Edição 185
Não basta ser dono: tem que participar!
Sabemos que essa posição por si só daria o direito a vocês de não ter que olhar para nada que não fosse do seu interesse ou foco primário. Mas, como dono, precisam olhar para todos os cenários pelos quais estão lutando e não só o externo
*Beatriz Resende
Se teve uma pessoa que ao longo da carreira aprendeu a entender a posição dos donos e/ou a alta direção nas organizações, fui eu. Parece uma colocação singular e com um viés de obviedade, mas na verdade posso dizer, fazendo a mea-culpa para representar alguns profissionais de RH da minha geração que sempre carregaram o peso de não terem conseguido penetrar na alma, na visão e no foco dos empresários e dirigentes, mostrando a importância das ações e práticas voltadas para a valorização das pessoas no negócio, que essa foi uma grande evolução. Com certeza isso já mudou muito desde meu início de carreira na área e hoje somos aceitos naturalmente, em alguns ambientes, como área e profissionais que adquiriram o direito ou foram aceitos a tomar uma posição estratégica no melhor lugar do negócio: aquele que todo mundo quer estar, ao lado de quem tem realmente o poder de fazer, de mudar as coisas, de evoluir, de ousar.
Pois bem: ficamos mais perto do dono, das primeiras posições da empresa, mas isso não quer dizer que as coisas se tornaram mais fáceis para nós. Acho que agora teremos que provar mais ainda a importância da nossa gestão para continuar sendo aceitos, usufruindo desse destaque que nos foi concedido. O de área estratégica. E temos muito a fazer diante disso.
Sim, eu entendi claramente que, ao contrário do que eu sonhei um dia – que donos de empresas poderiam ser enfeitiçados por um discurso competente da nossa parte ou que bastava o profissionalismo e boa vontade no dia a dia para que o posicionamento desse grupo mudasse completamente -, perfis empreendedores e responsáveis por milhares de desafios, e pessoas destinadas a carregar grande dose de risco nas ações que se prestavam a conduzir, talvez não tivessem mesmo o foco principal para aquilo que sempre quisemos. Na verdade, acho que como toda posição unilateral de defesa de ideias, ideais e sonhos que qualquer profissão ou ideologia tenham, nós de RH também achamos, por muito tempo, que esse público era insensível por não olhar para nosso escopo da forma que acreditávamos ser vital. E brigamos internamente, mas principalmente com nós mesmos, diante dessa dura e cruel realidade. E essa visão equivocada fomentou um grande processo de vitimização continuada na nossa classe.
Digo equivocada sim, porque na verdade, e da forma que pretendíamos tratar o assunto, sempre nos colocamos numa posição de menos valia em relação ao todo. Isso mais por nós do que qualquer outro algoz invisível ou inalcançável.
Dito isso, e confesso um pouco aliviada pela presente sensação de maturidade que toma conta de mim (e só quem viveu esse RH que cito, temperado com minhas características, em particular, sabe do que estou falando), passarei a refletir sobre a responsabilidade real desse mesmo grupo que, de um lado, desobriguei de algumas missões quase que impossíveis, mas que de outro chamarei à realidade, esta sim, bem possível e necessária.
Sim, confirmo minha visão de que o empresário, o patrão, o principal dirigente de um negócio, não precisam se interessar especialmente pela área de RH e suas ações/programas, da forma que sempre sonhamos que eles estivessem: juntos e comprometidos com a causa. Isso não quer dizer que eles não devam ser humanos, valorizar e patrocinar boas práticas e exigirem que quem os representa abaixo ande na linha, dentro do que se entende como papel profissional, ético e maduro, com a missão de convergir esforços para o sucesso maior do negócio, esta sim a sua maior causa, aquela que arrebanha milhares de pessoas envolvidas e ligadas. Isso por si só já é uma grande responsabilidade.
O fato de empresários e dirigentes do maior escalão não vibrarem com as nossas descobertas e constatações sobre pessoas e a forma de atingi-las, não quer dizer que eles não acreditem que resultados venham desse público bem estimulado e valorizado. Só que não são atraídos por fazer isso eles mesmos. É uma questão de perfil e de prioridade. Mas eles podem delegar essa atuação e achar um tempo para acompanhar e validar se a empresa está caminhando bem nesse sentido. O que não pode acontecer, como vejo muito, é simplesmente, por tamanho desinteresse, sobrecarga de agenda, foco em alguns pontos do negócio somente e olho fechado para muitas questões que até chegam, mas de relevância menor perto de outras providências ou pela subestimação do assunto ou da sua interferência nele, é deixar que o corpo e alma de suas empresas fiquem à mercê de cenários que talvez, vocês, dirigentes-primeiros, não tenham nem conhecimento. Nem tudo está bem como parece. E não estou falando do cenário econômico-financeiro.
Cobrais mais, estimados heróis da luta pela sobrevivência do negócio, do ser que habita a sua empresa: que tem você/vocês como cabeça, contando com um corpo (colaboradores) e membros sólidos (gestores e líderes) na consecução dos seus objetivos e missões.
Não basta ser dono: sabemos que essa posição por si só daria o direito a vocês de não ter que olhar para nada que não fosse do seu interesse ou foco primário. Mas, como dono, precisam olhar para os cenários pelos quais estão lutando, e não só o externo. Posso dizer que o interno não fica nada atrás em termos de desafios e preocupações.
Seja dono: participe! Arregimente pessoas que demonstrem propósito e fibra. Aprendam a olhar para quem realmente está do lado. Não deixem o seu império na mão de quem não o merece. Não deixem seus órgãos mais preciosos e vitais na mão de quem não está disposto a ser exemplo.
Não basta ter: tem que manter vivo! Não delegue isso inteiramente a ninguém. Busque parceiros e interessados, mas faça a sua parte, aquela que ninguém pode fazer por você!
Dedico esse texto a todos os empresários que já têm conseguido estar mais próximos do propósito discorrido aqui, e que, com todo mérito devido, têm conquistado resultados fantásticos no seu negócio. Sou privilegiada de conhecer e trabalhar com alguns deles e espero ainda conhecer muitos outros e ajudá-los nessa caminhada! Faz parte da missão que deleguei a mim!
* Beatriz Resende é consultora especialista em Desenvolvimento Humano e Organizacional da Dra.Empresa