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Lei dos Agrotóxicos: veja vetos de Lula e os efeitos das mudanças no texto

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Os vetos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à nova Lei dos Agrotóxicos, também chamada de Lei dos Defensivos Agrícolas, retiram o papel central que o Ministério da Agricultura teria nos processos de reanálise de riscos dos produtos e de alteração de registros.

A mudança altera o texto aprovado pelo Congresso Nacional no fim de 2023, após 24 anos de tramitação. A intenção, segundo a Presidência da República, foi preservar o sistema tripartite atual, com a atuação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) nesses procedimentos.

Para o setor produtivo, os vetos mantêm entraves já existentes e que se esperava superar com o novo marco regulatório, principalmente nos pontos referentes à reavaliação das moléculas em uso no país e nas alterações das formulações já registradas.

“Os vetos afastaram as propostas de coordenação dos procedimentos de reanálise e de alterações pós-registro pelos órgãos registrantes, bem como a obtenção de recursos financeiros, por meio da cobrança de taxas, para o exercício dessas atividades”, diz uma análise do Conselho Científico Agro Sustentável (CCAS).

O que muda na Lei dos Agrotóxicos com os vetos?

Neste novo cenário, o Ministério da Agricultura será o coordenador dos processos para obtenção de novos registros de agrotóxicos, conforme aprovado pelo Congresso, mas ficará impedido de registrar produtos à base de ingredientes ativos que ainda estejam em processo de reavaliação de riscos.

Nenhum dos 17 itens vetados foi solicitado pelo Ministério da Agricultura. A retirada dos trechos da lei foi indicada, principalmente, pelos ministérios do Meio Ambiente, da Saúde, do Trabalho e Emprego e da Fazenda. O Ibama conseguiu retomar alguns “pontos de honra” e manteve suas atribuições ao longo do processo, como na avaliação técnica dos processos produtivos para pedidos de alteração pós-registro.

A bancada ruralista já se movimenta para tentar derrubar os vetos. A aprovação do texto foi viabilizada por um acordo com a base governista e não previa a supressão desses itens, segundo o deputado Pedro Lupion (PP-PR), presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA).

Como o Congresso Nacional está em recesso, a avaliação de derrubada ou manutenção dos vetos só poderá ocorrer a partir de 2 de fevereiro em uma sessão conjunta de deputados e senadores. Depois do dia 3 de março, esse veto passa a “trancar” a pauta.

O que foi vetado por Lula no PL dos Agrotóxicos?

Reanálise dos riscos

Veto

O trecho vetado dava aos órgãos registrantes a competência para “coordenar” a reanálise dos riscos dos agrotóxicos. O Ministério da Agricultura ficaria responsável por gerir os processos de reavaliação de moléculas que já são autorizadas, com registro concedido, a fim de entender se houve alguma alteração do risco, ou seja, da probabilidade de ocorrer um efeito nocivo à saúde ou ao meio ambiente.

Justificativa

O governo disse que a medida não observa os princípios da precaução e da vedação ao retrocesso socioambiental, pois atribuiria exclusivamente ao Ministério da Agricultura a função de coordenar as reanálises dos riscos de agrotóxicos mesmo que a instauração desses processos fosse motivada por riscos toxicológicos e ecotoxicológicos.

“O veto visa impedir que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) percam o protagonismo técnico nesse tipo de reanálise quando estiverem sendo avaliados riscos à saúde humana e ao meio ambiente”.

Efeito: Para os defensores da proposta, o veto pode tornar o processo mais demorado, com descompasso de prazos entre os três órgãos, e sujeito a interpretações distintas que podem retirar do mercado produtos considerados essenciais para o campo, sem a apresentação de estudos e medidas de gestão de riscos

O setor também diz que a ação de “coordenar” as reavaliações não daria “exclusividade” de competência ao Ministério da Agricultura e que o processo seria feito com consultas às áreas de meio ambiente e saúde, pois a reanálise é baseada na avaliação do risco, que depende dessas informações técnicas.

Consultas para reanálise

Veto

Foi vetado o artigo que permitia ao órgão coordenador do processo de reanálise dos agrotóxicos solicitar informações às áreas da saúde e do meio ambiente para complementar sua análise.

Para o governo, o texto tornaria “facultativa, a participação, nos processos de reanálise dos riscos de agrotóxicos e de produtos de controle ambiental, dos demais órgãos envolvidos na regulação destes produtos”.

Na justificativa, a presidência afirmou que o eventual alijamento de Anvisa ou Ibama dos processos de reavaliação de agrotóxicos “fragilizaria a efetiva tutela constitucional dos direitos envolvidos, ocasionando assim retrocesso ambiental”.

Efeitos

Os processos de reavaliação de moléculas já em uso no país permanecem como estão, com a participação dos três órgãos e sem uma coordenação central, com reclamações no setor produtivo quanto à definição de um trâmite e a possibilidade de apresentação do contraditório.

Alteração de registros

Veto

Foram vetados três itens que deveriam ser avaliados tecnicamente pelo Ministério da Agricultura nos processos de alteração de registros de agrotóxicos: o processo produtivo, as especificações do produto técnico e formulado e as alterações de matérias-primas, de outros ingredientes ou de aditivos.

Justificativa

Para o governo, a medida colocaria em risco os direitos à vida, à saúde e ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem como a dignidade humana, pois extinguiria o modelo tripartite de registro e controle de agrotóxicos adotado no País desde 1989 e baseado na interação entre as áreas da agricultura, do meio ambiente e da saúde.

De acordo com as razões apresentadas para o veto, a lei permitiria que, após o registro do agrotóxico, a empresa fabricante alterasse significativamente o conteúdo do produto registrado sem o aval da Anvisa e do Ibama.

“O veto visa evitar que as avaliações sobre aspectos ambientais e de saúde passem a ser conduzidas, exclusivamente, pelo Ministério da Agricultura e Pecuária (que não detém competência legal, nem especialização técnica para atuar nesses temas). Com isso, o veto afasta, com base nos princípios da precaução e da vedação ao retrocesso socioambiental, o risco de que os seus procedimentos sejam convertidos em ‘mera formalidade’”.

Efeitos

Segundo o CCAS, ao vetar os referidos dispositivos, a lei deixou de prever como serão feitas as análises dessas alterações. “O veto cria um vácuo legal, pois toda a sistemática adotada pela nova lei centralizava nos órgãos registrantes a avaliação dos pedidos de alteração pós-registro. O que não significa, contudo, que, em casos de alteração de risco, não seja necessário apresentar uma nova avaliação de risco para a Anvisa e o Ibama para análise e homologação, se cabível”.

Registros para produtos em reanálise

Veto

Foram vetados dois trechos que permitiam a concessão de registros para novos produtos, agrotóxicos ou de controle ambiental, feitos à base de moléculas que estivessem em reavaliação.

Justificativa

Para o governo, esses dispositivos ofendem o princípio da precaução. “O veto visa evitar a exposição humana e ambiental aos agrotóxicos e aos produtos de controle ambiental cujos riscos ainda estejam em processo de reanálise”.

Efeitos

O CCAS diz que há incoerência no veto proposto, pois a lei mantém a previsão para avaliação dos pleitos de registro e pós-registro, bem como a comercialização, a produção, a importação e o uso dos produtos em reanálise.

“Não é coerente manter a permissão para que haja a avaliação, mas impedir a emissão do certificado de registro, que é fruto da avaliação. Essa contradição não é uma medida eficiente para administração pública”.

Defensores argumentam que os produtos em reanálise já foram avaliados e são comercializados e usados há anos no Brasil.

“Impedir que sejam emitidos novos registros à base dos mesmos ativos que permanecem sendo usados não traz nenhuma segurança adicional à saúde e ao meio ambiente, além de ser uma medida não isonômica”, reforça o CCAS.

Embalagens

Veto

Foi vetado um trecho da lei que dispensava as empresas produtoras de agrotóxicos a gravarem nas embalagens dos produtos de modo indelével, ou seja, que não podem ser removidas, o nome da companhia e a advertência quanto ao não reaproveitamento desses recipientes.

Justificativa

Para o governo, a dispensa aumentaria a probabilidade de reutilização desses materiais, criaria risco à saúde humana e ao meio ambiente e poderia gerar desinformação.

“O veto visa mitigar, em observância ao princípio da precaução, o risco de reutilização desavisada ou irrefletida desse tipo de embalagem por parte de consumidores ou de terceiros abrangidos por situações de descarte incorreto, além de evitar que a falta de identificação da empresa titular do registro contribua para isentá-la da responsabilidade pela logística reversa, isto é, do ônus de garantir, após o consumo do produto, o retorno da embalagem e a sua destinação final correta e segura”.

Efeitos

Só em 2023, 53 mil toneladas desses recipientes tiveram destinação ambientalmente correta, com reciclagem (93%) ou incineração (7%). A alteração na lei, com a dispensa da exigência do aviso, não implicaria na precarização desse sistema de logística reversa eficiente na visão dos defensores do projeto.

Taxas de Avaliação e Registro

Vetos

Foram vetados seis trechos da lei que tratavam sobre a unificação das taxas de avaliação e de registro de agrotóxicos. A lei vigente até então, de 1989, não previa a cobrança de qualquer taxa para o Ministério da Agricultura, porém Ibama e Anvisa mantinham arrecadações. A nova legislação buscava unificar essas taxas, que seriam recolhidas ao Fundo Federal Agropecuário.

O texto aprovado pelo Congresso previa que os valores seriam definidos por regulamento do Poder Executivo e que seriam destinados exclusivamente à fiscalização e ao fomento do desenvolvimento de atividades fitossanitárias e à promoção da inovação tecnológica do setor agrícola em sanidade vegetal. O governo ainda vetou a revogação das atuais taxas cobradas por Ibama e Anvisa.

Justificativa

O governo alegou que a criação e unificação da taxa é inconstitucional, pois não prevê a fixação de base de cálculo e alíquota, ou seja, não tem os parâmetros necessários para a definição do valor da taxa em proporção razoável com os custos da atuação estatal.

Efeitos

Os vetos eram aguardados por conta da vinculação da arrecadação ao abastecimento do Fundo Federal Agropecuário, medida que não agrada a equipe econômica. Por outro lado, impede avanços na aplicação de recursos na área de defesa agropecuária do país.

O CCAS explicou que o projeto aprovado na Câmara dos Deputados trazia o valor das taxas que seriam cobradas para cada caso, o que foi excluído na votação da Comissão do Meio Ambiente pelo Senado Federal. As taxas variavam de R$ 5 a R$ 100 mil.

“A cobrança de uma taxa única e destinada ao Fundo Federal Agropecuário, representava uma importante inovação, na medida em que estabelecia que os valores arrecadados serviriam para fiscalizar e fomentar o desenvolvimento de atividades fitossanitárias e promover a inovação tecnológica do setor agrícola em sanidade vegetal”, disse o CCAS.

O conselho reforçou que os órgãos competentes carecem de infraestrutura para realizar as atividades de fiscalização e análise de pedidos de registro e alterações pós-registros de pesticidas.

“A utilização dos recursos do fundo, prioritariamente, em projetos relacionados à área, certamente seria de grande valia a todo o setor agrícola brasileiro e aos consumidores de produtos agrícolas, além de melhorar a percepção positiva dos sistemas de produção em uso no Brasil, por parte dos importadores dos nossos produtos”, completou.

Por Globo Rural/Rafael Walendorff 

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