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Bioenergia

Geração Distribuída: discussões geram incertezas para energia renováveis

Publicado

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*Mariana de Meira Todeschini

Em 15 de outubro, a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) aprovou a realização de consulta pública de nº 026/2019, que trata sobre a proposta de taxação do sistema de compensação de energia elétrica decorrente da Geração Distribuída (GD). Tal consulta provocou inúmeras críticas da sociedade e reacendeu os debates sobre a geração de energia elétrica distribuída no país, que, desde a Resolução Normativa nº 482/2012 da ANEEL, revisada em 2015, apresenta incentivos ao crescimento do setor de energia renováveis.

Mas antes de comentar a cobrança proposta pela ANEEL, importante esclarecer a sistemática de compensação de energia elétrica atualmente vigente, que prevê a instalação de centrais sustentáveis de mini ou microgeração distribuída de energia elétrica (fonte solar, biomassa, eólica e cogeração qualificada, por exemplo) e o acesso à rede de distribuição das concessionárias através de unidades consumidoras.

Pela sistemática atual, a energia elétrica gerada por uma unidade consumidora com mini ou microgeração de energia, que exceda o próprio consumo, será cedida, mediante empréstimo gratuito, à Companhia Distribuidora local, para posterior compensação através do consumo de energia elétrica pela própria unidade ou por outras unidades previamente registradas, com possibilidade de geração de créditos energéticos com validade de 60 meses. Em outras palavras, a partir da instalação de placas solares em um edifício residencial, por exemplo, a energia solar gerada de dia que exceda o consumo simultâneo da unidade condominial será injetada na rede de distribuição para o posterior consumo à noite, tanto da própria unidade quanto das unidades particulares de cada morador (previamente registradas para este fim).

A ANEEL permite a utilização do sistema de compensação por meio de 3 modalidades:

(1) Autoconsumo Remoto, caracterizado pela geração e consumo de energia elétrica por unidades consumidoras de titularidade de uma mesma Pessoa Jurídica, incluídas matriz e filial, ou Pessoa Física;

(2) Empreendimento com Múltiplas Unidades Consumidoras, caracterizado pela utilização da energia elétrica de forma independente, no qual cada fração com uso individualizado constitua uma unidade consumidora e as instalações para atendimento das áreas de uso comum constituam uma unidade consumidora distinta, de responsabilidade do condomínio, da administração ou do proprietário do empreendimento, com micro ou minigeração distribuída, e desde que as unidades consumidoras estejam localizadas em uma mesma propriedade ou em propriedades contíguas;

(3) Geração Compartilhada, caracterizada pela reunião de consumidores, dentro da mesma área de concessão ou permissão, que possua unidade consumidora com microgeração ou minigeração distribuída em local diferente das unidades consumidoras nas quais a energia excedente será compensada.

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Para o aproveitamento do sistema de compensação pelas modalidades de Empreendimento com Múltiplas Unidades Consumidoras e Geração Compartilhada, a ANEEL estabelece que devem ser observadas, especificamente, a natureza jurídica de Condomínio e Consórcio ou Cooperativa, sendo que caberá à Companhia Distribuidora local analisar o ato constitutivo do Condomínio, do Consórcio e da Cooperativa apresentado pelo consumidor, no intuito de comprovar a adequação do documento à legislação específica, não podendo ser aceito outro arranjo jurídico na modalidade de geração distribuída.

Importante destacar que a ANEEL veda, taxativamente, o aluguel ou arrendamento do terreno, lote ou propriedade que se encontra a central geradora da energia elétrica em condições nas quais o valor do aluguel ou do arrendamento se dê em reais por unidade de energia elétrica. De tal regra, cumulada com a exigência de validação do ato pela Companhia Distribuidora, decorre a importância de que os instrumentos jurídicos utilizados para a implementação do sistema de compensação sejam realizados por profissionais com experiência no segmento, com objetivo de diminuir o risco de o investimento realizado ser infrutífero na etapa final de registro.

Apresentada a sistemática atual de compensação de energia elétrica, bem como as exigências jurídicas relacionadas, que por si só demandam a atenção redobrada dos consumidores, o setor de energias renováveis terá que se atentar para a possível revisão do sistema de compensação, visto que a ANEEL, por meio de consulta pública, pretende rever as regras que tratam da geração distribuída, cujo prazo para contribuição da sociedade finaliza em 30 de dezembro.

Pela proposta da ANEEL, o consumidor que detenha mini ou microgeração de energia passará a ser cobrado pelo uso da rede elétrica, que hoje se dá a título gratuito, e por demais encargos presentes na conta de luz.

A proposta de taxação gerou inúmeras manifestações e críticas da sociedade e do setor, inclusive da Comissão de Infraestrutura do Senado, que no dia 31 de outubro realizou audiência pública interativa para debater a possibilidade de geração, distribuição e taxação no setor solar fotovoltaico e demais fontes renováveis de energia; e da Comissão de Minas e Energia da Câmara dos Deputados, que no dia 30 de outubro discutiu o tema. Em ambas as comissões, os senadores e deputados consideraram que a proposta da ANEEL pode inviabilizar o crescimento da geração distribuída no país, pelo que defenderam a manutenção dos incentivos à produção de energia solar.

Diante das inúmeras discussões, o diretor da ANEEL e relator do tema, Rodrigo Limp, propôs recentemente a prorrogação do prazo da consulta por mais 30 dias. A prorrogação foi aprovada pelos demais diretores na Reunião Pública Ordinária da diretoria colegiada da ANEEL e divulgada no dia 19 de novembro. O prazo anterior da consulta se encerraria no dia 30/11.

A taxação pelo uso da rede elétrica no sistema de compensação reduzirá a vantagem econômica que o consumidor alcança na instalação da mini ou microgeração distribuída, ao passo que a cobrança refletirá no aumento proporcional do período de recuperação do investimento assumido para a instalação de um sistema solar fotovoltaico, por exemplo. Ou seja, pela perspectiva do consumidor final, a economia na conta de luz poderá não ser mais tão atrativa em comparação ao custo assumido para a instalação de geradores de energias renováveis.

Diante das críticas levantadas pelo governo e pela sociedade, resta a apreensão dos consumidores quanto à possível taxação, bem como quanto aos impactos negativos que a revisão do sistema pode causar no setor de energia renováveis no país, que, apesar do evidente crescimento, ainda se encontra em fase inicial.

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*Mariana de Meira Todeschini é Advogada da Área Corporativa do escritório do Marins Bertoldi.

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