As eleições 2022, que acontecerão no próximo domingo e elegerão o próximo presidente do Brasil, governadores, senadores, deputados federais, distritais e estaduais, agitam o País, mas sobretudo, preocupam um dos setores chave da economia: o agronegócio e mais especificamente, o setor sucroenergético.
Isso porque, mesmo com a tentativa de candidatos da chamada “terceira via”, grande parte das pesquisas mais recentes apontam para uma possível vitória do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ou um segundo turno entre ele o presidente e candidato à reeleição, Jair Bolsonaro (PL).
Durante a campanha eleitoral, as declarações do candidato do PT aumentaram seu distanciamento do agronegócio. Em entrevista à TV, Lula chegou a afirmar que parte do setor é fascista e direitista. Em outro momento, disse que iria impor limites à exportação de carne, setor em que o Brasil é líder mundial. O MST se pronunciou sobre mais invasões de terra em um eventual novo governo Lula. Além disso, o petista afirmou que o agronegócio não gosta dele porque sabe que, se for eleito, vai acabar com a invasão da Amazônia.
No entanto, Lula vem amenizando o tom do discurso e, em entrevista ao Canal Rural, disse sentir orgulho de ter levado muita gente do agronegócio brasileiro para outros países e negou qualquer intenção de limitar a exportação de carne. Disse que “se o governo tentar fazer uma intervenção, vai quebrar a cara”. Ainda falou que trata o setor com respeito, sabendo da importância dele para a economia brasileira e para o desenvolvimento do país. Quanto ao MST, defendeu o movimento dizendo que “pouquíssimas” terras produtivas foram invadidas no país, fato desmentido em reportagem do jornal a Gazeta do Povo.
Para Arnaldo Corrêa, consultor, especialista em mercado de açúcar e etanol e diretor da Archer Consulting, a vitória de um ou outro candidato não deve impactar sobremaneira o segmento sucroenergético. Isto porque, segundo ele, há muito tempo, independentemente do governo, o setor vem pagando a conta da maneira atabalhoada como cada um dos governos tratam o setor, sem o menor planejamento de longo prazo, sem um plano estratégico, sem a preocupação de reforçar a importância que o etanol tem lá fora, não apenas pela questão de ser um produto renovável, mas porque gera um grande volume de empregos.
“O fato é que nos 14 anos do governo petista, o que vimos foi o Brasil segurando o preço da gasolina, priorizando a venda veículos, com uma gasolina barata, porque era subsidiada pelo contribuinte e pelo setor sucroalcooleiro, que durante uma década vendeu etanol hidratado abaixo do custo de produção em 60% das vezes. Com isso, o endividamento do setor cresceu, usinas fecharam e podemos encontrar uma correlação muito estreita com o fato dos preços administrados pelo governo”, adiciona Corrêa.
A análise do consultor é de que todo o trabalho feito pelo governo Temer, pós-Dilma (PT), com a mudança na Petrobras, seguindo os preços internacionais, deu oportunidade para que as usinas pudessem fazer o hedge do seu produto, o que trouxe a possibilidade das unidades poderem utilizar instrumentos derivativos que protegessem o valor do etanol.
“Já com o presidente Jair Bolsonaro, que tinha como o mote “mais Brasil e menos Brasília”, imaginávamos que íamos ter um governo de abordagem liberal, com menos intervenção. Mas o que vimos recentemente foi um completo desastre com a eliminação dos impostos, botando o preço do etanol hidratado lá para baixo e evidentemente colocando dois problemas. Primeiro a própria sobrevivência do setor e, segundo, a insegurança jurídica. Qual setor vai expandir sabendo que o presidente de plantão pode usar sua caneta e praticamente decretar a sua destruição?”, questiona Corrêa.
Há uma retomada da economia mundial ou uma recessão menor do que se esperava, há uma recuperação do consumo de açúcar, em especial na Ásia, a recuperação econômica no Brasil aumentando o consumo de alimentos e bebidas, e, por último, mas não menos importante, a recuperação do mercado de combustíveis que atrasou 40 meses com a Pandemia.
“Se tivermos uma tempestade perfeita, o que significa o aumento do consumo em várias fontes, o Brasil hoje não tem cana-de-açúcar suficiente para isso. Essa arbitragem entre açúcar e etanol deverá ser especialmente muito delicada e vai ainda exorbitar essa abordagem se nós tivermos uma mudança na matriz energética mundial, dando prioridade para os combustíveis renováveis, o que abre uma importante janela para o Brasil na exportação de etanol”, afirmou.
Ainda de acordo com ele, os dois fizeram estragos na mesma proporção. “Acho que para o setor é indiferente. O que o setor precisa fazer é ter uma voz muito forte em Brasília para que evite que situações como essa que ocorreram com a redução do imposto venham a colocar em cheque a saúde e sobrevivência do próprio setor”, salienta Corrêa.
Ricardo Pinto, consultor e diretor da RPA Consultoria, admite que falar de eleições às vésperas é bastante polêmico, mas diz que não acredita que, caso haja uma mudança de governo, haveria um grande impacto, sobretudo para o segmento sucroenergético, em apenas quatro anos.
“A grosso modo, o agro apoia o Bolsonaro muito mais por medo do que por apoio a todas as medidas tomadas por ele. Há um medo da volta dos traumas causados pelos governos de esquerda no agronegócio do passado, como as invasões do MST e de toda a insegurança jurídica causada na época.
No entanto, o diretor da RPA Consultoria aponta que o setor canavieiro também vem passando por impactos muito ruins causados por decisões do atual presidente, principalmente com a questão da desoneração dos preços dos combustíveis.
“Não temos como saber se essa indecisão continua ou não no próximo ano. Houve uma queda de 5% dos preços de etanol exatamente no meio do ano. Essa descida de degrau foi bem grande e incomum entre julho e agosto, deixando a usinas em condição complicada no meio a safra, tendo que segurar estoques de etanol, com exportações para a Europa acontecendo a toque de caixa, porque o etanol passou a não ser atrativo para a venda. E o açúcar, refletindo esse medo do mix, também poderia estar num patamar melhor por conta da safra brasileira”, observa.
Para Ricardo, a eleição do voto útil, como vinha acontecendo em eleições anteriores, não é positiva para o governo federal nem em relação ao agronegócio e nem para o setor canavieiro.
“O agronegócio e o setor canavieiro vai em peso apoiar o Bolsonaro muito mais pela opção de ser o candidato que causa menos medo, o candidato que não aparece com loucuras, conceitos e ideologias perniciosas para o setor. Mas também não vejo, em um possível governo de esquerda, um potencial de dano muito grande. Sim, trará dano muito maior do que a continuidade do Bolsonaro, mas vejo um potencial de dano restrito. Entretanto, como não sabemos se em uma entrada de governo Lula ele se manteria ou haveria alternância de poder, fica difícil projetar”, disse.
Para o produtor de cana da região de Lençóis Paulista, Luiz Carlos Dalben, se Lula ganhar o setor do agronegócio tem muito a perder. “Ele já chamou o agronegócio de fascista, ele disse que vai regular a questão da exportação de gado. Ele não tem uma aptidão para esse negócio de uma maneira profissional, com visão de desenvolvimento e riqueza. Ele está muito mais ligado à questão do MST, que é um movimento muito mais partidário político. Já vimos em governos anteriores do PT, desde o Lula até a Dilma, o fechamento de mais de 70 usinas sucroenergéticas, o que trouxe um grande prejuízo ao País, em grande parte pela regulação de preços da gasolina. Então, não enxergo o governo Lula como proativo para o agronegócio. Acredito que temos muito a perder”, disse à RPAnews.
Com relação ao Bolsonaro, o produtor de cana já vê de forma diferente. Ele diz que reconhece que houve um desenvolvimento das estradas para escoamento dos produtos agrícolas, que vê melhoras na questão dos portos, da infraestrutura e no desenvolvimento de ferrovias. “Ele levou água até o Nordeste, completando a Transposição do Rio São Francisco, que estava parada há anos, onde a agricultura familiar vai poder ter um desenvolvimento melhor. O agronegócio não é só da porteira para dentro, mas da porteira para fora, com a produção de máquinas, equipamentos, caminhões, fertilizantes, defensivos agrícolas. É muito mais amplo. E nessa questão não percebemos nada que o PT vá trabalhar”, destacou.
Ismael Perina, produtor de cana-de-açúcar, diz que muitas matérias importantes para o agro, que estavam complexas de dar prosseguimento, andaram nos últimos anos, durante do Governo do presidente Jair Bolsonaro. “Muitas ainda não concluídas, mas que vieram à discussão no Senado, boa parte delas aprovadas na câmara, no que diz respeito a uma nova regulamentação para defensivos, a criação do Fiagro, novos mecanismos de financiamento para o agro e outras pautas como a questão de Seguro Safra, são coisas que aconteceram durante esse Governo”, disse.
Para ele, a proposta verbal do candidato de esquerda, o Lula, mostra que tudo voltaria à tona. “Ele dá muita voz ao MST, na questão da invasão de terra, revisão das mudanças que foram importantes para o desenvolvimento do País, para a criação de empregos, como a mudança na legislação trabalhista, a volta da contribuição aos Sindicatos, questão de privatizações. Esse governo conseguiu reduzir bastante os rombos nas estatais”, disse.
De acordo com o produtor, boa parte do agro aprovou as ações do Governo atual. Existe uma vontade grande de que as coisas continuem evoluindo. “Foram promovidas algumas ações importantes, principalmente o documento definitivo para pessoas que foram incentivadas a pegar um lote de terra, mas que não tinham posse. Mais de 400 mil posses foram concedidas no atual Governo.”
Já o Governo do Estado de São Paulo, na opinião do produtor também precisa de mudanças. “Tivemos uma decepção muito grande com o aumento de impostos durante a Pandemia, inclusive do etanol, então foi um fato que me marcou. O governo do Estado precisa ser revisto e eu pessoalmente estou fechado com o Tarcísio, uma pessoa inteligente, capacitada e que fez bastante coisa durante sua passagem pelo Ministério”, revelou.
Planos para o Agro e setor de bioenergia
Essencial para a economia brasileira e um dos maiores exportadores globais, o agronegócio brasileiro ganhou mais espaço nas campanhas dos candidatos à presidência da república neste ano. Mesmo assim, os programas de governo dos candidatos registrados na Justiça Eleitoral, segundo economistas e analistas políticos, ainda são generalistas e um pouco superficiais quando se trata do assunto agronegócio. Confira alguns destaques de cada plano de governo para o agronegócio dos principais candidatos à Presidência da República:
Jair Bolsonaro (PL)
Candidato à reeleição, o plano de governo de Jair Bolsonaro defende a promoção da competitividade e a transformação do agronegócio por meio do desenvolvimento e da incorporação de novas tecnologias biológicas, digitais e portadoras de inovação.
O plano também prevê a criação de medidas para promover e fortalecer a agropecuária e a mineração, importantes na performance econômica brasileira. Jair Bolsonaro pretende também estimular empresas modernas de eneficiamento, o que incluiria cooperativas, pequenos e grandes produtores.
O plano de governo do candidato do PL também prevê medidas para melhorar a sustentabilidade no campo a partir da adoção da bioeconomia com o objetivo de oferecer soluções sustentáveis aos variados sistemas de produção; da substituição, ao máximo, de recursos fósseis e não-renováveis; e da ação em consonância com a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável.
Outras medidas do plano de governo são fortalecer e promover a implantação de práticas agrícolas que aumentem a produtividade e a produção no campo, para isso prevê: manter ecossistemas e a capacidade de adaptação às mudanças do clima, melhorar progressivamente as oportunidades de geração de emprego e renda dos produtores rurais; dar atenção aos programas de Defesa Agropecuária; incentivar a exportação; ampliar a cobertura e a qualidade do transporte ferroviário; e aumentar a produção nacional de fertilizantes.
Na plataforma de governo de Bolsonaro, o incentivo à pesquisa e o investimento em tecnologia são apontados como medidas para desenvolvimento da indústria, saúde e agronegócio. Entre as propostas estão ampliar e consolidar a implementação da tecnologia 5G e formular estratégias que utilizem o dinheiro público em pesquisas de ponta.
Outra medida relacionada ao agro é a de aumentar a segurança no campo e buscar soluções específicas para a proteção de áreas fora dos núcleos urbanos “protegendo não só a família do campo, mas os equipamentos e insumos de uma forma geral, cujo valor agregado altíssimo tem levado parcela de criminosos a se voltar para esse público”. Entre outras ações, o programa de governo propõe: criar políticas para garantir a segurança e liberdade seja para o pequeno produtor da agricultura familiar, seja para grande produtor da agropecuária; e consolidar e ampliar ações de regularização funcionária garantindo o direito à propriedade, “reduzindo os conflitos no campo e as invasões
Luiz Inácio Lula da Silva (PT)

O plano de governo do ex-presidente Lula prevê o fortalecimento da produção agropecuária por meio de “financiamento, compras governamentais, investimento público” e ainda de ampliar e agregar valor à produção, “com ênfase em inovações orientadas para a transição ecológica, energética e digital”.
O plano de governo também propõe: agregar valor à produção agrícola, com a constituição de uma agroindústria de primeira linha, de alta competitividade mundial; e fortalecer a produção nacional de insumos, máquinas e implementos agrícolas, fomentando o desenvolvimento do complexo agroindustrial.
Ainda na plataforma de governo, uma das medidas apresentadas é voltada à soberania alimentar e o acesso da população à alimentos saudáveis, o que seria possível: por meio de um novo modelo de ocupação e uso da terra urbana e rural; com reforma agrária e agroecológica; e com a construção de sistemas alimentares sustentáveis, incluindo a produção e consumo de alimentos saudáveis.
As medidas também preveem apoio à pequena e média propriedade agrícola, em especial à agricultura familiar e, ainda, “estimular a ampliação das relações diretas dos pequenos produtores e consumidores no entorno das cidades”.
Segundo o plano de governo do ex-presidente Lula, para fortalecer a produção agrícola no país é preciso repensar o padrão de produção e de consumo e oferecer alimentação saudável para a população. Segundo a proposta, para superar a crise alimentar e ampliar a produção de alimentação adequada e saudável é preciso: medidas que reduzam os custos de produção e o preço de comercialização de alimentos frescos e de boa qualidade; fomentar a produção orgânica e agroecológica; e incentivar sistemas alimentares com parâmetros de sustentabilidade, de respeito aos territórios e de democratização na posse e uso da terra.
O plano de governo do ex-presidente prevê o fortalecimento da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) para que ela possa identificar potencialidade dos agricultores e assegurar mais avanços tecnológicos no campo “essenciais para a competitividade e sustentabilidade tanto dos pequenos quanto dos grandes produtores”.
O programa defende avançar rumo a uma agricultura e uma pecuária que estejam comprometidas com a sustentabilidade ambiental e social para que o mercado brasileiro não perca espaço no cenário internacional. Para combater à alta no preço de alimentos, o plano de governo propõe estabelecer uma política nacional de abastecimento, que inclui: a retomada dos estoques reguladores; e a ampliação das políticas de financiamento e de apoio à produção de alimentos aos pequenos agricultores e à agricultura orgânica.
Ciro Gomes (PDT)

Em sua plataforma de governo, o ex-ministro Ciro Gomes considera o agronegócio uma das quatro principais áreas a serem estimuladas para a retomada do setor produtivo. As outras três são petróleo, gás e derivados e saúde e defesa.
O candidato se propõe a impulsionar o agronegócio, assim como as demais áreas, por meio de um conjunto de políticas públicas que inclui: estímulos à pesquisa e inovação; financiamentos específicos; compras públicas; incentivo às exportações.
Em sua agenda ambiental, Ciro Gomes defende que o crescimento do Brasil está atrelado a uma agenda ambiental clara, capaz de provar que a floresta em pé vale muito que um campo desmatado. Para isso, propõe uma estratégia de desenvolvimento regional, associada à maior segurança fundiária, que contribua para a redução do desmatamento. “Trata-se de uma estratégia que mostrará como é possível conciliar e integrar a lavoura, a pecuária e a floresta”.
Em energia renovável, etanol e biocombustíveis, o candidato tem em seu plano, apostar nas energias eólica, solar e hidrogênio verde. Colocar hidrelétrica como fonte reserva e transformar a Petrobras em empresa de novas fontes de energia.
Simone Tebet (MDB)

A senadora Simone Tebet elege a economia verde e desenvolvimento sustentável como um dos seus principais planos de governo.
Para os produtores agrícolas, o plano de governo de Simone propõe implementar: um plano de safra plurianual com diretrizes de financiamento e crédito agrícola; e seguro rural e armazenagem de médio e longo prazos.
Simone Tebet também promete apoiar a agricultura familiar com oferta de crédito, extensão agrícola e cooperação técnica e a melhoria das condições de conectividade e eletrificação no campo.
Como estratégias para ampliar a produtividade e aumentar a competividade do setor, o plano de governo propõe fortalecer e modernizar a Embrapa e apoiar órgãos de extensão rural; impulsionar a produção nacional de insumos agrícolas e fertilizantes, buscando aumentar a produtividade nacional e reduzir a dependência em relação a importações; apoiar polos agroindustriais por meio da expansão da infraestrutura e da logística, sobretudo ferrovias; e fortalecer e incentivar o cooperativismo.
Ela também defende impulsionar a expansão da agricultura de baixo carbono e a integração lavoura-pecuária-floresta, sobretudo para aproveitamento de áreas devastadas e que podem ser cultivadas sem desmatamento. E propõe afirmar a competição entre fontes energéticas: eólica, solar, hidráulica, biocombustíveis, biomassa, hidrogênio verde, etanol e gás natural.
Outra medida proposta é a de acelerar a adoção, a informatização, a consolidação e a análise de regularidade do CAR (Cadastro Ambiental Rural) — instrumento criado para viabilizar o cumprimento de normas pelos proprietários rurais, previstas no Código Florestal.
Simone Tebet também se propõe a criar um novo marco legal para a pesca, em uma gestão pesqueira integrada, que incluirá restrições e novas tecnologias para pesca de arrasto, dentro de um planejamento espacial marinho.
Por Natália Cherubin, com informações dos planos dos candidatos