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Açúcar

Açúcar: Quando a razão bate à porta

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Açúcar: até final de abril 19,2 milhões de t já estavam fixadas

A semana foi encurtada pelo Carnaval no Brasil e pelo feriado do Dia dos Presidentes nos EUA. E as sessões de negócios na Bolsa de NY oscilaram ao sabor das notícias que pululavam no dia. NY acabou encerrando o pregão da sexta-feira com o contrato março/23, que expira na próxima terça-feira, cotado a 21.32 centavos de dólar por libra-peso, uma pequena variação positiva de 9 pontos na semana, representando 2 dólares por tonelada. O maio/23, que agora é o contrato com maior liquidez encerrou cotado a 19.69 centavos de dólar por libra-peso, uma variação negativa de 31 pontos na semana, quase sete dólares por tonelada.

Semana que vem saberemos qual volume de açúcar (se algum) do Brasil terá entrega física na expiração do março. O que o mercado se pergunta é se com esse spread março/maio, bastante elevado, haverá efetivamente entrega de açúcar seguida de uma acomodação dos preços ou, ao contrário, caso não haja entrega de açúcar, se o mercado pode interpretar como agravamento da disponibilidade do produto, encaixando-se perfeitamente na narrativa dos fundos especulativos, cuja posição ainda não sabemos qual tamanho tem. Ah sim, o CFTC publicou na sexta a posição do dia 3. É como ler revista velha no consultório do dentista.

Muito interessante a enquete promovida pela gigante canadense de comunicação Thomson Reuters que apurou entre vários analistas de mercado que a previsão deles é que o açúcar em NY no final deste ano estará em 18.37 centavos de dólar por libra-peso. Já os corretores, consultados na mesma enquete, apostam em 19.75 centavos de dólar por libra-peso. A conferir.

Vale a pena lembrar que do ano 2000 para cá, em dez oportunidades observamos que o preço médio mensal mais alto do ano ocorreu no último trimestre (outubro/novembro/dezembro) daquele ano específico. E, em sete desses dez eventos, o preço médio mais alto do ano seguinte aconteceu no primeiro trimestre (janeiro/fevereiro/março) daquele ano, com os preços caindo em seguida. Nessas sete ocasiões, no final do ano, os preços encolheram em média 23% em relação à cotação do início do ano. Por esse padrão, as cotações no final do ano podem chegar em 15.40 centavos de dólar por libra-peso? Muita calma, mas é bom usar a razão.

Um diretor de usina, de pensamento cartesiano, acredita que o dólar dificilmente ultrapassa R$ 5,3000 nos próximos quatro anos, “seguindo a mesma trilha que fez o peso mexicano” [que ficou um longo período negociando dentro de um intervalo restrito de preços]. Segundo ele, fixar açúcar para a safra 2024/25 começa a fazer sentido, pois a quantidade de reais na curva futura inflada pelos juros altos em algum momento vai minguar. “Venda [expressiva] de commodities açúcar, soja, milho, celulose, carne, minério e juro real alto, vai derrubar o dólar, podendo mesmo quebrar os R$ 5,0000”, pondera o executivo. Acho a linha de raciocínio absolutamente factível e em conformidade com o que temos sugerido aqui há muito tempo, qual seja a de fixar preços do açúcar de exportação em reais e, se for o caso, como seguro, comprar uma opção de compra fora-do-dinheiro.

Existe um enorme esforço para fazer acreditar em falta de açúcar. Por exemplo, a narrativa da semana se concentrou (enquanto subiam os preços) na volumosa chuva nas regiões produtoras de cana segundo a qual pode atrapalhar o início da safra do Centro-Sul, fortalecendo o spread maio/julho e acendendo uma luz de alerta acerca da disponibilidade de hidratado. Cada um acredita no que quiser. O fato é que, no entanto, a maioria das usinas com as quais falamos reporta absoluta normalidade. Outras descartam atraso, pois irão começar a moer nas primeiras semanas de abril. Alguém precisa que você acredite nisso.

O governo indiano segue firme no propósito de expandir os projetos de etanol naquele país. Nove projetos foram aprovados recentemente, dos quais três ligados à cana e cinco focados em grãos. O país deve também diminuir sua produção para este ano. O consenso é que a produção deva ficar ao redor de 34 milhões de toneladas, com viés de baixa. No nosso entendimento, a menor produção de açúcar na Índia será compensada pelo aumento da produção de açúcar no Centro-Sul, que pode superar os 37 milhões de toneladas caso o preço do hidratado no mercado interno continue pressionado por força da desoneração dos impostos sobre combustíveis. As exportações indianas devem superar os 6 milhões de toneladas de açúcar. E em março, o governo deve decidir se libera mais um tranche de exportação de açúcar.

O hidratado atingiu seu maior desconto em relação a NY desde outubro de 2016. Ou seja, nunca a diferença esteve tão grande. Alguns analistas entendem que a restrição de crédito e a taxa abusiva de juros compele as usinas a venderem o etanol a qualquer preço e isso prejudica o açúcar. Espera-se a volta dos impostos sobre os combustíveis já a partir de 1º de março. Como o atual governo é composto por gente atrapalhada, pode ser que sim, pode ser que não.

Na próxima semana, muitos traders de açúcar de diversas partes do mundo estarão reunidos em Dubai atendendo à já tradicional Conferência. Dizem os analistas mais experientes que seja lá qual for o consenso obtido nas conversas dessa conferencia, o mercado reage de maneira oposta na semana seguinte. São perorações que carecem de substância, mas vale a pena monitorar.

A direção da Conferência foi muito criativa este ano atribuindo aos temas que serão discutidos no evento nome de canções dos Beatles que remetem ao assunto. Por exemplo, no painel que vai discutir o mercado de açúcar em 2023 e além, o sugestivo nome de “The Long and Winding Road” (A longa e sinuosa estrada), e no workshop que discorrerá sobre estratégias para a gestão de risco, optaram por “Baby, You’re A Rich Man” (Baby, você é um homem rico). Neste último, tendo em vista algumas operações sugeridas que rondaram o mercado recentemente, talvez o nome mais apropriado para o painel fosse “Help”. Faltou uma homenagem ao mais novo dos Beatles George Harrison, falecido em 2001, que faria 80 anos nesse dia 25.

 

*Arnaldo Luiz Corrêa é analista de mercado e diretor da Archer Consulting

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