Agrícola
Cana-de-açúcar mais resistente e resiliente a estresses com nutrição foliar especial
Uso de complexo de nutrientes com ativos biológicos traz resiliência fisiológica à cana-de-açúcar, permitindo maior estabilidade e crescimento pós períodos de seca e frio
Por Natália Cherubin
Longos períodos de estiagem, assim como exposição dos canaviais aos períodos mais frios do ano ou mesmo a ocorrência de geadas, causam impactos diretos na produtividade da cana-de-açúcar. Experimentos agronômicos realizados entre as safras 2020/21 e 2021/22 apontam que o uso de alguns micronutrientes via folha tem auxiliado na maior resistência da cana às condições de estresses climáticos como déficit hídrico intenso, e resiliência para recuperação após períodos de baixas temperaturas. E o melhor, com ganhos de produtividade.
Diversos trabalhos de pesquisa apontam que as tensões abióticas afetam diretamente a taxa de fotossíntese da cana-de-açúcar, o crescimento das suas raízes, dificultando a absorção e eficiência na utilização de nutrientes. “Estudos realizados na Esalq/USP, mostraram que quanto mais profundo o sistema radicular da cana-de-açúcar, melhor é a sua absorção. Sendo assim, para plantas que possuem raízes entre 0-10 cm, 42 dias sem chuva são suficientes para matar 60% das plantas, enquanto que raízes de 0-30cm, resultam em 100% de plantas vivas”, explica o consultor e professor especializado Adubos, Adubação e Fertilidade do Solo pela Esalq/USP, Godofredo Vitti.
Alguns impactos diretos de agentes abióticos são:
1) Fechamento dos estômatos: para reduzir a perda de água através da transpiração, plantas sob estresse hídrico fecham seus estômatos (estruturas localizadas na epiderme da folha responsáveis pela troca gasosa, liberando água na forma de vapor e absorvendo CO2 atmosférico) mais precocemente, impactando no resfriamento das superfícies foliares e na aquisição de carbono na forma de CO2 para que este seja biossintetizado.
2) Atividade enzimática: temperaturas acima ou abaixo da faixa ótima considerada para a cultura podem afetar negativamente a eficiência de algumas enzimas responsáveis pela fixação do carbono nas plantas, como a PEPcase e a Rubisco.
3) Radiação luminosa excessiva: A eficiência fotossintética depende da radiação solar, no entanto, se há falta de água, ou baixa eficiência enzimática, ocasionada por estresses no geral, o excesso de luz pode ocasionar um desbalanço na capacidade enzimática em receber os elétrons gerados na fase fotoquímica da fotossíntese. Desta forma, o próprio oxigênio atuará como receptor final de elétrons, e irá se comportar como um agente oxidante capaz de causar danos nas células da planta.
“Se juntarmos os efeitos, notamos que canaviais sob condições de estresse têm seu desenvolvimento afetado devido, principalmente, pelos danos ocasionados no aparato fotossintético, o que reduz drasticamente a eficiência da planta em realizar fotossíntese, além de danos celulares, principalmente a peroxidação lipídica”, explica o pesquisador e professor da Universidade Estadual Paulista (UNESP) de Botucatu, SP, Carlos Alexandre Crusciol
De maneira geral, as plantas desenvolveram mecanismos de sobrevivência quando são submetidas a estresses diversos, bióticos ou abióticos, o que permitiu tolerar ou adaptar-se ao ambiente. No entanto, de acordo com o professor da Unesp, há como manejar a planta para potencializar a mitigação dos efeitos negativos causados pelo estresse.
“A aplicação de nutrientes responsáveis pela ativação de enzimas antioxidantes, aminoácidos, precursores hormonais e compostos vegetais, estimulam a planta a sintetizar metabólitos de defesa, sejam esses enzimáticos ou não enzimáticos, assim como os hormônios ligados ao metabolismo de defesa aos estresses”, detalha.
Segundo Thiago Moura, especialista da Produto da Yara Brasil, preparos profundos e condicionamento de subsuperfície são práticas importantes no momento de formação do canavial para ajudar o desenvolvimento radicular da cana. “Nas usinas, a aplicação de vinhaça localizada ou via aspersão também tem ajudado muito a diminuir os impactos da seca. Produtores que não tem acesso a este subproduto, por exemplo, vêm utilizando tecnologias que contém, em um só produto, um complexo de nutrientes associados a extratos de algas e/ou outros componentes”, explica Thiago Moura, especialista da Produto da Yara Brasil.
Atuação dos nutrientes em cana
Entre os nutrientes que ajudam a mitigar os efeitos da seca ou geadas estão: magnésio, fósforo, zinco, ferro, cobre, manganês e boro. “De maneira geral, existe a contribuição de um ou mais elementos aplicados em plantas sob condições de estresse, no entanto, para que haja resposta, é importante que todos os nutrientes estejam balanceados e que não haja impedimentos físicos e químicos que limitem o crescimento das raízes no solo. Desta forma, o conjunto de ações podem entregar respostas adequadas pela planta”, destaca Crusciol.
Alguns micronutrientes desempenham um papel importante no combate ao estresse oxidativo, no entanto, o Zinco, de acordo com Moura, tem papel de destaque por ser um elemento importante para crescimento de plantas, atuando diretamente na ativação de várias enzimas do metabolismo antioxidante, e por ser o micronutriente mais deficiente e responsivo nos canaviais.
O Zn, além de ser ativador de enzimas antioxidantes, também atua no alongamento dos entrenós (parte do colmo responsável pelo acúmulo da sacarose), na dominância apical, pois é precursor do aminoácido triptofano, que por sua vez é precursor do hormônio auxina, e na ativação da enzima Anidrase carbônica, responsável pela hidratação do CO2 e transporte do carbono para sua fixação.
Por ser um micronutriente catiônico, Crusciol explica que o Zn pode interagir com as cargas negativas da matéria orgânica do solo, bem como estar na forma hidroxilada a depender do valor de pH do solo, o que pode reduzir sua disponibilidade. “Pensando nisso, a aplicação de parte deste nutriente, em estádios fenológicos mais avançados, via foliar, pode ser uma alternativa de fornecer Zn às plantas e auxiliar na mitigação de estresses abióticos”, afirma o Crusciol.
“Enquanto o boro tem importância na estruturação de membranas e lignificação das paredes vegetais, metabolismo de carboidratos e transporte de açúcares [muito importante neste cultivo] entre outros processos ligados a aumento de antioxidantes enzimáticos, o zinco é responsável pelo alongamento e crescimento celular, auxiliando no funcionamento dos fotossistemas e garantindo a manutenção da fotossíntese. São os dois elementos que tem os níveis mais baixos na maioria dos solos e que, ao mesmo tempo, dão a maior resposta em produtividade”, destaca o especialista da Yara.
Complexo de nutrientes via folha eleva TCH
Depois da análise, correções, condicionamento do solo e aplicação de macronutrientes como o fósforo, no meio de safra, a reposição de micronutrientes via corte de soqueira e/ou uso tecnologias de estimulação da planta podem e devem ser utilizadas. Já na época de máximo desenvolvimento vegetativo e início do período chuvoso, os complexos de micronutrientes via folha podem trazer mais incrementos de TCH e ATR.
Para Crusciol, além do básico bem-feito, a aplicações via foliar têm sido uma forma bastante eficiente de manejo na cultura. “Atualmente há inúmeras pesquisas que apontam o aumento da eficiência do uso da água, na eficiência fotossintética, enzimática e metabólica da planta com o uso de diversos produtos encontrados no mercado, com feitos nutricionais e fisiológicos”, adiciona.
Experimentos realizados durante as safras 2020/21 e 2021/22 com o objetivo de elevar o nível de informações sobre a recomendação do uso de fertilizantes especiais que combinam o uso de nutrientes e extratos de algas para aumentar a resiliência das plantas às condições climáticas adversas, foi realizado pela AgroQuatro-S, empresa de experimentação agronômica aplicada.
Para tanto, foram realizadas três experimentações com aplicação de um complexo de nutrientes que reúne o Boro e o Zinco (YaraVita Biotrac) nas plantações de cana-de-açúcar em regiões de déficit hídrico e temperaturas elevadas, ocorrências prejudiciais à cultura. Dois experimentos foram acompanhados em uma região de plantio na qual foram avaliadas duas variedades do cultivo, enquanto um terceiro foi conduzido em área de açúcar de 2º corte.
Os resultados apontaram que as plantas que receberam a nutrição foliar se tornaram mais resilientes às condições de estresse climático e obtiveram ganhos em produtividade de em média 6 t/ha nas áreas de cana planta e em 8 t/ha na área de cana de 2º corte, em comparação aquelas que não receberam a nutrição foliar. Os estudos observaram também um aumento na concentração de açúcar por tonelada de colmo, com ganhos de 2 t/ha em geral.
“Neste experimento verificamos também que o complexo nutricional aumentou os teores de açúcares na planta, alcançando maiores índices de teor de sacarose aparente na cana (POL) e Açúcar Total Recuperável (ATR). Foi possível certificar que a adoção do fertilizante foliar contendo extrato de algas traz incrementos de produção de colmos e açúcares, evidenciando o alto potencial da nutrição foliar para a cana-de-açúcar”, explica Sérgio Gustavo Quassi de Castro, pesquisador da AgroQuatro-S Experimentação e Consultoria Agronômica Aplicada.
Ainda de acordo com ele, os resultados na safra 2021/2022 corroboram os anteriores. Os ganhos foram de 7 a 8 toneladas por ha por litro aplicado e de 0,8 a 1 tonelada de pol por hectare.
“Na análise econômica, uma aplicação de 0,5 litro via foliar seja em pré ou pós seca, foi observado um ganho de 5 a 6 TCH e de 0,5 t por pol por hectare”, completou o pesquisador.
A concentração de açúcar por tonelada de colmo é uma característica muito buscada pelas usinas já que, para a indústria canavieira, quanto mais elevados os teores de sacarose, melhor. “Os resultados deste estudo podem auxiliar os produtores na recomendação sobre o uso dos fertilizantes foliares e contribuir não somente para aumento da produtividade e da qualidade da produção, mas também para aumentar a resistência da cultura aos efeitos ambientais adversos que tanto prejudicam o crescimento saudável das plantas e que são cada vez mais frequentes”, disse.
Um outro conjunto de experimentos conduzidos pela AgroQuatro-S em cana-de-açúcar de 3° corte, realizado na safra de 2018/19, também apontou dados sobre o aumento da produtividade. Na ocasião, o complexo foi utilizado via foliar, em aplicação única, no período de perfilhamento da cultura, entre os 150 e 180 dias após a rebrota.
O resultado apontou que a produtividade (TCH) da cana-de-açúcar aumentou em até 19 t/ha com a aplicação de 3,0 L/ha, o qual representou aproximadamente 20% de TCH a mais quando comparada às plantas que não receberam aplicação do produto.
Com o aumento da produtividade de cana, foi constatado também um aumento linear na produção de açúcar, concluindo assim que a aplicação de 3,0 L/ha desse complexo proporcionou ganhos em torno de 27% na produção de açúcar.
“O produto traz uma resiliência fisiológica na planta permitindo-a se manter mais estável na época do estresse hídrico. Nos nossos ensaios a aplicação pré frio quando a geada é muito severa, o complexo não mostra resultados expressivos de proteção, mas no retorno das condições favoráveis ao crescimento (primavera), ou seja, pós geada e pós estresse na primavera, ele demonstrou um arranque que permitiu, em parte, recuperar o desempenho da planta”, afirma Castro.
Ativos biológicos fazem toda a diferença
Moura destaca que a aplicação foliar é complementar ao processo de fertilização via solo, principal fonte de acesso dos nutrientes para a planta, e importante para correção de eventuais deficiências e/ou quando há baixa eficiência na aplicação via solo por condições de indisponibilidade.
Pensando nisso, a Yara desenvolveu o Yara Vita Biotrac que, além de fornecer Boro e Zinco, combina ativos biológicos provenientes do extrato de algas. “Estes ativos atuam nos processos fisiológicos da planta, aumentando a eficiência de uso dos nutrientes, estimulam o crescimento vegetativo e ainda podem amenizar os estresses causados a planta. A planta pode se beneficiar através do preparo para um momento de estresse, metabolizando compostos que ajudam a diminuir as espécies reativas de oxigênio”, detalha Moura que completa dizendo que a recomendação é aplicação no “pré-inverno” e no início do período chuvoso (primavera/verão) com uma dose recomendada de 1 L/ha.
De acordo com o pesquisador da Unesp, os ativos biológicos estimulam as plantas a produzirem substâncias indutoras de crescimento, como hormônios vegetais, aminoácidos e proteínas. “Por esses ativos biológicos serem extraídos de plantas e/ou algas adaptadas a condições extremas, em suas constituições há também compostos gerados pelo metabolismo de defesa desses organismos (alga e/ou plantas), assim atuam diretamente na mitigação de estresses abióticos das plantas cultivadas que os recebem”, salienta.
Para Vitti, os ativos biológicos são realidade e quando associados à micronutrientes promovem maior absorção e transporte de nutrientes, com efeitos benéficos no alongamento celular. “Numa linguagem prática são uma cesta de moléculas ativas com efeitos na modulação hormonal, osmoproteção, sinalização de defesas, redutores de estresse e antioxidantes”, conclui Vitti.
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