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Edição 186

Por que o ATR vem caindo?

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Colheita mecanizada, geadas e manejo inadequado de variedades são alguns dos fatores que vêm contribuindo para a queda dos açúcares totais recuperáveis ao longo das últimas safras

Natália Cherubin

Com a prospecção de um mercado mundial de açúcar cada vez mais aquecido nos próximos anos, diante do déficit na produção de alguns países e da crescente demanda mundial pela commodity, que cresce a um ritmo de 2% ao ano, os produtores de cana brasileiros, responsáveis pela a metade da produção mundial de açúcar, poderão surfar em um novo mar de oportunidades. Mas para poder aproveitar este cenário, o setor precisa não só conseguir retomar os patamares de produtividade, como também do ATR (Açúcar Total Recuperável) que vem caindo 1,64 kg por safra desde o ciclo 2010/11. Mas quais seriam as causas disso? E como o setor poderá resolver esta questão?

Para entender as causas da queda ao longo das últimas safras primeiramente é importante entender o que é ATR e quais fatores influenciam diretamente na sua valorização.

O ATR é uma medida de pagamento de cana calculado em função de alguns parâmetros relacionados à qualidade da matéria-prima como a pol (porcentagem de oligossacarídeos que corresponde à sacarose), o brix (teor de sólidos solúveis que engloba a sacarose, outros açúcares e sais solúveis) e o teor de fibra (que corresponde à celulose, hemicelulose, lignina e todos os materiais não solúveis em água), além de parâmetros relacionados à eficiência industrial (capacidade de extração e conversão). Assim, esses fatores da qualidade impactam o valor do ATR, pol e brix positivamente e a fibra negativamente.

Expresso em quilograma por tonelada, o ATR é determinado pela relação pol/0,95 mais o teor de açúcares redutores. Segundo Professor e engenheiro agrônomo da FCAT/Unesp (Faculdade de Ciências Agrárias e Tecnológicas da Universidade Estadual Paulista), Paulo Alexandre Monteiro de Figueiredo, nos cálculos do ATR são consideradas as perdas industriais médias dos açúcares contidos na matéria-prima em função dos processos industriais e tecnológicos. “Da mesma forma são considerados os teores de açúcares redutores, que determinam a quantidade conjunta de frutose e glicose contida no caldo da cana-de-açúcar.”

O ATR representa a qualidade da cana, a sua capacidade de ser convertida em açúcar ou etanol através dos coeficientes de transformação de cada unidade produtiva. E para efetuar o pagamento aos fornecedores, por exemplo, uma usina faz a amostragem antes da recepção na indústria para avaliar a qualidade e, a partir dessa informação, determinar o pagamento

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                                               Evolução do ATR médio da safra 2010/11 a 2015/16

O cálculo do ATR é atrelado ao preço dos produtos finais da produção de cana, que são o açúcar e o etanol. Então, quando esses preços oscilam, o preço do ATR também varia. “O cálculo do teor de fibra é feito indiretamente, com correlações a partir do peso do bolo úmido da amostra. Neste peso podem estar impurezas vegetais, inclusive partes do ponteiro da cana. A fibra no cálculo é um fator de redução do ATR, visto que quanto maior seu teor, menor é a capacidade de extração do açúcar nas moendas. Assim, problemas na colheita mecânica envolvendo um desponte mal feito, limpeza deficiente e presença de mato, podem elevar o teor de fibra e reduzir o valor do ATR”, afirma o professor Edgar Gomes Ferreira de Beauclair, professor e coordenador do Geca (Grupo de Estudos em Cana-de-açúcar) da Esalq-USP (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo).

Muitos são os fatores que impactam na qualidade tecnológica da cana-de-açúcar e, em consequência, no ATR, mas a maturação e a sequência de cortes, ou seja, os estágios e a evolução varietal ao longo dos anos e o corte das variedades em função das épocas adequadas; a impureza vegetal (terra, folhas, palha etc); deteriorações fisiológicas e microbiológicas; armazenamento (pós-colheita); tratos culturais (adubação, irrigação etc); pragas e doenças (broca, migdolussphenophorus, podridão de topo, carvão, escaldadura, raquitismo de soqueira, vírus do mosaico, ferrugem etc); clima atípico (geadas e chuvas no período de safra, principalmente no inverno) e a sequência na indústria (todas as fases do processo industrial há perdas), são importantes fatores de variação do ATR.

No entanto, segundo o professor Titular e ex-chefe do Departamento de Solos e Nutrição de plantas da Esalq/USP, José Luiz Ioriatti Dematte, apesar de todos estes fatores, dois processos são essenciais para o valor do ATR: o aumento das impurezas minerais e vegetais, propiciados pelo corte mecanizado, e as variedades.

“Como é possível observar na tabela 1, que resume os valores da produtividade agrícola do ATR e do ATR/ha, a partir da safra 2010/11 os valores estão em queda, principalmente o ATR/ha, na faixa de 9,0 a 10, valores estes inadequados para a lavoura de uma usina que é considerada modelo para o mundo canavieiro. De qualquer maneira, sabe-se que o aumento de impurezas vegetais e minerais, assim como as perdas de matéria-prima são os principais fatores desta redução, aliado a crise financeira que se arrastou nos últimos anos”, destaca Dematte.

Para Antonio de Pádua Rodrigues, diretor técnico da Unica (União da Indústria da Cana-de-açúcar), além das impurezas vegetais e minerais advindas da colheita mecanizada, o alongamento das safras, o clima adverso (principalmente as geadas), e o manejo incorreto de variedades são os principais fatores que vem despencando tanto o ATR cana, quanto o ATR produto.

“O primeiro problema sem dúvida foi a colheita mecanizada. Quando tínhamos a colheita de cana queimada os índices de impurezas vegetais ficavam na ordem de 3,5%. Agora, quase todas as usinas levam uma grande quantidade de palha junto com a cana, material que aumenta o peso e ainda reduz a eficiência da extração. Outro problema tem sido as safras mais longas. O contingente de cana que se processa no primeiro e no último terço da safra é muito maior do que no passado, onde havia uma concentração da moagem entre os meses de julho, agosto e setembro. Então, safras mais longas, com maior moagem de cana no primeiro e último terço também derrubaram o ATR. Outro motivo foram as geadas. Tivemos três em 2016 e isso fez com que a colheita da cana fosse realizada quando ainda não estava no ponto de corte. Se colheu cana com seis, nove e dez meses. Tudo isso evidentemente também impactou no ATR“, detalha.

Outro importante fator tem a ver com o manejo dos canaviais dos fornecedores que, segundo Pádua, não tem considerado as épocas de colheita. “Existem muitos canaviais de fornecedores onde não houve manejo entre canas médias, precoces e tardias. Muitos produtores ainda plantam as mesmas variedades sem considerar o período de colheita, que mudou. Isto porque, com a implementação do ATR Relativo os fornecedores não entregam mais a cana só entre os meses de maio e junho, quando se tem um melhor peso e alta produtividade, então, ninguém preparou seu canavial para essa mudança. Criou-se a mecanização, o sistema ATR Relativo, mas não houve mudança no perfil do canavial entre canas precoces, médias e tardias, o que também jogou o ATR para baixo! ”

Em discussão sobre o tema no grupo Cana&Indústria do Linkedin, Arlindo Tamelline, gerente Agrícola do GVO (Grupo Virgolino de Oliveira), também diz que acredita que a queda do ATR se deve ao manejo incorreto de colheita, ou seja, em um ano inicia-se a safra em maio, no outro em abril, não havendo ciclo biológico e censo varietal adequado. “Falta maior capacitação no uso de maturadores e estressantes, evolução da colheita mecânica com índices de impurezas (a fórmula do cálculo da ATR pune) e, desde 2008, faltam investimentos em fertilizantes.”

Bruno Rangel Geraldo Martins, presidente da Socicana (Associação dos Fornecedores de Cana de Guariba), observa a questão da alocação de variedades, qualidade da colheita (desponta, equipamentos bem dimensionados e velocidade de colheita correta), clima (geadas) e planejamento de colheita de variedades de acordo com a época, como fatores preponderantes na queda do ATR dos produtores de cana.

“Muitas vezes o produtor tem um canavial precoce que é colhido tardiamente ou tem um canavial tardio que é colhido precocemente. E quem faz a escolha não é mais o produtor e sim a usina, que faz de acordo com a sua disponibilidade. Quando não existia o ATR Relativo todo mundo tinha o interesse de colher a cana entre a segunda quinzena de julho e primeira quinzena de setembro, época do ano em que se acumula mais açúcar nos canaviais. Após criação do ATR Relativo, que eu particularmente não estou satisfeito, a gente acaba entrando em uma média de ATR ruim por conta de alguns produtores que não fazem o manejo tão adequado para o acúmulo de ATR, prejudicando os que investem mais”, lamenta Martins.

Ricardo Pinto, sócio e diretor da RPA Consultoria, acredita que além da época de colheita e do clima pré-colheita, as variedades de cana, o uso ou não de maturadores e o modo como é feita a amostragem para o cálculo do ATR também podem ser relevantes para esta queda.

“A colheita mecanizada na safra 2009/10 foi de 62,1%, crescendo para 77,1% em 2010/11, indo a 83,0% em 2011/12, depois 84,5% em 2012/13, 91,1% em 2013/14, 94,7% em 2014/15 e chegando a 96,1% em 2015/16. Já a impureza vegetal da cana colhida mecanicamente evoluiu da seguinte forma: 6,1% em 2009/10; 5,2% em 2010/11; 7,1% em 2011/12; 8,0% em 2012/13; 7,1% em 2013/14; 7,9% em 2014/15; e 7,6% em 2015/16. Finalmente, a impureza mineral da cana colhida mecanizada seguiu da seguinte maneira: 1,3% em 2009/10; 1,0% em 2010/11; 1,2% em 2011/12 e 2012/13 também; 1,4% em 2013/14; 1,2% em 2014/15 e 1,3% em 2015/16. Concluindo, os números não apontam significativa correlação entre ATR com índice de colheita mecanizada e nem com impurezas minerais e/ou vegetais. Então a minha grande dúvida é: por que as novas variedades não conseguem pelo menos equilibrar estes fatores adversos?”

A QUESTÃO VARIETAL

A Orplana (Organização de Plantadores de Cana da Região Centro-Sul do Brasil) fez uma análise da quantidade de cana produzida de 1984 até a safra 2014/15, totalizando praticamente 1,59 bilhão de t de cana. De acordo com Dematte, de 1984 a 2015 não se observa evolução no aumento da Pol% cana no período de safra, entre abril e novembro (Gráfico 1). “A questão que fica a ser respondida é por quê? Contudo, em seu trabalho, Andrade Silva mostra que a evolução quantitativa de açúcar na matéria-prima não é decorrente da introdução de novas variedades.

Parte das possíveis explicações, segundo Dematte, está no manejo varietal. A Tabela 2 mostra as variedades da safra 2015 em São Paulo e Mato Grosso do Sul, tanto em corte quanto plantio.

“É possível notar que, em termos de safra, dentre as dez primeiras variedades 60% são da década de 80, entre elas as RBs 86 7515; 85 5453; 85 5156; 85 5536; e as SPs 81 3250; 83 2847. Entre as 20 mais plantadas 60% pertence a série da década de 80, entre elas a RB 83 5054; e as SPs 80 1842; 80 1816; 80 3280; e 81 1049. No caso de plantio, entre as dez primeiras, 50% ainda pertence a série 1980 assim como entre as 20 mais plantadas. Note a evolução rápida em termos de crescimento da RB 96 6928, variedade precoce e da RB 92 579 média a tardia, porém pobre, e a CTC 4, que está com ferrugem marrom e não pode ser plantada em regiões mais frias. É possível ainda observar a posição da SP 83 2847 em oitavo lugar, tanto na safra como no plantio, variedade para solos de baixa fertilidade e que ainda tem sido muito plantada e cultivada, o que nos indica novamente a falta de variedades para ambientes restritivos”, aponta o pesquisador.

Observa-se também que a CTC 15, uma das melhores variedades do CTC, durante a safra estava superior a CTC 4, mas no plantio perdeu o lugar sendo suplantada pela CTC 4, porque teve problemas com a ferrugem alaranjada. A questão que fica pendente, segundo Dematte é a seguinte: apesar de todos os esforços dos órgãos de pesquisa, por que a área de melhoramento não tem evoluído no aumento da riqueza dos materiais e ao mesmo tempo as doenças estão dizimando as novas variedades?

“Ainda deixo mais alguns questionamentos a serem explicados pelo setor como um todo: 1) Como explicar a não evolução da Pol% cana ao logo de 30 anos de abril a novembro? 2) Por que as doenças estão dizimando as novas variedades? 3) Como explicar fisiologicamente o baixo ATR em período seco? 4) Qual seria a influência na frente de corte (bloco de colheita) com muitas variedades? 5) Qual a razão pela qual a RB 86 7515 consegue se adaptar em ambiente restritivo em todo o Brasil canavieiro? Idem para a RB 85 5156 e a SP 81 3250? 6) Qual seria a opção de variedade para ambiente restritivo se ocorrer algo com a RB 86 7515? Seria a RB 92 579, a SP 83 2847 ou outras?”

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GRÁFICO 1 – Pol de cana por período de moagem (1984 a 2015)

A AMOSTRAGEM É CONFIÁVEL?

Quando a cana chega à indústria as usinas fazem a coleta via sonda oblíqua, método que substituiu a sonda horizontal em 2010. Apesar da tecnologia já ser empregada em larga escala pelas unidades e ser comprovadamente mais eficiente na coleta de amostras, existem discussões acerca de algumas diferenças encontradas nas amostragens de campo.

De acordo com Dematte, a questão da sonda tem sido muito discutida entre usinas e fornecedores, isto porque mesmo sendo superior a amostragem via sonda horizontal devido a uma série de fatores, tem mostrado diferenças entre 1,0% e 2,5% na Pol% cana entre as canas amostradas no campo e amostradas para a safra, indicando que o sistema ainda necessita de alguns ajustes, o que já tem sido feito pelas empresas fabricantes da tecnologia.

Ricardo afirma que a sonda oblíqua não leva a amostragem da qual será calculado o teor de ATR a erros, já que ela será mais uniforme e representativa em comparação à amostragem com sondas horizontais. Porém, ele acredita que os valores de ATR obtidos de sondas oblíquas, por não chegarem às canas de fundo de carga bem como às impurezas minerais do fundo da carga, poderiam ser um pouco maiores.

“Os erros de amostragem sempre devem ser considerados, mas há tantos estudos a respeito deste assunto que já se tem como certo de que nenhuma outra forma de avaliar a qualidade da carga que está sendo entregue é mais precisa que a metodologia atualmente em uso. A presença de erros é possível, mas sua frequência é pequena e a ordem de grandeza é mínima. O problema não está na amostragem”, opina Beauclair.

Antonio Carlos Viesser, diretor Adjunto Industrial Corporativo do Grupo Tonon, diz que realmente existe um “mito” de que os resultados das amostras colhidas pela sonda e as amostras vindas do campo apresentam resultados diferentes. E isso ocorre devido ao fato das amostras do campo chegarem aos laboratórios totalmente limpas, ou seja, sem folhas e palhas, o que não ocorre com a cana que é enviada à usina quando em operação normal de colheita, “no entanto, antes de atribuir à sonda qualquer alteração de valores nos últimos anos é preciso avaliar bem todas as outras mudanças no sistema de colheita de cana que tivemos. Creio que a falta de tratos culturais devido aos fatores econômicos tenha sido um dos maiores causadores da queda do ATR, assim como o aumento da mecanização da colheita, que prejudica o brotamento da cana, e também o fato de se pagar os fornecedores por ATR Relativo, o que está desestimulando estes produtores a cultivarem melhor os seus canaviais.”

Viesser adiciona que apesar do sistema de amostragem ser totalmente satisfatório, o setor deveria observar melhor outras práticas já existentes. “Vejo que o PCTS (Pagamento de Cana pelo Teor de Sacarose) hoje em dia está sendo deixado de lado e muitos estão pensando somente em quantidade (toneladas). A verificação da qualidade da cana pelo sistema de pagamento de cana (medição de ATR) é muito bom e válido, porém frente a nova condição de colheita da cana, a indústria está sendo penalizada, portanto, vejo que já não é o bastante. Precisamos incluir neste modelo novos itens de qualidade da cana que até então não eram mensurados como, por exemplo, fenóis, amidos impurezas, nível de infestação de pragas etc”, frisa.

6 MEDIDAS A FAVOR DO ATR

1 Usar mais os maturadores disponíveis

2 Colher os canaviais respeitando melhor as épocas corretas de cada variedade

3 Plantar cana segundo as lacunas de variedades por época de colheita

4 Evoluir na gestão de impurezas minerais e vegetais da colheita

5 Não abrir mão da pré-análise das canas antes de definir a programação de curto prazo da colheita

6 Se possível, não esticar demais a duração das safras

EM BUSCA DO AÇÚCAR PERDIDO

Depois de discutir as causas é preciso correr em busca da solução. E muitas são as ações que, se tomadas, podem impactar na volta do crescimento do teor de ATR safra após safra. O diretor da RPA Consultoria aponta algumas:

1) Usar mais os maturadores disponíveis;

2) Colher os canaviais respeitando melhor as épocas corretas de cada variedade;

3) Plantar cana segundo as lacunas de variedades por época de colheita;

4) Evoluir na gestão de impurezas minerais e vegetais da colheita;

5) Não abrir mão da pré-análise das canas antes de definir a programação de curto prazo da colheita;

6) Se possível, não esticar demais a duração das safras;

“Acredito que muitos manejos, adubos especiais, maturadores e até irrigação podem incrementar o teor de ATR, além das próprias variedades de cana, desde que colhidas em sua época certa”, complementa Ricardo.

Para Maximiliano Salles Scarpari, pesquisador do Instituto Agronômico (IAC), da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, trabalhar com viveiros primários, tratamento térmico, alocação de variedades para tipos, solos e ambientes certos, e regular melhor o sistema de plantio e colheita mecanizada são alguns passos que o setor sabe que tem que ser feito, mas acabou deixando de lado. “Não tem segredo. Todo mundo sabe o que tem que ser feito.”

Figueiredo salienta que preparação do canavial para o período de maturação é fundamental. Sendo assim, a planta de cana-de-açúcar, grande armazenadora de sacarose, deve contar com um adequado aporte fotossintético meses antes do processo de maturação. Nesse ponto, a utilização de adubos no momento correto é muito importante. Além disso, a utilização de maturadores é imprescindível para o manejo do canavial, de modo a extrair do mesmo o seu potencial produtivo. O fornecimento de água para as lavouras durante os períodos de crescimento e desenvolvimento também seriam altamente desejáveis, segundo o pesquisador da Unesp.

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Tabela 1 – Produtividade Agrícola, ATR e ATR/ha (2015)

“É importante o setor estar atento à prática da colheita mecanizada, assim como na velocidade de deslocamento das colhedoras. Além disso, o uso de maturadores, uma ferramenta altamente tecnológica, deve ser acompanhada com cuidado de modo a possibilitar maiores condições de ganho de açúcar. Cuidar da lavoura de cana desde suas fases iniciais por meio do controle de pragas, doenças e plantas daninhas tem sido cada vez mais fundamental. É muito importante uma lavoura bem preparada, que tenha sido implantada com um espaçamento correto, de forma a explorar o adequado índice de área foliar, relação entre a superfície foliar de uma planta e a respectiva área de solo explorada pela mesma. O crescimento e a produtividade de uma comunidade vegetal dependem da interceptação de luz com a finalidade de promover a fotossíntese, consequentemente a produção de carboidratos”, acrescenta.

Beauclair acredita que o mais importante agora é melhorar a tecnologia da colheita mecânica, reduzindo seus impactos com boas práticas agrícolas e melhoria das máquinas. “A manutenção de um canavial limpo e uniforme auxilia na redução das perdas na colheita, assim como uma boa manutenção das máquinas e equipamentos. A sistematização das áreas, controle de tráfego e regulagem das colhedoras estão entre as medidas imediatas que podem ser adotadas para minimizar o problema, mas ainda existe um longo caminho de aprendizado com a colheita mecânica que precisa ser trilhado.”

Para Dematte, o aumento do ATR estaria condicionado, em princípio, as condições climáticas da região associadas a variedade, obedecendo, quando possível, o planejamento da relação ambiente de produção, época de plantio e época de corte.

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Tabela 2– Censo varietal de plantio e corte 2015 (São Paulo e Mato Grosso)

“O sistema de colheita de cana crua tem sido o principal vilão na redução do ATR e na produtividade agrícola devido as perdas. Sendo assim, todo o processo envolvendo melhoria nesta direção seria impactante no aumento do ATR ou no ATR/ha. Por outro lado, não se justifica variedades precoces sendo cortadas em períodos inadequados assim como as médias e tardias. Em regiões onde predominam ambientes extremamente desfavoráveis não há variedades tidas como seguras, a não ser a RB 86 7515 e a SP 83 2847, faltando, como se observa, variedades precoces. Por outro lado, o maturador em aplicação foliar tem sido o único produto comercial até o momento capaz de melhorar o desempenho do ATR de um canavial, tanto no começo como no final de safra. O uso de fertilizantes, via solo ou aéreo, bioestimulantes, ácidos húmicos, aplicações de N + Mo também são ferramentas para auxiliar no aumento de produtividade agrícola e, em consequência, do ATR/ha, porém não aumentam o ATR”, aponta Dematte.

Há necessidade ainda de se avaliar de maneira mais adequada os fatores limitantes em relação aos aumentos da produtividade e ATR/ha. Isto porque, segundo Dematte, o setor não está conseguindo aumento de ATR nas variedades comerciais, inclusive nas novas.

“Temos sido sempre questionados a razão pelo qual plantamos ainda variedades tidas como ultrapassadas, como as da década de 80. A resposta é simples e objetiva: elas apresentam maior segurança e estabilidade. Historicamente é de conhecimento geral que o decréscimo e posteriormente a eliminação de variedades se deve principalmente a doenças. Das 25 variedades citadas pelo CTC, assim como outras das RBs e IACs, praticamente todas apresentam determinadas restrições maior ou menor a doenças e, neste aspecto, é citado as duas mais promissoras, no caso a CTC 15, que esta com a ferrugem alaranjada e está sendo eliminada, e a CTC 4, que esta com a ferrugem marrom.”

Com a mesma velocidade que são introduzidas, as novas variedades estão sendo, na maioria dos casos, eliminadas. Onde estaria o erro? De acordo com Dematte, tudo leva a crer que estaria justamente no pouco tempo de observação antes de ser posto na área comercial.

“Na maioria dos casos os testes de validação têm ficado para os usuários decidirem, o que não está correto. Além do mais, há necessidade de entender que estamos em mudança climática haja vista o que está ocorrendo nestes últimos anos, inclusive no período seco acentuado com elevadas temperaturas em março, abril e maio. Portanto, o sistema de manejo do solo deve preconizar maior infiltração de água ao invés de eliminá-la.”

A Socicana orienta aos produtores que façam um mapeamento do solo de sua propriedade para que tenham os ambientes de produção e façam a adequação das variedades certas no ambiente certo. Para os produtores menores é indicado, além da carta de solos, a setorização de variedades de acordo com o que a usina que faz a sua colheita.

“Se a usina tem uma variedade precoce plantada próxima a propriedade do fornecedor, não adianta ele plantar uma variedade tardia, porque a usina vai fazer a colheita de uma vez só, o que vai prejudicar no ATR. Assim, orientamos para que os produtores façam essa setorização e invistam em variedades com um maior potencial produtivo e que tragam maior valor de ATR ao produtor”, explica do presidente da Socicana.

A produtividade média brasileira de toneladas de colmos de cana por hectare tem se mostrado com um tímido crescimento e, em alguns casos, até diminuído. Sendo assim, Figueiredo diz ser importante o investimento em trabalhos desenvolvidos pelos programas específicos de melhoramento vegetal. “Na cana-de-açúcar há uma grande taxa de conversão de gás carbônico em matéria seca, consequentemente, de açúcar produzido. Portanto, sempre deve ser observado o ambiente de produção, ou seja, o clima, o solo, os recursos naturais e demais condições, a fim de que as respostas fisiológicas da cana-de-açúcar sejam as mais favoráveis possíveis”, conclui.

“Enquanto perdurar o sistema atual de produção com o objetivo de se ter maiores rendimentos das operações agrícolas, principalmente no corte mecanizado, estendendo a safra para períodos inadequados, e não se dando as devidas atenções ao que está ocorrendo nos diversos aspectos relacionados ao solo, a cultura e ao sistema de produção, o setor não conseguirá evoluir”, finaliza Dematte.

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