O Senado, em sessão semipresencial nesta terça-feira (17), acaba de aprovar o Projeto de Lei (PL 2.963/2019) que disciplina a aquisição, a posse, o arrendamento e o cadastramento de imóvel rural, por pessoas físicas e jurídicas estrangeiras, constituídas e estabelecidas fora do território nacional.
O PL é do senador Irajá (PSD-TO), teve parecer favorável do senador Rodrigo Pacheco (DEM-MG), com emendas, e segue agora para votação na Câmara dos Deputados.
O texto prevê que os imóveis rurais adquiridos por sociedade estrangeira no Brasil também deverão obedecer aos princípios da função social da propriedade previstos na Constituição, como o aproveitamento racional e a utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e a preservação do meio ambiente.
De acordo com o relator, até o momento, a aquisição de terras no Brasil por estrangeiro é envolta em controvérsias jurídicas, que transitam em torno da Lei 5.709, de 1971, que regula a aquisição de imóvel rural por estrangeiro residente no país ou pessoa jurídica estrangeira autorizada a funcionar no Brasil, anterior à Constituição federal de 1988.
“A questão da recepção, no todo ou em parte, da Lei 5.709, pela nova ordem constitucional foi objeto de diferentes interpretações jurídicas ao longo do tempo, o que trouxe muita insegurança jurídica para o setor produtivo, afugentando o investimento estrangeiro e a implantação de importantes projetos para o desenvolvimento de nossa agropecuária e agroindústria”, afirmou Pacheco, conforme divulgado pela Agência Senado.
No que se refere a empresas brasileiras controladas direta ou indiretamente por estrangeiros, o relator explica que o projeto adequa a legislação à Emenda Constitucional 6, de 1995, que revogou o art. 171 da Constituição, acabando com a distinção entre empresa nacional e empresa nacional de capital nacional.
“Assim, busca-se promover o tratamento igualitário entre as empresas brasileiras e dos capitais produtivos do país, independentemente de sua origem”, destacou o relator no parecer.
Projeto Polêmico
O líder do PT, senador Rogerio Carvalho (PT-SE), apresentou pedido de retirada de pauta do projeto, que acabou sendo rejeitado em Plenário. Ele disse que o texto autoriza a compra de até 25% dos território dos municípios, o que colocaria em risco a segurança alimentar e a produção de alimentos, além de causar o aumento no preço de terras no Brasil.
Para Jean Paul Prates (PT-RN), o projeto é polêmico e exigiria uma discussão mais aprofundada. Em sua avaliação, o texto não estaria maduro para que houvesse uma decisão final do Senado.
O senador Irajá (PSD-TO), autor do projeto, disse que a grande maioria dos senadores presentes à sessão remota teria interesse em votar o projeto. Ele ressaltou que chegou a entrar em contato com 74 dos 81 senadores, dos quais 68 teriam defendido a votação do texto. Irajá ressaltou ainda que o projeto aguardava votação há 11 anos. Durante esse tempo, segundo ele, o país perdeu R$ 550 bilhões em investimentos no setor agropecuário.
O senador Otto Alencar (PSD-BA) destacou que chineses, ingleses e italianos já utilizam terras baianas para plantio de diversas culturas, como soja e café.
Na avaliação do senador Fabiano Contarato (Rede-ES), o projeto promove a internacionalização das terras brasileiras em larga escala, sobretudo das áreas localizadas na Amazônia.
O projeto recebeu o voto contrário dos senadores Eduardo Girão (Podemos-CE), Randolfe Rodrigues (Rede-AP), Paulo Paim (PT-RS), Jorge Kajuru (Cidadania-GO) e Styvenson Valentim (Podemos-RN), além das senadoras Zenaide Maia (Pros-RN), Leila Barros (PSB-DF) e Rose de Freitas (Podemos-ES).
Compras estão sujeitas à aprovação e regras
De acordo com o projeto, a aquisição de imóveis rurais ou de qualquer modalidade de posse quando as pessoas jurídicas forem organizações não governamentais, fundos soberanos, fundações e outras pessoas jurídicas com sede no exterior, estarão sujeitas a aprovação do Conselho de Defesa Nacional (CDN).
Pessoas jurídicas brasileiras constituídas ou controladas direta ou indiretamente por pessoas, físicas ou jurídicas estrangeiras, também terão de passar pelo crivo do conselho quando o imóvel rural se situar no Bioma Amazônia e sujeitar-se a reserva legal igual ou superior a 80%.
As aquisições por estrangeiros de imóveis situados em área indispensável à segurança nacional também deverão obter o consentimento prévio do Conselho de Defesa Nacional.
Serão vedados a estrangeiros qualquer modalidade de posse por tempo indeterminado, arrendamento ou subarrendamento parcial ou total por tempo indeterminado e habilitação à concessão de florestas públicas destinadas à produção sustentável.
A concessão, no entanto, é permitida para pessoa jurídica brasileira constituída ou controlada direta ou indiretamente por pessoa física ou jurídica estrangeira.
Essas vedações não se aplicam quando a aquisição de imóvel rural se destinar à execução ou exploração de concessão, permissão ou autorização de serviço público, inclusive das atividades de geração, transmissão e distribuição de energia elétrica ou de concessão ou autorização de bem público da União.
O projeto dispensa autorização ou licença para aquisição e posse por estrangeiros, quando se tratar de imóveis rurais com áreas não superiores a 15 módulos fiscais. A soma das áreas rurais pertencentes e arrendadas a pessoas estrangeiras não poderá, no entanto, ultrapassar um quarto da superfície dos municípios onde se situarem.
Será de competência ao Congresso Nacional autorizar, mediante decreto legislativo, a aquisição de imóvel por pessoas estrangeiras, além dos limites fixados em lei, quando se tratar da implantação de projetos julgados prioritários, em face dos planos de desenvolvimento do país, mediante manifestação prévia do Poder Executivo.
Cadastro
Os estrangeiros deverão obrigatoriamente lavrar escritura pública para aquisição do imóvel e os cartórios de registro de imóveis deverão manter registro especial, em livro auxiliar, das aquisições de imóveis rurais pelas pessoas físicas e jurídicas estrangeiras.
O relator apresentou emenda para que a identificação do adquirente do imóvel seja acompanhada, no caso de pessoa jurídica, de informações relativas à estrutura empresarial no Brasil e no exterior, declaradas sob pena de falsidade ideológica, conforme previsto no Código Penal.
O projeto altera a Lei 5.868, de 1972, que cria o Sistema Nacional de Cadastro Rural (SNCR), para estabelecer que os cadastros serão informatizados e, ressalvadas as informações protegidas por sigilo fiscal, serão publicados na internet, garantida a emissão gratuita de certidões das suas informações com autenticação digital.
O SNCR terá sua base de dados atualizada com as informações prestadas pelos contribuintes no Documento de Informação e Atualização Cadastral (DIAC), a que se refere a Lei 9.393, de 1996, que dispõe sobre o Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR) e sobre pagamento da dívida representada por títulos da dívida agrária.
O texto também altera essa lei para rever a obrigatoriedade da prestação de informações cadastrais quanto aos imóveis rurais adquiridos ou utilizados por pessoas jurídicas estrangeiras.
Segundo o projeto, um regulamento próprio deverá unificar o SNCR, criado pela Lei 5.868, de 1972, e o previsto na Lei 9.393, de 1996. A informatização e a gestão desse cadastro unificado deverão ter também uma base única, integrada com a base de dados das juntas comerciais e demais órgãos que disponham de informações sobre a aquisição de direitos reais por estrangeiros ou por pessoas físicas ou jurídicas brasileiras constituídas ou controladas por pessoas privadas, físicas ou jurídicas estrangeiras.