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[Opinião] Mercado de açúcar: o bicho vai pegar

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O mercado futuro de açúcar em NY encerrou a sexta-feira cotado a 17.10 centavos de dólar por libra-peso no contrato com vencimento para julho, encolhendo 21 pontos (pouco menos de 5 dólares por tonelada) no acumulado da semana. Os demais contratos fecharam com quedas médias de 9 pontos (dois dólares por tonelada). O real perdeu força diante do dólar, dada a instabilidade do cenário macro, e encerrou a semana com uma desvalorização de 1.3%, cotado a R$ 5.7250 por dólar.

Os fundos aumentaram suas vendas à descoberto e segundo o CFTC (Commodity Futures Trading Commission), agência independente do governo dos Estados Unidos, que regula os mercados de futuros e opções das commodities, com base nas posições de terça-feira passada, eles estavam short 61,476 lotes. O mercado está como os fundos gostam, todo mundo em compasso de espera, o cenário macro não estimulando formação de estoques e eles podem pressionar os preços mais facilmente. A vulnerabilidade deles aumenta. Se algo significativo ocorrer nos fundamentos (veja mais a seguir), eles podem repetir o desempenho de dezembro de 2023.

O mercado segue atento aos números da safra do Centro-Sul, e os dados divulgados pela UNICA nesta semana trazem elementos importantes para reflexão. Quem observa à distância pode ver sinais trocados em relação a alguns detalhes dos dados divulgados. Por exemplo, ver que o mix do açúcar pulou de 47.60% para 48.61% e imagina que esse número vai subir e – claro – mais açúcar estará disponível. Também pode se iludir pelo fato de o acumulado dessa terceira quinzena ser apenas 20% mais baixo do que o ano anterior, mas pelo menos melhorou muito em relação à queda de 30% da quinzena anterior na mesma comparação. Ilusão de ótica.

Quando observamos o histórico de moagem após a primeira quinzena de maio — ou seja, o que ainda falta ser moído daqui para frente — a consistência estatística impressiona. Em 2024/25, foram moídas 526 milhões de toneladas após esse ponto. Em 2023/24, uma safra considerada excepcional, esse número chegou a 574 milhões. Nos demais anos, o volume raramente superou os 500 milhões.

A média dos últimos cinco anos para esse período é de 504 milhões de toneladas. Se somarmos esse valor às 76 milhões já moídas até agora, o teto natural da safra atual seria de aproximadamente 580 milhões de toneladas. A média dos últimos dez anos não é muito diferente — 506 milhões — o que leva a uma conclusão semelhante. Mesmo se adotarmos o cenário mais otimista possível, usando como base os 575 milhões de toneladas moídas após maio em 2023, chegaríamos a no máximo 598 milhões, um número altamente improvável diante do que temos pela frente.

Ou seja, com base nas médias históricas e no ritmo atual de moagem, fica muito difícil sustentar qualquer projeção que aponte para uma safra acima de 580 milhões de toneladas. Ainda assim, o mercado parece ignorar esse limite técnico, apostando em um volume improvável de ser atingido. Resta saber até quando essa narrativa se sustenta diante dos dados.

Impressionado com visitas e relatos de várias usinas, ajustamos nossa previsão para a safra 2025/2026 reduzindo em 2.6% para 581 milhões de toneladas de cana (era 596.7) e em 6.6% a produção de açúcar, que é estimada em 38.7 milhões de toneladas contra 41.5 anteriormente.

Enquanto o Brasil encara seus próprios limites produtivos, os mercados asiáticos vivem realidades distintas, embora igualmente pressionadas. Na Índia, a produção da safra 2024/25 deve fechar em torno de 26.1 milhões de toneladas, uma retração significativa frente ao ciclo anterior. A escassez de cana, o rendimento mais baixo e o impacto do El Niño resultaram em um ambiente de oferta apertada, que levou o governo a restringir as exportações a um teto de 1 milhão de toneladas. Mesmo assim, as perspectivas para a próxima temporada são bem mais otimistas.

A monção chegou mais cedo, e as previsões indicam chuvas acima da média histórica 6% a mais, segundo nossa valiosa fonte. Com isso, estima-se uma produção bruta de 35 milhões de toneladas em 2025/26. O consumo também recua — de 29.15 milhões para 27.5 milhões de toneladas — refletindo menor liberação ao mercado, retração do consumo industrial e a antecipação das chuvas, que afeta a demanda por alimentos processados. As exportações devem se limitar a 700–750 mil toneladas, e os estoques finais podem alcançar 6 milhões.

Há distorções metodológicas relevantes nas estimativas de consumo indiana. Em tese, o consumo é medido pelo estoque inicial mais produção menos estoque final. O que ocorre é que se o volume de contrabando para Bangladesh aumenta, o estoque final diminuiu e dá a ilusão de aumento do consumo. O consumo acaba sendo “inflado” pelo volume que atravessa a fronteira indiana.

Na China, a produção segue estável, com 10.4 milhões de toneladas, ainda bem abaixo do consumo doméstico. A grande mudança recente foi a proibição da entrada de xaropes tailandeses, usados como atalho para driblar as cotas tarifárias. Essa medida deve aumentar a demanda por açúcar bruto convencional — Brasil incluso — e fortalece a tendência de preços internos firmes, sustentados por políticas protecionistas e uso de estoques reguladores. Apesar disso, o clima tem colaborado e a expectativa é de leve crescimento produtivo em 2025/26. A China fica de olho quando o mercado chega aos 17 centavos de dólar por libra-peso e aproveita para ajustar seu estoque estratégico.

O Paquistão, por sua vez, é um caso emblemático de descompasso entre planejamento e realidade. A safra atual resultou em apenas 5.7 milhões de toneladas, mas o governo, confiando em estimativas superadas, autorizou exportações que somaram mais de 200 mil toneladas já no início do ano. O resultado foi escassez durante o Ramadã, preços disparando para além de Rs 180 por quilo (29 centavos de dólar por libra-peso) e medidas emergenciais de controle de preços, suspensão de exportações e promessa de importações, até agora não realizadas.

Na Tailândia, a história é outra. O país colhe sua melhor safra em sete anos, com produção em torno de 10 milhões de toneladas e igual volume previsto para exportação. O veto chinês ao xarope impactou algumas refinarias, mas também abriu espaço para a exportação de açúcar refinado tradicional. O clima foi um aliado até aqui, mas o El Niño pode complicar a próxima safra, caso as chuvas venham abaixo do esperado.

Já a Indonésia mantém sua dependência crônica de importações. Com produção doméstica de apenas 2,6 milhões de toneladas frente a uma demanda que supera 6 milhões, o país planeja importar ao menos 3,4 milhões de toneladas de açúcar bruto em 2025. Os preços internos superaram o teto estabelecido, forçando o governo a liberar estoques e autorizar compras adicionais. A meta de autossuficiência segue no discurso, mas distante da prática.

Entre dados, política e clima, o açúcar segue seu curso, desafiando narrativas fáceis e forçando o mercado a voltar para onde tudo começa: a realidade física da oferta e da demanda. E o bicho vai pegar logo, logo.

Nosso colaborador Marcelo Moreira comenta: será que já vimos o mercado negociando nas mínimas do ano? O vencimento Julho-25 – após negociar na máxima da semana a 17.52 centavos de dólar por libra-peso – voltou a testar as mínimas do ano negociando a 16.81 centavos de dólar por libra-peso e encerrou a 17.05 centavos de dólar por libra-peso (mínima do ano foi 16.43 centavos de dólar por libra-peso dia 21 janeiro 2025). O julho-25 segue trabalhando em um “canal de baixa” tendo como primeira resistência 17.26 centavos de dólar por libra-peso e em seguida respectivamente 17.96/18.34 e 19,35 centavos de dólar por libra-peso. Suportes importantes a 16.81/16.43 (mínima dos últimos 3 anos negociado em 23 de março de 2023)/16.00 e finalmente 15.18 centavos de dólar por libra-peso (mínima do contrato negociado em 17 de novembro de 2022).  O spread out-25/março-26 após negociar @ 48 pontos encerrou a semana @ 46 pontos!

 

*Arnaldo Luiz Correâ é analista de Mercado e diretor da Archer Consulting

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