Notícia quente dessa semana: a Shell está negociando a compra da BP por mais de 80 bilhões de dólares. Um valor que faz até plataforma de petróleo boiar sozinha. Se o negócio se confirmar, será uma das maiores transações da história da energia. Mas a pergunta que interessa pra nós, aqui do lado de cá do Equador, é simples: e no Brasil, isso muda alguma coisa?
Vamos por partes, como bom mineiro faz com frango com quiabo. A resposta direta é: não muda quase nada. E vou te contar por quê.
A BP já saiu do varejo no Brasil há tempos
Pouca gente lembra, mas a BP vendeu sua operação de distribuição de combustíveis no Brasil para o Grupo Ultra em 2018. Isso incluía a operação da BP Combustíveis Brasil, que atuava especialmente em querosene de aviação (QAV) e diesel. Desde então, a empresa não atua mais no downstream brasileiro, pelo menos na distribuição tradicional.
Atualmente, a presença da BP no Brasil é concentrada em:
• Exploração e produção de petróleo e gás (upstream),
• Energia renovável (como joint ventures com foco em bioenergia e solar),
• E uma fatia em aviação, ainda como fornecedora internacional.
Ou seja: não há bandeira BP nos postos brasileiros, e muito menos conflito com a atuação da Shell via Raízen.
E a Raízen? Continua firme com o Ometto
A Shell é sócia da Raízen, junto com o grupo Cosan (família Ometto), maior empresa integrada de energia renovável do país. A Raízen domina:
• Mais de 7 mil postos de combustíveis com a marca Shell,
• Produção de etanol, açúcar e bioeletricidade,
• E terminais e dutos espalhados pelo Brasil.
Essa estrutura não será afetada pela negociação global com a BP. O casamento com o Ometto segue firme — com aliança no dedo e faturamento na veia.
No mundo, a dança das gigantes continua
A negociação Shell–BP vem na esteira das aquisições recentes da Exxon (Pioneer) e Chevron (Hess). É o setor de energia se consolidando para enfrentar a transição energética e manter rentabilidade em um cenário de incertezas geopolíticas e ambientais.
Reflexo por aqui? Ainda não. Mas fique atento. Para o consumidor e até para os revendedores, a mudança será invisível. Mas no médio prazo, vale observar os efeitos concorrenciais, sinergias tecnológicas e reposicionamentos estratégicos que podem respingar, mesmo que indiretamente, no Brasil.
Arremate mineiro
O setor de energia é como jogo de xadrez: cada lance é pensado com anos de antecedência. A Shell não está comprando a BP só pelo que ela é hoje — mas pelo que ela pode representar no mundo de amanhã. E como dizia meu pai, o velho Olavo: “Quando dois gigantes se ajeitam no banco da praça, o banco range, e a praça inteira presta atenção.”
*Wladimir Eustáquio Costa é CEO da Suporte Postos, especialista em mercados internacionais de combustíveis, conselheiro e interventor nomeado pelo CADE, com foco em governança e estratégia no setor downstream.