Os contratos futuros de açúcar registraram leve alta nesta sexta-feira (20), encerrando a semana com uma recuperação modesta após quedas acentuadas. O contrato de açúcar bruto com vencimento em outubro fechou com valorização de 0,08 centavo de dólar, ou 0,5%, a 15,46 centavos de dólar por libra-peso, acumulando queda de 2% na semana. Já o contrato mais ativo de açúcar branco, negociado em Londres, subiu 0,2%, para US$ 455,70 por tonelada.
Apesar do alívio pontual, o mercado segue pressionado por fundamentos negativos. Na quinta-feira, os preços do açúcar em Nova York atingiram o menor nível em 4,25 anos, enquanto em Londres o mercado caiu para a mínima em quatro anos. O principal fator de pressão continua sendo o aumento da oferta global, especialmente a partir do Brasil.
Segundo relatório divulgado pela Unica na quarta-feira (18), a produção de açúcar na região Centro-Sul do Brasil cresceu 18% na segunda quinzena de agosto em relação ao mesmo período do ano anterior, totalizando 3,872 milhões de toneladas. O mix de produção também aumentou: 54,20% da cana foi destinada ao açúcar, contra 48,78% no mesmo intervalo de 2024. Ainda assim, a produção acumulada da safra 2025/26 até agosto caiu 1,9%, somando 26,758 milhões de toneladas.
No cenário internacional, a trading Sucden afirmou que a Índia poderá desviar 4 milhões de toneladas de açúcar para a produção de etanol na safra 2025/26. No entanto, isso pode não ser suficiente para conter o excedente interno, levando o país — segundo maior produtor mundial — a exportar até 4 milhões de toneladas, o dobro do que se estimava anteriormente.
Comentário de mercado: “fundamentos tiraram férias”
Para o analista Arnaldo Corrêa, diretor da Archer Consulting, o que se vê é um mercado que entrou em “modo pânico”. Em seu comentário semanal, ele observa que, apesar da leve recuperação, o contrato de outubro/25 encerrou a semana a 15,50 centavos de dólar por libra-peso, uma queda de 29 pontos em relação à sexta-feira anterior — equivalente a US$ 6,40 por tonelada. Os demais vencimentos até maio/2028 também caíram entre 28 e 36 pontos (US$ 6 a US$ 8 por tonelada).
“É aquele momento em que os fundamentos tiram férias, a lógica some do mapa e a histeria coletiva assume o comando. Preços passam a refletir mais medo do que realidade”, afirmou Corrêa. “Gestores confundem improviso com estratégia — depois, se der certo, chamam de competência.”
O analista aponta que muitos agentes do setor subestimaram fatores que impactaram diretamente o mercado, como a recuperação do ATR. Segundo um agrônomo consultado por Corrêa, as primeiras canas moídas vieram de áreas afetadas pela seca e incêndios no ano anterior, o que reduziu a qualidade inicialmente. No entanto, após julho, o replantio e o retorno das chuvas ajudaram a elevar a qualidade da cana, impactando os números de produção.
Outro erro comum entre usinas foi adiar as fixações de preço mesmo após já terem embarcado o açúcar, apostando em uma alta que nunca veio. “Cansadas de esperar por um milagre, o mercado entrou naquele momento clássico do ‘me tira daqui’ — o que só favoreceu os fundos, que ampliaram ainda mais suas posições vendidas”, completou Corrêa.
De fato, os fundos aumentaram em mais de 120 mil contratos suas posições de venda desde maio. O relatório do CFTC (Commodity Futures Trading Commission), referente à posição até 16 de setembro, mostrou que os especuladores estavam com 151.051 contratos vendidos (short), recomprando 31.557 lotes entre os dias 9 e 16 de setembro — uma movimentação que, segundo Corrêa, ajudou a dar liquidez às usinas atrasadas.
Moagem ganha força, e produção pode bater 40 milhões de t
Outro fator que contribuiu para a pressão nos preços foi o ritmo da moagem. Embora o acumulado da safra mostre redução — 403,9 milhões de toneladas contra 424,2 milhões no mesmo período do ano anterior —, as quatro últimas quinzenas representam 49% do total moído, contra 43,4% no mesmo recorte de 2024. Isso indica aceleração do processo, sem interrupções climáticas, e alimenta a percepção de aumento na oferta.
O mix até agora está em 52,76% para o açúcar, com tendência de leve queda. Há indicações de que muitas usinas devem encerrar a safra em outubro e que, das 14 milhões de toneladas previstas para março de 2026, a maior parte será destinada ao etanol. A depender do cenário, a produção de açúcar pode oscilar entre 39 e 40 milhões de toneladas.
“O cenário é apertado, mas não é apocalíptico”, avalia Corrêa. “O problema é que, quando os números não atendem às expectativas, o drama toma conta e os preços passam a reagir mais como novela mexicana do que como planilha de Excel.”
Corrêa finaliza com uma analogia contundente sobre a importância da estruturação no gerenciamento de riscos: “Imagine um piloto tentando decolar um avião sem nunca ter passado por treinamento. Você entraria nessa aeronave? Certamente não. Então por que permitir que sua empresa encare a turbulência dos mercados sem uma política estruturada de gestão de risco?”
Natália Cherubin para RPAnews