Altas temperaturas e umidade típicas da estação criam condições ideais para o avanço da principal praga da cultura; pesquisadora do Cepenfito reforça importância do monitoramento e do controle biológico
O verão brasileiro, marcado por altas temperaturas e períodos prolongados de chuva e elevada umidade, acende um alerta nos canaviais de todo o país. Essas condições climáticas criam o ambiente ideal para o aumento populacional da broca-da-cana-de açúcar, considerada uma das pragas mais relevantes da cultura.
“Os picos populacionais da broca-da-cana-de-açúcar coincidem com períodos de maior calor e umidade, condições que favorecem o desenvolvimento do inseto em todas as suas fases”, explica Ellen Carbognin, pesquisadora de pós-doutorado do Centro de Pesquisa em Engenharia-Fitossanidade em Cana-de-Açúcar (Cepenfito). Segundo ela, a relação entre clima e ocorrência da praga é direta, com aumento significativo da infestação a partir de setembro, estendendo-se até abril.
A broca-da-cana-de-açúcar é o nome popular do inseto Diatraea saccharalis, uma mariposa que passa pelas fases de ovo, larva, pupa e adulto. Embora os adultos tenham papel importante na dispersão da praga, é na fase larval que ocorrem os maiores prejuízos à cultura. As larvas penetram no colmo da planta e passam a se alimentar internamente, abrindo galerias, geralmente de forma ascendente, o que compromete o desenvolvimento da cana. Em levantamento do Centro de Tecnologia Canavieira (CTC), destaca-se que a broca é responsável por cerca de 50% dos prejuízos causados nos canaviais brasileiros, atingindo marcas entre 5 e 8 bilhões de reais todos os anos.
Os danos envolvem tanto os canaviais como processos industriais. Os danos provocados pela broca vão além da simples perfuração do colmo. A alimentação interna pode levar à destruição da gema apical, ocasionando o sintoma conhecido como “coração morto”. Além disso, há redução do peso da planta e do teor de sacarose, fatores que impactam diretamente a produtividade agrícola e industrial. O ataque também favorece o ressecamento e o encurtamento do colmo, aumentando a suscetibilidade à quebra pelo vento e estimulando o perfilhamento e o enraizamento aéreo.
Outro aspecto preocupante é que as galerias abertas pela broca facilitam a entrada e o desenvolvimento de microrganismos, como fungos e bactérias, que comprometem a sanidade da lavoura. Em situações de alta infestação, ocorre ainda aumento do teor de fibra no colmo e a presença de compostos indesejáveis no caldo, o que prejudica o rendimento na produção de açúcar e etanol.
Diante desse cenário, o monitoramento constante do canavial torna-se uma ferramenta indispensável para o produtor. Os picos de adultos são um indicativo da proximidade de maior atividade da praga, enquanto a detecção de larvas revela o nível real de infestação no campo. Para acompanhar a população adulta, podem ser utilizadas armadilhas do
tipo delta instaladas no entorno dos talhões, com contagem dos machos capturados. Já o monitoramento larval envolve amostragens diretas, com o corte e a abertura dos colmos, permitindo calcular a intensidade de infestação a partir da proporção de entrenós atacados.
No manejo da broca-da-cana-de-açúcar, o controle biológico se consolidou como a principal estratégia adotada no país, destacando-se pela eficiência e pela sustentabilidade. Para o controle de ovos e de larvas recém-eclodidas, ainda antes da penetração no colmo, são utilizados bioinseticidas à base da bactéria Bacillus thuringiensis. Na fase de ovos, a liberação do parasitoide Trichogramma galloi é uma alternativa amplamente empregada.
Quando as larvas já se encontram no interior da planta, a recomendação técnica é a liberação da vespa parasitoide Cotesia flavipes, um dos inimigos naturais mais conhecidos e utilizados no controle da broca. “O sucesso do manejo depende de direcionar as estratégias de controle para a fase correta do inseto, no momento adequado, sempre com base no monitoramento”, ressalta Ellen Carbognin. Estudos mais recentes também avaliam o uso complementar do Tetrastichus howardi, que atua sobre larvas e pupas da praga.
A prevenção, por sua vez, passa pela adoção consistente do manejo integrado de pragas. Monitoramento frequente, tomada de decisão baseada em critérios técnicos e uso de inimigos naturais de boa procedência e viabilidade são medidas essenciais para reduzir a infestação e evitar a disseminação da broca nos canaviais. Em um cenário de verões
cada vez mais quentes e úmidos, a atenção à broca-da-cana-de-açúcar torna-se estratégica para a sustentabilidade e a produtividade do setor sucroenergético.

