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Como os grandes grupos canavieiros estão agindo neste momento de crise?

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Por Natália Cherubin

Diante da crise que se instalou no horizonte do setor sucroenergético, há varias ações que deverão ser colocadas em prática por usinas e destilarias a fim de sobreviver ao momento de preços baixíssimos para o etanol, situação que deve se estender pelo menos até o segundo trimestre do ano.

Em webinar realizado pela XP Investimentos ontem, 06, os CEOs de três dos mais importantes grupos do setor – Raízen, São Martinho e CMAA – estiveram reunidos e discutiram não só o que pensam sobre a crise, mas também revelaram um pouco das estratégias de cada companhia.

Uma das soluções de algumas unidades em dificuldade financeira pode ser deixar a cana em pé (cana bis). Uma estratégia que, dependendo da profundidade da crise, poderá ser justificável, na opinião de Alexandre Figliolino, consultor da MBAgro, que também participou da live.

“Nunca vi isso ser feito na história. A crise mais aguda que eu já passei no setor foi a de 1998/99. Não sei dizer, mas no caso de um aprofundamento de crise, a estocagem de ativo biológico pode ser também uma estratégia justificável”, disse.

Para Carlos Santos, CEO da companhia mineira CMAA, uma vez que já estavam priorizando a produção de açúcar, diante da oportunidade da fixação de preço, será possível elevar os estoques de etanol até o final de junho, ganhando uma “folga” bastante significativa.

“Do ponto de vista de cana em pé, por enquanto isso está descartado. Não pretendemos fazer isso, até para honrar os contratos com os nossos fornecedores. Sendo assim, para não quebrar essa cadeia, nós vamos moer toda cana que tiver e levar nossos estoques para frente.”

A empresa está financeiramente muito bem estruturada para isso. Segundo o CEO da companhia, a CMAA vem, há três anos consecutivos, acessando o mercado de dívidas. “Em fevereiro deste ano a gente fez uma captação de um CRA com a Xp no valor de R$ 300 milhões, então estamos com o nosso caixa robusto”, afirma.

Entretanto, a CMAA freou todos os investimentos que não são necessários para preservar o caixa da Companhia. “O que posso dizer é que hoje a gente não vê com bons olhos a estratégia de deixar a cana em pé.”

Fábio Venturelli, presidente da São Martinho, afirmou que deixar cana pra a próxima safra é uma estratégia complicada, mas acredita que tudo pode acontecer no setor.

“Temos um setor divido. Ele não tem uma condição de operação financeira homogênea. Além disso, vem abalado por outras crises e com isso fica um pouco difícil prever o que vai acontecer na estratégia individual das usinas, que eventualmente vão ter que fazer oque dá para fazer e não o que gostariam de fazer”, afirmou.

Para Venturelli é provável que algumas usinas, por não conseguirem capital de giro para tocar a safra, tenham que deixar cana para trás. “Caixa vai ser a palavra principal para a operação em um momento de desafio tão grande. Vamos ver um pouco de tudo.”

A São Martinho sempre apostou em capacidade de estocagem. A companhia, inclusive, entrou na safra 2020/21 com uma capacidade adicional, inaugurada recentemente em Goiás. “A gente consegue estocar um pouco mais de 70% da nossa produção. Isso leva a gente confortavelmente até setembro. Estamos preparados para isso, mas é uma estratégia de certa forma recorrente nossa”, disse o presidente da São Martinho.

Ainda de acordo com ele, como muitas empresas enfrentarão problemas operacionais, o setor deve perder produção de etanol adicional, principalmente se os produtores de etanol de milho seguirem os EUA.

“Vejo que vamos ter um crescimento de produção e açúcar, que só vamos contabilizar quando a safra terminar, e veremos também cair a produção efetiva de etanol, o que é positivo”, destacou Venturelli.

Ainda de acordo com ele, ao mesmo tempo em que o etanol está bastante pressionado no primeiro trimestre, deve ganhar um pouco mais de share frente a gasolina, o que é bom para uma retomada.

“Teremos exportação de alguns volumes para outros fins, que também acontece no primeiro trimestre, o que é positivo. O mundo está com uma demanda muito interessante do etanol para outros fins e é bom aproveitar essa janela”, disse.

Com relação ao açúcar, no começo da safra a São Martinho conseguiu antecipar volumes importantes diante do bom cenário de preços. “A São Martinho teve uma distribuição bastante homogênea, devido a essa demanda e essa busca por açúcar e de uma forma muito interessante, o açúcar está muito remunerador para o Brasil em relação ao resto do mundo. O tempo de brincar com estoque, fingir que tem estoque e não ter, acabou. Isso vai trazer o comprador para uma realidade de melhor visibilidade. No mercado temos visto isso com antecipações de volume. Então, no primeiro trimestre vamos ter mais açúcar, algo histórico para o nosso caso”, afirmou.

Sobre a cogeração de energia, o CEO da Companhia revelou que está com uma assessoria jurídica específica monitorando e tentando trazer o conforto necessário para que essa operação ocorra da forma mais tranquila e transparente possível.

“No planejamento para essa safra isso vai a ser um pouco do que vai acontecer. Muito diálogo. Todos os contratos estão sendo analisados e revistos carinhosamente. Mas é uma safra que vai demandar muita articulação, muita conversa e diálogo em todas as frentes”, destacou.

Visão de distribuidora e produtora de combustíveis

Falando sob o ponto de vista de distribuidora, Ricardo Mussa, CEO da Raízen, afirmou que com a previsão de uma queda no consumo do ciclo otto na ordem de 70% a 80% e de 30% de queda no consumo de diesel, o mês de março foi muito difícil.

Segundo ele, como o sistema brasileiro de combustíveis é muito justo, ou seja, não trabalha com estoques e opera muito bem, quando há uma queda nesse patamar de 80%, cria-se um gargalo na logística, ficando impossível honrar a retirada desses produtos em momentos como este.

Mussa: “Não vemos a demanda de açúcar sendo afetada como foi a demanda de combustível. Achamos que o açúcar vai resistir. O problema todo está no etanol.” (Foto Reprodução/Linkedin)

Ainda falando sobre a questão da suspensão de contratos por parte de distribuidoras, Mussa afirmou que a repactuação de contratos vai servir para os dois lados.

“Chegou um momento em abril em que o preço do etanol não remunera ou fica abaixo do custo do produtor, que é o que estamos vendo, sendo assim, da mesma maneira, o produtor não vai querer entregar produto. Nós como produtores de combustível fomos notificados por mais de 18 distribuidoras, que disseram que não conseguiriam retirar e tivemos que sentar e discutir, inclusive com a própria Petrobras também, porque é impossível honrar os valores de diesel, gasolina, querosene de aviação e assim por diante.”, afirmou o CEO da Raízen, que já teve mais de 80% do seu etanol acertado para mais a frente.

A expectativa da companhia é moer quase 64 milhões de t, virando seu mix para o açúcar. “Não vemos a demanda de açúcar sendo afetada como foi a demanda de combustível. Achamos que o açúcar vai resistir. O problema todo está no etanol. Não adianta. No primeiro trimestre não é uma questão de preço. Se a demanda não vai voltar no curto prazo, mesmo que o preço caia, a questão é ter tancagem, consciência para levar o produto mais para frente porque o preço vai ficar muito debilitado a curto prazo”, afirmou o CEO da Raízen.

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