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Ambiente de guerra comercial já afeta economia mundial

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O navio RB Eden partiu do terminal da Archer Daniels-Midland em Corpus Christi, no Texas, com uma carga de sorgo, em direção a Xangai, em meados de abril. Estava no meio do oceano Índico quando a China anunciou que aplicaria sobretaxa de 179% ao produto americano. O navio imediatamente fez a volta e rumou para a Europa, mas nunca ancorou lá. É que, durante o novo trajeto, Pequim anunciou que não aplicaria mais a sobretaxa contra sorgo e o RB Eden retomou o rumo de Cingapura.

Esse zigue-zague, relatado pela Bloomberg, ilustra incertezas e o aumento de custos com a tensão acirrada no comércio internacional com quatro – e não apenas uma – frentes de conflitos abertas por Donald Trump: contra a China por causa do déficit americano e as políticas de Pequim; contra o México e o Canadá sobre o Nafta; contra aliados europeus e de outras regiões por causa das tarifas de aço e alumínio; e contra a Organização Mundial do Comércio (OMC).

China, União Europeia (UE), Japão, Índia, Rússia e Turquia notificaram à OMC listas de produtos americanos que planejam retaliar com sobretaxas. UE, China e México também abriram disputas contra Washington no tribunal da OMC.

Especialistas ouvidos pelo Valor, deixam claro que a ação deflagrada pelo unilateralismo de Trump já tem os primeiros efeitos negativos, podendo afetar milhares de empregos e muitos bilhões de dólares de negócios.

O diretor-geral da OMC, Roberto Azevêdo, diz diplomaticamente que boa parte dos anúncios de restrição ao comércio ainda não se traduziu em ações, mas que essas ameaças já podem fazer danos.

“Já estamos vendo sinais de indicadores que apontam indícios de queda brusca de pedidos de exportação”, afirmou. “Os indicadores mostram que haverá impacto lá na frente. Só não sabemos ainda quantificar o impacto e os setores que serão afetados.”

“Já estamos vendo sinais de indicadores que apontam indícios de queda brusca de pedidos de exportação”, afirmou. “Os indicadores mostram que haverá impacto lá na frente. Só não sabemos ainda quantificar o impacto e os setores que serão afetados.”

“De um lado, novas encomendas podem ser afetadas da noite para o dia, e mesmo mercadorias já em trânsito podem ser forçadas a mudar de destino. Isso aumenta incertezas que podem influir nas decisões de investimento e de encomendas”, diz ele. “De outro, as tarifas anunciadas até agora afetam apenas uma pequena parte do comércio mundial.”

Se o conflito se limitar ao aço e ao alumínio, o estrago será menor. Mas se Trump realmente aplicar sobretaxas à importação de automóveis, provocando retaliações de outros países, a dimensão será muito maior. O setor automotivo é central nas trocas globais, com US$ 1,4 trilhão de exportações por ano. Somente a UE (composta por 28 países) exportou US$ 683 bilhões em 2016. Um conflito nesse segmento envolverá o grosso do PIB mundial, desde EUA, China, toda a UE, passando por Japão, Coreia do Sul, Canadá, México e Brasil.

Quase dois terços das mercadorias negociadas estão conectadas a cadeias globais de valor, e choques no sistema comercial são globalizados. Com base nisso, Richard Bolwijn, coordenador do Relatório Mundial de Investimentos, da Unctad (órgão da ONU sobre comércioo), considera que a escalada na tensão comercial deve piorar tendências que já não são boas para a economia mundial.

Primeiro, o crescimento das cadeias globais de valor já vinha estagnando. O valor agregado estrangeiro no comércio global – a importação de bens e serviços incorporados nas exportações de um país – continua caindo.

Além disso, a taxa de expansão da produção internacional está diminuindo. Bolwijn aponta uma mudança na globalização, com modalidades das transações transfronteiras gradualmente passando de tangíveis para intangíveis. Ou seja, em vez de criação de fábricas e criação de empregos, muitas multis estão aumentando num ritmo muito maior as vendas de serviços e de dados.

Estudo do Banco Central Europeu (BCE) sobre as implicações das crescentes tensões no comércio para a economia global constata que as mercadorias afetadas pelas sobretaxas anunciadas representam só 2% das importações feitas pelos EUA e menos de 1,75% do comércio global. Visto de forma isolada, o impacto direto parece limitado. Mas o risco associado com uma escalada das tensões e maior reversão da globalização claramente aumentou. O estudo prevê que isso pode afetar decisões de investimentos em todo o mundo.

Pelas simulações feitas pelo BCE, no caso de aumento significativo do protecionismo o impacto sobre o comércio global e a produção pode ser elevado, e particularmente severo nos EUA. O impacto específico sobre cada país depende de seu tamanho, abertura e intensidade do comércio com as nações que impõem as sobretaxas. No caso de aumento generalizado de tarifas, os preços maiores de importações podem elevar os custos de produção das empresas e reduzir o poder de compra das famílias.

O Fundo Monetário Internacional (FMI) calcula que, se todos os países elevarem tarifas e barreiras não tarifárias gradualmente ao longo de três anos, os preços de importações subirão 10%. O maior custo de transações de mercadorias derruba a produção em quase 1,75% após cinco anos e quase 2% no longo prazo. O consumo global cai em volume similar, e o investimento global ainda mais. O comércio mundial sofreria ainda mais, com importações e exportações caindo 15% após cinco anos.

A “guerra comercial de Trump” pode custar US$ 470 bilhões à economia mundial, segundo a Bloomberg Economics. Isso no cenário de aplicação de sobretaxa de 10% e retaliação pelo resto do mundo. A economia mundial seria 0,5% menor em 2020 comparado ao cenário sem alta de alíquotas.

Sem surpresa, uma pesquisa do instituto alemão Ifo junto a 913 economistas de 120 países avalia que a política de Trump terá impacto negativo sobre o mundo. Aponta as economias emergentes na Ásia, países desenvolvidos fora da UE e os próprios EUA como os maiores perdedores com a imposição de sobretaxa às importações.

Na quinta-feira, Azevêdo reuniu em Genebra representantes de 60 companhias e associações internacionais, incluindo Unilever, Alibaba, Amazon, Apple, BT Group, Fedex, DHL, Adidas,  Embraer, Confederação Nacional da Indústria do Brasil (CNI), Associação de Exportadores de Bangladesh, Business Europe, Cargill, Consumers International, Diageo, Dow Chemical, Ericsson, Google, Huawei, Keidanren, Samsung, Syngenta.

Vários executivos não esconderam preocupações porque sabem que o ambiente prenunciando uma guerra comercial pode ter custos altos para seus negócios. Alguns reclamaram que seu setor não tem nada a ver com o conflito do aço, alumínio ou de propriedade intelectual, mas temem ser afetados por restrições em outro país.

“Não tenho relação com o pecado original, mas posso ser igualmente castigado”, disse um executivo.

A questão é o que virá pela frente. Na cena comercial, a postura de Donald Trump leva à discussão de dois cenários extremos.

No primeiro, os parceiros, sob risco de perder acesso ao mercado americano, aceitam negociar com os EUA, encontrando soluções menos restritivas para suas exportações. Para certos analistas isso pode estimular Trump a avançar ainda mais nas ações unilaterais.

O segundo cenário, no outro extremo das possibilidades, é a posição dura de Washington levar os outros países a criar uma coalizão, inclusive com a China, contra os próprios EUA, em ações coordenadas para responder com retaliações. É um cenário extremo e inquietante, que levaria a uma verdadeira guerra comercial global.

Entre esses dois cenários, há outros, mais próximos do primeiro ou do segundo, mas com a mesma consequência: desaceleração da economia mundial, mais custos para as empresas e encarecimento dos produtos do dia a dia para o consumidor no mundo inteiro.

Fonte: Valor Econômico 

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