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Como identificar, gerenciar e reduzir perdas industriais

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Especialistas relatam que as usinas brasileiras têm conseguido trilhar o caminho certo rumo à máxima eficiência industrial

Alisson Henrique

A eficiência industrial é um dos indicadores que servem para avaliar o desempenho dos processos industriais de usinas e destilarias autônomas. Esta eficiência pode ser avaliada por meio da relação entre a soma de todos os produtos obtidos a partir de uma certa moagem, convertida em açúcar (pol ou ART) pela quantidade de açúcares (pol ou ART) contida na cana processada.

Para fazer a análise das informações e calcular essa eficiência é necessário que haja um programa implantado, eficaz e ativo que permita a gestão das perdas industriais porque, em síntese, a redução destas reflete diretamente no aumento de eficiência industrial.

Esse programa, normalmente denominado de Gerenciamento de Perdas Industriais, busca identificar e quantificar todas as perdas que ocorrem ao longo do processo fabril e, assim, efetuar de forma sistêmica a sua gestão.

Alberto Shintaku, consultor de usinas da SHT Processo e Consultoria, explica que o programa permite direcionar melhor os investimentos para reduzir ou mesmo eliminar as perdas de forma definitiva dependendo do vulto do investimento, grau de retorno e payback.

“Como a matéria-prima de uma unidade sucroenergética é altamente suscetível à injúria, é importante frisar que o tempo de corte, carregamento e transporte até o completo processamento e conversão dos açúcares contidos na cana em produtos finais como açúcar, etanol, levedura, méis, melaço e xarope, são extremamente impactantes para a obtenção de uma boa eficiência industrial.

Os açúcares – sacarose, glicose e frutose – contidos na matéria-prima podem sofrer o processo de contaminação microbiológica, degradação térmica ou degradação química e inversão de açúcar, levando a perda de eficiência industrial”, detalha.

Nesse sentido, especialistas relatam que é imprescindível que a equipe engajada no programa seja altamente treinada e competente para identificar e monitorar pontos estratégicos e cruciais do processo para coleta de amostras, medições e análises tanto laboratoriais, quanto gerenciais, sendo estas precisas e confiáveis.

EFICIÊNCIA INDUSTRIAL TEM AVANÇADO

Normalmente, as perdas quantificadas sistematicamente e consideradas são as da lavagem da cana (algumas usinas ainda utilizam deste subterfúgio por não disporem de equipamentos suficientes no tratamento do caldo como decantadores, filtros e prensas de lodo), bagaço e torta de filtro.

De acordo com Alberto Shintaku, a eficiência industrial relativa, cujo efeito do mix de produção etanol/açúcar é eliminado de uma grande parcela de usinas, está abaixo de 92%, representando uma perda de 8% a 10%

“A eficiência industrial em porcentagem de açúcares convertidos em produto, acrescida das perdas identificadas, mensuradas e quantificadas, deveria resultar na quantidade de açúcares contida na totalidade da cana moída (100%)”, detalha Shintaku. No entanto, isso não ocorre, resultando em uma diferença que pode ser expressiva (via de regra) ou não (quando a gestão funciona). São as chamadas perdas indeterminadas.

Por desconhecer a sua natureza, local de ocorrência e sua quantificação, essas perdas podem representar um rombo no fluxo de caixa da usina, tal como mostram as Figuras 01 e 02.

A eficiência industrial relativa, cujo efeito do mix de produção etanol/açúcar é eliminado de uma grande parcela de usinas, está abaixo de 92%, representando uma perda de 8% a 10%.

Com base no gráfico da Figura 01, explica Shintaku, é possível notar que as usinas têm apresentado uma eficiência industrial média na ordem de 88-89%. Também com base na Figura 02,observa-se que as usinas têm avançado em seus resultados de eficiência.

Adicionalmente, Luis Manoel, coordenador de Fábrica de Açúcar da Cooper-Rbi e Tércio Dalla Vecchia, Ceo da Reunion Engenharia relatam que o nível tem aumentado gradualmente e a eficiência média tem conseguido chegar, em alguns casos, aos 92%.

“Temos usinas operando com eficiência industrial de até 92% o que é muito bom. Vale destacar que o mix influencia no cálculo da eficiência industrial. Quanto maior o mix para etanol menor será a eficiência. Penso que 85% seja o mínimo aceitável. Acima de 88% está muito bom”, afirma Vecchia.

Atualmente, nas usinas em que a gestão é realizada efetivamente, os resultados são expressivos. Por outro lado, alguns resultados incompatíveis com a realidade, que eventualmente são computados nos softwares, nos programas ou em boletins, ocasionam um aumento considerável no valor de perdas industriais nas unidades.

De acordo com o coordenador de Fábrica de Açúcar da Cooper-Rubi, nota-se a inserção de novos equipamentos tanto no campo quanto na indústria. “Também tem havido o desenvolvimento quanto a manutenção preditiva, o monitoramento mais frequente do maquinário, o uso de automação e os treinamentos contínuos”, relata.

O controle industrial como um todo é um fator de aumento nos números, relata Vecchia. Segundo ele, na medida em que há maior número e precisão das medições das perdas e dos processos, fica mais fácil corrigir eventuais problemas.

“É muito importante a gestão dos números. É comum a usina dispor de uma enorme quantidade de dados que não são compilados e analisados de forma criteriosa. Por exemplo, variações de nível dentro dos evaporadores causam arrastes significativos. Normalmente, os dados do nível estão disponíveis, mas são ignorados pelos operadores e gerentes. Essa gestão é a parte mais importante”, confessa.

A principal ferramenta, concordam os especialistas, continua sendo o conhecimento – ou know how como costumam dizer -, aliado à gestão e, além disso, à vontade de fazer bem feito.

“O setor necessita que as pessoas engajadas no programa de perdas sejam capazes de avaliar todas as etapas do processo industrial para que seja possível identificar todos os pontos passíveis de perdas. Além disso, faz-se necessário a instalação de dispositivos como calhas Parshall para medição de efluentes, medidores mais precisos e calibrados, softwares, planilhas, gráficos e relatórios que facilitam a visualização do que ocorre em termos de eficiência industrial, perdas quantificáveis e perdas indeterminadas”, destaca o consultor de usinas da SHT Processo e Consultoria.

Nos dias de hoje, as usinas dispõem de laboratórios industriais que analisam frequentemente os pontos cruciais para identificar essas perdas. “Usa-se também a automação industrial que possibilita monitorar o sistema e responder de forma mais ágil as variações”, explica Manoel.

FERMENTAÇÃO AINDA TEM MAIS PERDAS

Na indústria existem processos que apresentam um grande índice de rendimento. Em contrapartida, outros deixam a desejar. No entanto, vale destacar, segundo o consultor de usinas da SHT Processo e Consultoria, que nesta etapa, usualmente, não se fala em eficiência, mas sim em rendimento. Isso por conta decorrência das perdas setoriais.

Dentro de uma usina, cada processo tem características próprias que definem seu máximo rendimento. Por exemplo, a extração, seja por moenda ou difusor, tem limites físicos. A fermentação tem limites bioquímicos. Essa circunstância é verificada porque a conversão de açúcares em etanol sempre acarreta na perda de massa (ou matéria) pela formação do dióxido de carbono (CO2) que é produzido pela levedura durante o seu metabolismo na fermentação, além da necessidade de se multiplicar ou de se manter vivo, etapa em que consome os açúcares presentes no mosto.

“O processamento do caldo tem limites químicos e físicos. O lugar onde se perde mais açúcar é na fermentação já que praticamente 50% do açúcar é transformado em etanol. A destilação é um dos processos que registra a menor perda se bem controlada, ultrapassando 99,5% de eficiência”, relata Dalla Vecchia.

Manoel explica que na Cooper-Rubi, hodiernamente, há alguns pontos de perdas conhecidas como na extração, na qual superam a margem de 95% para mais 96% de aproveitamento. Sendo assim, há uma oportunidade de ganho.

“O uso de leveduras personalizadas de alto desempenho, que produzem menos subprodutos ou outros produtos que não são etanol, além de todas as etapas de esterilização e assepsia, eliminação de pontos mortos que demandam toda a fermentação e periféricos, sem contar a destilação do vinho obtido, são pontos que se trabalhados de maneira correta podem alavancar os índices de aproveitamento. Além disso, cabe salientar que o mix de produção pode alterar significativamente a eficiência industrial”, acrescenta Shintaku.

OS PRINCIPAIS DESAFIOS

Olhando de uma maneira ampla, as usinas brasileiras têm conseguido trilhar o caminho certo rumo à máxima eficiência industrial. Dalla Vecchia relata que hoje a cana representa mais de 50% do custo dos produtos finais. Assim, quem não conseguir tirar o máximo da matéria-prima pode ter sua operação inviável.

Como os produtos são commodities sobre as quais não há controle de preço, o ganho fica na eficiência de cada planta. No entanto, ele destaca que muitas vezes, no Brasil, a importância que se dá à produção é maior do que aquela dada à eficiência.

“As relações são inversamente proporcionais. Para o mesmo maquinário, quanto maior a produção menor a eficiência. Cabe ao bom gestor equacionar perdas x ganhos, o que nem sempre é realizado”, observa Della Vecchia.

Para Shintaku, os principais gargalos observados atualmente são a alta rotatividade de profissionais, o uso de um sistema ineficaz e sem uma gestão atuante, a ausência de treinamento efetivo e a falta de investimento específico com o intuito de obter uma maior eficiência.

“Para abrandar o efeito desses gaps, é fundamental uma gestão eficaz, um time bem treinado e engajado. Além disso, são necessários medidores e dispositivos de amostragem bem calibrados capazes de conservar amostras e um laboratório capacitado para analisa-las. Somado a isso, é preciso um corpo técnico crítico em relação ao assunto para que seja realizada auditorias internas e algumas externas”, salienta.

Mesmo com esses desafios, algumas empresas estão se movimentando com o objetivo de melhorar seus desempenhos. Por exemplo, alguns avanços tecnológicos têm permitido o desenvolvimento e aplicação de enzimas para eliminar a dextrana, convertendo-a em produção de glicose. Outras empresas têm desenvolvido leveduras de alto desempenho na produção de etanol, com redução sensível da produção de subprodutos, como glicerol e acidez acética.

“Em outros casos, companhias têm aperfeiçoado o sistema de esterilização do mosto, eliminando as contaminações que atualmente chegam a registrar de 102 a 103 UFC (Unidade Formadora de Colônia) e, assim, alcançado melhores resultados. Sem sombra de dúvidas, ainda existem outras tecnologias que podem ser implantadas não só na fermentação e destilação, quanto na própria extração, no tratamento do caldo e fabricação de açúcar, assim como nas demais áreas fabris”, finaliza Shintaku.

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