Um dos nomes mais polêmicos da agricultura moderna está prestes a desaparecer para sempre: Monsanto. A marca que angariou críticas globais da sociedade por ser reconhecida como a “criadora” do transgênico sairá da praça tão cedo à aquisição da companhia pela alemã Bayer for concluída, nesta semana, por US$ 66 bilhões.
“O nome da companhia permanecerá Bayer. Monsanto deixará de existir”, anunciou o CEO da Bayer, Werner Baumann, em conferência na manhã de ontem.
A decisão de enterrar uma das marcas mais fortes da agroindústria mundial é um marco histórico, mas não chegou a causar surpresa nos círculos da indústria no Brasil. Segundo fontes do setor, os benefícios esperados com a compra da rival americana seriam ainda maiores sem a forte rejeição embutida na marca Monsanto – uma “herança maldita”, diz o mercado.
Essa herança se construiu ao longo de duas décadas, na medida em que as sementes geneticamente modificadas ganharam espaço nas lavouras de soja, milho, algodão e outras culturas menores. Embora a Monsanto não seja a única a desenvolver e comercializar sementes transgênicas, foi a primeira e é a maior nesse segmento. É também a empresa que mais protocola pedidos para liberação de testes de biotecnologia no campo junto às autoridades americanas. Logo, tornou-se também o principal alvo de ataques.
E eles não são poucos. A Monsanto tem sido sistematicamente atacada por diferentes grupos ambientalistas e ativistas contrários à transgenia em alimentos. Com sede em St Louis, a companhia que fatura US$ 15 bilhões ao ano figura também entre as empresas mundiais menos admiradas nos EUA. É alvo de protestos de jovens engajados a grupos de mães americanas, e objeto de documentários – como “O mundo segundo a Monsanto, da dioxina aos transgênicos, uma multinacional que lhe quer bem”, da jornalista francesa Marie-Monique Robin.
A empresa tentou, nos últimos anos, reverter a imagem negativa, com sucesso relativamente pequeno. Mais estrategicamente, adotou, anos atrás, a política de marcas fortes, na qual retirou o logo da Monsanto das embalagens e reforçou os nomes comerciais dos próprios produtos. Assim, é detentora da Seminis, que catapultou sua liderança mundial no mercado de sementes de hortaliças e frutas – mas quem sabe que a Seminis é da Monsanto? O mesmo ocorreu com a Dekalb, de milho, com a Intacta, de soja, e o restante do portfólio.
“Bayer está relacionado com saúde, passa uma imagem positiva ao público. Já Monsanto é o oposto. É química pesada e transgênicos. Ou seja, a relação dela é com a morte”, diz o grupo ambientalista Greenpeace, um dos mais ferrenhos críticos da multinacional.
A aquisição, que deverá criar a maior empresa do mundo de sementes e pesticidas, foi acordada em 2016, mas sofreu intenso escrutíneo de autoridades reguladoras de boa parte dos países onde atuam. Em março, obteve o aval da Comissão Europeia, o maior obstáculo antitruste para o negócio. Na semana passada, a Bayer obteve o aval final pendente do Departamento de Justiça dos EUA (DoJ).
A Bayer disse que a aquisição deverá gerar “valor significativo” à empresa. “A Bayer espera uma contribuição positiva do negócio nos ganhos por ação já a partir do início de 2019. A partir de 2021, esses ganhos deverão atingir um duplo dígito percentual”, disse o CEO da Bayer. As sinergias entre as duas empresas, por sua vez, deverão gerar uma economia equivalente a US$ 1,2 bilhão por ano à Bayer.
O anúncio de ontem veio um dia depois de a Bayer anunciar um aumento de capital de US$ 6 bilhões, parte das medidas para financiar a transação, a maior da história da Alemanha. Com isso, a companhia emitiria quase 75 milhões de novas ações, ao preço de € 81 por ação, para investidores existentes.
Segundo Baumann, no processo de aprovação, a Bayer submeteu mais de 40 milhões de páginas de documentos às autoridades dos EUA e da Europa. A companhia alemã também se comprometeu a se desfazer de US$ 9 bilhões em ativos, que serão adquiridos pela Basf. Entre as áreas de negócios que terá de abrir mão por competir diretamente com a Monsanto estão as divisões de sementes de algodão, canola, soja e vegetais, assim como a divisão de herbicidas Liberty, concorrente da Roundup.
A partir de quinta-feira, quando a conclusão da compra for realizada, a Bayer terá um período de transição de ativos à Basf estimado em dois meses – e só então poderá finalizar a marca Monsanto.
Para o Greenpeace, o slogan já está pronto: se é Bayer, é bomba (em referência ao “se é Bayer, é bom”). “[Sumir a marca] Não muda nada na nossa vida. Continuamos apontando o problema do futuro, seja qual for o nome da empresa: o produtor rural terá de pagar mais royalties e depender mais e mais de tecnologias que ele não controla”, diz Nilo D’Avila, diretor de Campanhas do Greenpeace.
Fonte: Valor Econômico