Bioenergia
Homenagem – Pé no campo, pé na estrada
O dia 11 de junho de 2019 amanheceu mais triste para o setor sucroenergético, que perdeu uma de suas vozes mais importantes: Manoel Carlos de Azevedo Ortolan faleceu aos 76 anos, deixando sua esposa, os quatro filhos, nove netos e uma legião de pessoas que tiveram nele a figura do porta-voz dos interesses dos produtores de cana.
Maneco, como era chamado por quem convivia com ele, formou-se em Engenharia Agronômica em 1969, pela Esalq-USP (Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”) e atualmente atuava como presidente-executivo da Copercana (Cooperativa dos Plantadores de Cana do Oeste do Estado de São Paulo) e presidente da Canaoeste (Associação dos Plantadores de Cana do Oeste do Estado de São Paulo).
Ortolan: “Precisamos estar mais presentes junto à classe política, ajudando a construir aquilo que entendemos que é certo” |
Tudo começou em 1970, quando ele foi trabalhar na Copersucar. Em 1975, iniciava como coordenador técnico da Copercana, onde atuou até o início de 1999, quando assumiu a presidência da Canaoeste. Em março de 2001 foi eleito presidente da Orplana, a principal entidade representativa dos fornecedores de cana do País, onde atuou até março de 2007. Em abril de 2013, foi escolhido novamente como presidente até 2016.
Apesar do importante papel frente as entidades do setor, Maneco disse uma vez, em entrevista concedida à RPAnews, que não gostava de ser chamado de executivo dos fornecedores de cana. Ele se considerava um homem da terra.
Em outra entrevista concedida em 2015, Maneco, um verdadeiro entusiasta da cana, já via como algo natural o fato de ser uma ‘voz do setor’ depois de tantos anos. “É sempre um trabalho em grupo e que precisa ter alguém à frente. Algumas vezes entenderam, no momento, que a pessoa indicada seria eu”, disse em entrevista à RPAnews para o quadro Executivo do Mês.
CONCILIADOR
Com seu jeito sério, equilibrado e de fala mansa, Maneco era considerado uma das principais personalidades do meio, tanto por produtores quanto por autoridades. Ele contou que nunca havia almejado conquistar posições no setor. “Fui praticamente sendo conduzido. Comecei quando assumi a presidência da Canaoeste, algo que foi natural, não houve briga, não houve disputa. Não esperava. Já no ano seguinte, fui convidado para assumir a Orplana e, mesmo entendendo que eu não tinha experiência para isso, o grupo que veio me convidar e me deu muito apoio. Depois, retornei como presidente e as coisas foram acontecendo.”
Maneco se dizia feliz pelos bons amigos e companheiros de trabalho que colecionou com o tempo e acreditava no bom entendimento entre usinas e fornecedores. “Uma coisa que aprendi é que não adianta brigar. Temos o lado industrial e o dos produtores de cana que não podem, jamais, ser inimigos. É difícil, mas a busca do entendimento tem que ser no dia a dia. Isso tem que ser o objetivo. Não vamos conseguir solucionar o nosso problema prejudicando o outro lado, tampouco o outro lado prejudicando o nosso”, acreditava.
Por isso, ele dizia que o diálogo fazia a diferença e que o setor precisava de pessoas preparadas para sentar à mesa e dialogar. “A briga não leva a lugar nenhum, não é boa para ninguém. A nossa solução está nas soluções dos problemas deles [referindo-se as usinas]. Se eles tiverem açúcar, etanol e energia elétrica com bom preço, estaremos ganhando mais. É preciso ter esse senso de construção, de entendimento e, acima de tudo, de somar forças. Que as entidades possam compreender bem isso e estarem sempre unidas, fortalecendo o sistema como um todo.”
SEGUNDA CASA
“Diria que minhas duas grandes metas são: ter a família bem cuidada e ter o setor dos fornecedores bem cuidado também.” Ortolan nunca escondeu que sua segunda casa era a Canaoeste. No total, foram mais de 45 anos na entidade.
“Minha segunda família é a Canaoeste, onde entrei em 1972. Depois, me afastei um pouco e voltei em 1975. Fiquei aqui como agrônomo, como técnico, até que, em 2000, assumi a presidência e comecei a participar, junto com os outros diretores, da Copercana e também da cooperativa de crédito (Sicoob Cocred)”, afirmou ele em entrevista à RPAnews.
Maneco ainda disse que se tivesse que definir um ideal, um objetivo maior desta trajetória de anos, seria o de trabalhar pelos fornecedores. “O propósito é faze-los prosperar, ter uma qualidade de vida melhor e um ganho cada vez mais justo através do Consecana. Esse tem sido meu empenho, tanto enquanto presidente da Canaoeste como também enquanto presidente da Orplana. Harmonizar as nossas entidades, fazer disso um grande sistema.”
Sob o ponto de vista do produtor, Maneco acreditava que a orientação técnica, do agrônomo, era fundamental para o proprietário da terra, mas disse que também era importante estar próximo aos centros onde as decisões acontecem. “Temos que trabalhar um pouco na esfera municipal, um pouco mais na esfera estadual e muito na esfera federal.”
E assim ele defendia o peso de entidades como a Orplana e a Canaoeste. “Precisamos estar mais presentes junto à classe política, ajudando a construir aquilo que entendemos que é certo. De nada adianta conseguir ganhos de produtividade, de eficiência, se numa canetada em Brasília são tiradas essas vantagens que se têm conseguido de outra forma”, afirmou.
UM EXEMPLO DE VIDA
Maneco falava com orgulho sobre o privilégio que tinha de participar de várias entidades. Ele participou da Maçonaria, do Lions Club, conselhos, Sindicato Rural, Sescoop São Paulo, Sicoob São Paulo, Copercana, Canaoeste, Sicoob Cocred e Orplana. “Tenho bastante coisa, digamos, para me distrair (risos) e tocar um pouco mais. E, quem sabe, esta é minha missão daqui para frente, preparar pessoas para dar sequência nessas atividades todas que participo hoje”.
Ele tinha como filosofia de vida duas coisas: trabalhar e deixar um bom exemplo de vida para os filhos. “Não só para eles, mas dentro da empresa também. Que a nossa vida possa servir de exemplo de busca pela paz, harmonia e entendimento entre as pessoas.”
Maneco faleceu por conta de uma leucemia, descoberta em março deste ano. Esta é uma singela homenagem a essa grande voz do setor, que estará sempre nos corações de todos os que tiveram a oportunidade de aprender com ele.
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