas. Isso não é coerente. Nunca aceitaremos isso”.

Bloco dividido

Os comissários europeus aprovaram o texto do acordo no início da tarde desta quarta-feira, dando o primeiro passo para que o tratado de livre comércio seja submetido aos países membros e ao Parlamento Europeu. Bruxelas espera concluir o processo até dezembro, enquanto o presidente brasileiro Lula ainda ocupa a presidência rotativa do Mercosul.

Até agora, a França liderava a resistência ao acordo. Para convencer o governo francês e acalmar os produtores europeus, a Comissão propôs incluir um “instrumento jurídico” que reforça medidas de proteção para produtos considerados sensíveis.

O bloco promete agir caso as importações afetem negativamente setores como carne bovina, frango, açúcar e etanol. A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, afirmou que ouviu atentamente os produtores e os governos nacionais. “Estabelecemos garantias mais firmes, com força legal, para dar segurança a todos”, escreveu na rede social X.

As medidas foram imediatamente bem recebidas em Paris. A porta-voz do governo, Sophie Primas, disse que a União Europeia “levou em conta as preocupações” da França. Ela ponderou, no entanto, que o governo ainda precisa “analisar com atenção essa cláusula de proteção”.

Bruxelas insiste na necessidade de diversificar parcerias com países considerados confiáveis, diante da concorrência com a China e do aumento de tarifas sobre produtos europeus nos Estados Unidos sob Donald Trump.

O acordo prevê que a União Europeia possa ampliar suas exportações de carros, máquinas, vinhos e bebidas alcoólicas para Argentina, Brasil, Uruguai e Paraguai. Em troca, facilitaria a entrada de carne, açúcar, arroz, mel e soja sul-americanos, o que pode prejudicar setores agrícolas europeus.

Reações e protestos

Desde que as negociações foram concluídas, em dezembro, sindicatos rurais europeus têm se manifestado contra o acordo. O Copa-Cogeca, grupo que representa produtores rurais, acusou a comissão de impor o tratado de forma política e “altamente prejudicial”.

A retomada do debate sobre o Mercosul ocorre em meio a uma crise política na França. O governo pode cair na segunda-feira, 8, durante uma votação de confiança que ameaça o primeiro-ministro francês François Bayrou.

Na oposição, o partido Reunião Nacional já fala em “traição” caso Macron mude de posição sobre o Mercosul. Já o partido de esquerda radical França Insubmissa pede uma “mobilização geral” contra o tratado.

No Parlamento Europeu, o deputado centrista Pascal Canfin anunciou uma iniciativa multipartidária para tentar “suspender a aprovação” do acordo, alegando falta de transparência e de garantias claras.

Um dos pontos mais delicados envolve normas sanitárias e ambientais. Produtores europeus acusam os concorrentes latino-americanos de não seguirem os padrões exigidos pela UE, por falta de fiscalização.

Apesar disso, o acordo tem apoio de vários países europeus, especialmente da Alemanha, que vê nele uma oportunidade de ampliar mercados para sua indústria. Segundo a Comissão Europeia, o tratado pode gerar uma economia de mais de € 4 bilhões por ano em tarifas para exportadores europeus, numa área de livre comércio que reúne 700 milhões de consumidores dos dois lados do Atlântico.

A França, sozinha, não tem poder para barrar o acordo. Para isso, precisa formar uma “minoria de bloqueio”, com pelo menos quatro países que representem mais de 35% da população da União Europeia.

A inclusão do novo “instrumento jurídico” não exige renegociação com os países do Mercosul, mas os europeus ainda terão que tranquilizar seus parceiros latino-americanos, preocupados com possíveis mudanças no acordo fechado em dezembro.

*RFI

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