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Como manter produtividade dos canaviais sem ficar refém do clima?

A área irrigada cresceu de forma consistente. A modalidade ‘salvamento’ com canhões autopropelidos já soma aproximadamente 1,4 milhão de hectares. No gotejamento, são cerca de 50 mil hectares, e no pivô central, entre 60 e 70 mil hectares.
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O uso da irrigação por gotejamento em canaviais no período de maior déficit hídrico, do meio ao final da safra, garante estabilidade na indústria e redução de custos no campo

Natália Cherubin

Os canaviais passaram por um longo período de estiagem. As últimas três safras de cana sofreram não somente com a redução do índice pluviométrico, mas também com uma piora na distribuição, com chuvas mais concentradas. A queda nos índices pluviométricos, dependendo da região, chegou a 30%, segundo dados da UNESP (Universidade Estadual de São Paulo) de Ilha Solteira. E isso levou a uma queda vertiginosa da produtividade da cana-de-açúcar, que atingiu patamares inferiores a 74 toneladas por hectare na safra 2022/23.

As chuvas voltaram mais regulares desde o verão de 2022, mas diante de incertezas como manter os resultados em produtividade, tendo maior previsibilidade de produção sem ficar refém do clima? E ainda: investir em irrigação por gotejamento, como ferramenta mitigadora do clima, é viável mesmo quando há chuvas em frequência considerada “normal”?

A água é de grande importância no desenvolvimento de qualquer ser vivo e isso não é diferente para a cana-de-açúcar, pois a água participa de todos os eventos físicos, químicos e biológicos da planta.

“A produtividade da cana é impactada por vários fatores, sendo que a água representa a maior fatia, aproximadamente 50%. Os demais fatores são solo (preparo/correção/fertilidade) e manejo agronômico adotado como, controle de pragas, plantas daninhas e o uso de variedades corretas. Esses demais fatores correspondem, cada um, aproximadamente por 16% a 17% da produtividade”, destaca Daniel Pedroso, engenheiro Agrônomo e especialista da Netafim.

O pesquisador do IAC (Instituto Agronômico – APTA), da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, Maximiliano Sales Scarpari, explica que durante o ciclo de desenvolvimento da cana-de-açúcar, existem necessidades hídricas variáveis em função do momento.

“No crescimento da biomassa, a necessidade hídrica é maior comparada a maturação, sendo assim, a diminuição da disponibilidade hídrica afeta grandemente o acúmulo da biomassa, porém, na maturação, em níveis adequados, é essencial. Por isso, a melhor forma de se medir este impacto é usando a modelagem matemática que irá relacionar estágio, ambiente de produção e época de colheita para estimar o impacto do déficit hídrico no TCH”, adiciona.

Água: ferramenta para momentos de estiagem?

A safra 2023/24 para a maioria das usinas e produtores será melhor porque houve uma recuperação da produtividade na ordem de 10 a 15% devido a normalização do clima. No entanto, não há uma segurança de que o clima se estabilize completamente já que existe a influência de fenômenos como o El Niño e o La Niña. Como então conseguir estabilizar a produtividade, dando maior previsibilidade da cana que vai entrar na indústria, mesmo em anos em que o clima não ajuda?

De acordo com Pedroso, saber planejar e diminuir as variáveis que impactam na produtividade deve ser a palavra de ordem de qualquer gestor de produção de cana-de-açúcar, independente se por produtor ou colaborador de usina.

“Se dados demonstram que 50% da produtividade está relacionada a água e sabendo-se que há instabilidades climáticas, o investimento na irrigação é, sem dúvidas, o melhor meio de se mitigar esse problema. E nessa mesma linha de raciocínio, o importante também é saber escolher qual o sistema de irrigação devemos utilizar, na questão do melhor custos/benefício e na questão ambiental. Por isso, o sistema de irrigação por gotejamento é a tecnologia que mais cresce no setor”, destaca Pedroso.

O pesquisador do IAC concorda. Segundo ele, a irrigação pode ser uma ferramenta importante porque modifica toda a forma de realizar os tratos culturais devido ao manejo mais consciente do déficit hídrico, tanto no momento do incremento de biomassa quanto na maturação. “Com a irrigação, praticamente zeramos o principal problema da produção da cana em sequeiro que é o déficit hídrico dando maior estabilidade da produtividade dentro da safra”, adiciona Scarpari.

LEIA TAMBÉM: Irrigação por gotejamento em cana sem investimento, já imaginou?

Mesmo em anos considerados normais no Centro-Sul do país, maior região produtora de cana, ainda há uma diminuição nos índices pluviométricos entre os meses de abril a outubro, o que consequentemente leva a queda de produtividade em canaviais colhidos no meio e final de safra devido ao déficit hídrico. 

O déficit hídrico dentro deste período, segundo o pesquisador do IAC, é importante e fundamental para a maturação do canavial, quando é de 150 mm. “No entanto, acima de 200 mm de déficit hídrico já é possível ver perdas de TCH e ATR. É quanto então é recomendado o uso da irrigação”, explica Scarpari.

Pedroso afirma que há um paradigma de que o Brasil, por ser um país tropical, tem altos índices pluviométricos e bem distribuídos, mas segundo ele isso é uma inverdade. “Se analisarmos os dados históricos mensais é nítido que mesmo em anos considerados normais, há diminuição nos índices de pluviometria entre os meses de abril a outono, o que leva a queda “normal” da produtividade dos canaviais colhidos no início para meio e final de safra.

“Isso para a indústria é um sério problema, pois se ela mói 350 mil toneladas por dia, ela precisa moer as 350 mil toneladas por dia, todos os dias, salvo eventuais imprevistos. Então, o grande desafio da área agrícola é fornecer as 350 mil toneladas por dia de matéria-prima. Quando isso não acontece, a indústria passa a ficar ociosa e isso impacta muito em seus custos de produção, diminuindo o lucro da indústria de maneira significativa”, explica.

“Acredito que uma das vantagens é justamente poder manejar o melhor déficit hídrico dentro do período da maturação e no final de safra, evitando que a cana sofra com elevados déficits que acarretem grandes perdas de TCH e qualidade da matéria-prima”, adiciona o pesquisador do IAC.

Viabilidade econômica da irrigação por gotejamento

Existem diversas tecnologias que propõem a recuperação da produtividade do TCH, como é o caso da irrigação e do sistema de gotejamento especificamente, que é considerado mais sustentável porque otimiza o uso da água pela planta, permitindo ainda seu uso para outros manejos durante o ciclo do canavial.

No entanto, por ser um sistema que custa mais caro, o setor nem sempre sabe como avaliar a viabilidade econômica (ROI) do uso desta tecnologia, principalmente quando o clima é considerado normal. “Penso que a melhor forma de saber a viabilidade econômica é fazendo a análise do histórico climático da área. Através desta análise de histórico climático, temos condições de analisar a viabilidade”, afirma o pesquisador do IAC.

A irrigação por gotejamento é a tecnologia mais nova apresentada ao mercado e foi criada na década de 60, estando presente nos canaviais há pouco mais de 25 anos, segundo Pedroso. O sistema permite aplicar água e nutrientes da quantidade que a planta precisa e principalmente quando ela precisa, atendendo a sua demanda em todo seu ciclo de desenvolvimento.

“Apesar de poder ser utilizada em qualquer período, ela é mais indicada para canaviais colhidos em meio e final de safra, pois o nosso objetivo é promover o aumento da produtividade dos canaviais colhidos nessa época, que já possuem queda natural de produtividade, estabilizando o fornecimento de matéria-prima para a indústria”, destaca Pedroso.

Avaliando os preços históricos de açúcar, etanol e cana de açúcar o sistema de irrigação por gotejamento, segundo Pedroso, é pago em aproximadamente 3,5 anos para usinas e 4 anos para produtores. “É importante destacar que quando falamos de cana-de-açúcar irrigada por gotejamento a longevidade chega a 10 – 12 anos e não somente cinco anos como no sequeiro”, destaca Pedroso.

O especialista da Netafim diz que embora dependa de região para região e a classificação do ambiente de produção em que o sistema está alocado, de maneira geral, a companhia observa um aumento de produtividade ao redor de 50% nos canaviais clientes e com o dobro de longevidade. Na safra 2022/23, houve casos de ganhos superiores a 80% de produtividade, mesmo em regiões com alto índices de produção (regiões consideradas com baixo déficit hídrico e ambientes de produção A/B).

“A Netafim já tem vários exemplos de áreas que superaram os 10 anos de produção, sem a necessidade de reforma. E isso impacta muito no ROI, pois uma renovação de acordo com o PECEGE custa R$ 16.742 por hectare, o que é um custo extremamente elevado, pois além de fazer esse investimento, a usina ou produtor, fica 16 meses sem colher (entrada de dinheiro). Sendo assim, quando prolongamos a longevidade, significa que adiamos esse investimento. Melhorando o fluxo de caixa”, adiciona o especialista da Netafim.

Em anos com melhores índices pluviométricos a utilização de um sistema que apenas fornece água passa a ser menor. No entanto, o sistema de gotejamento permite outras possibilidades, como por exemplo, a aplicação de fertilizantes de maneira parcelada em todo ciclo de desenvolvimento da cultura, atendendo a curva nutricional da cana-de-açúcar.

Além disso, Pedroso explica que é possível fazer a aplicação de produtos estimulantes e/ou biológicos para melhoria da biota do solo, realizar a proteção de cultivos, ou seja, fornecer produtos químicos/biológicos para combate a pragas também.

“Isso leva a fatores mensuráveis como a redução do custo de produção, pois aplicando produtos via gotejamento nós deixamos de utilizar tratores e mão de obra para aplicação, ou seja, praticamente nós tiramos o custo de aplicação dos produtos. Além disso, deixando de utilizar a aplicação terrestres, deixamos de utilizar combustível (óleo diesel) e com isso diminuímos a emissão de CO2 para a atmosfera, ganhando em questões ambientais”, conclui Pedroso em entrevista à RPAnews.

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