Diante do aperto orçamentário e da escalada dos juros, o governo federal busca alternativas para ampliar o funding de recursos e diminuir os custos do Plano Safra 2025/26. Nesse cenário, o Ministério da Fazenda, que articula o Plano Safra juntamente com a área agrícola do Executivo, vem antecipando as discussões a fim de elevar fontes com menor custo possível ao Tesouro e melhorar o blend entre os recursos para amenizar a pressão orçamentária.
“Esse é um dos Planos Safras mais difíceis e um dos quais estamos tentando avançar o mais breve possível”, disse o subsecretário de Política agrícola e negócios agroambientais da secretaria de política econômica do Ministério da Fazenda, Gilson Bittencourt, em entrevista exclusiva ao Broadcast Agro.
O próximo ciclo do Plano Safra começa em 1º de julho e se estende até 30 de junho de 2026. No Plano Safra atual, que vai até 30 de junho, o total disponível para a safra foi de R$ 476,59 bilhões para financiamentos de pequenos, médios e grandes produtores.
Contabilizando os R$ 108 bilhões de recursos direcionados por Cédulas de Produto Rural (CPRs), que são originadas a partir do direcionamento obrigatório de Letras de Crédito do Agronegócio (LCAs), a oferta total de crédito na safra 2024/25 chegou a R$ 584,5 bilhões.
Para a próxima safra, o setor produtivo estima necessidade de R$ 594 bilhões a R$ 599 bilhões em recursos para financiamentos agropecuários, sem considerar os recursos de CPRs.
A expectativa do governo é de que a política de crédito oficial do executivo possa ser anunciada ainda no próximo mês, antes do término da vigência do Plano Safra atual.
“O ideal é ter um Plano Safra divulgado ainda em junho, já que ele começa em 1º de julho e há normativas a serem feitas após o lançamento oficial. Esse é o nosso objetivo: antecipar o quanto antes para que possa ser efetivado logo nas instituições financeiras”, explica Bittencourt.
Para isso, o governo definiu quatro etapas de estruturação do Plano Safra. A primeira foi finalizada há uma semana com a definição de fontes de recursos para a construção do plano.
O governo aumentou os porcentuais de recursos de diferentes fontes que devem ser aplicados obrigatoriamente ao crédito rural, o que é conhecido como exigibilidade, conforme deliberação do Conselho Monetário Nacional (CMN).
“A lógica da medida é ampliar as fontes porque parte dos recursos estão travados com renegociações e ampliar o máximo de fontes com menor custo possível”, explicou Bittencourt.
Os recursos obrigatórios são provenientes das instituições financeiras, que ficam obrigadas a aplicar determinados porcentuais em operações de crédito rural. Entre as alterações nas exigibilidades, o CMN ampliou de 50% para 60% o porcentual direcionado ao crédito rural de recursos captados por meio de Letras de Crédito do Agronegócio (LCAs).
Para poupança rural, a aplicação obrigatória passará para 70% para o crédito agropecuário, ante os atuais 65% exigidos às instituições financeiras. No caso dos recursos mantidos em depósito à vista, a obrigatoriedade de destinação ao crédito rural passará dos atuais 30% para 31,5% com taxas controladas. Os novos porcentuais valerão a partir de 1º de julho, data de vigência da próxima safra.
A medida atendeu ao objetivo de antecipação buscado pelo governo, segundo Bittencourt. Geralmente, o anúncio das alterações nas regras de exigibilidade ocorre somente após o lançamento do Plano Safra. A intenção desta vez foi dar uma maior previsibilidade às instituições financeiras e definir o funding para construção da política de crédito oficial.
“A antecipação da exigibilidade vai permitir que os agentes financeiros, ao calcularem dos recursos, terem dados efetivos de quanto precisarão empregar obrigatoriamente. Isso ajuda no planejamento e na construção das bases do Plano Safra com menor custo. A nossa expectativa é que venha um funding com custo menor”, pontuou Bittencourt.
Ele mencionou que, cientes dos novos porcentuais de exigibilidades, as instituições financeiras poderão ofertar nas propostas de equalização fontes com recursos mais baixos. Por exemplo, uma fonte de poupança rural tem custo menor que recursos captados via LCAs.
A segunda etapa avançou na sexta-feira, 30, com o fim do prazo para as instituições financeiras apresentarem suas propostas de volumes de recursos equalizados pelo Tesouro que pretendem operar na próxima safra.
O processo ocorre dentro do leilão que define a distribuição de limites equalizáveis. No leilão atual, a Fazenda estabeleceu novos critérios para os agentes financeiros. “Foi um processo bastante inovador”, comentou Bittencourt.
No Plano Safra atual, para equalizar os R$ 138,235 bilhões disponibilizados para operação das instituições financeiras, o Tesouro aportou R$ 16,37 bilhões em subvenção.
A principal mudança é a retomada do limite para o spread bancário nas linhas equalizáveis. O leilão estabelece teto para os Custos Administrativos e Tributários (CAT) dos agentes financeiros, que deve ser igual ou inferior ao praticado na safra atual.
“No ano passado, como aumentou o risco, permitimos que as instituições financeiras aumentassem o CAT. Neste ano, como a situação está similar ao do ano passado, colocamos o limite de spread igual ou inferior e limitado ao teto de 85% no CAT em cada linha, com o objetivo de tentar diminuir o custo de equalização”, salientou o subsecretário.
O leilão prevê também limite nos custos das fontes de crédito. Quando os recursos forem livres, haverá um teto de 100% da Selic, e em caso de recursos da poupança de 70% da Selic. As mudanças foram aprovadas em comitê entre Agricultura, Desenvolvimento Agrário, Secretaria do Tesouro Nacional e Secretaria de Política Econômica.
As regras de comprovação trimestral de aplicação dos recursos, de uso de 50% dos recursos no primeiro semestre da safra, as travas regionais e, a distribuição de recursos do Pronaf nas regiões Norte e Nordeste foram mantidas.
Outra alteração foi o limite máximo a ser equalizado por bancos de fábrica, que passou de 5% para 3% do total equalizado pelo Tesouro, a fim de maior capilaridade dos recursos entre as instituições financeiras.
A terceira fase de construção do Plano Safra, em andamento, será intensificada nos próximos dias com a definição das prioridades e regras gerais pela Fazenda com os Ministério da Agricultura, quanto ao Plano Safra da agricultura empresarial, e com o Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, quanto à política de crédito para agricultura familiar. “Estamos construindo as bases do Plano Safra”, pontuou o subsecretário.
Por fim, a partir da segunda quinzena de junho, haverá definição pela equipe econômica e agrícola dos limites de recursos para cada linha de financiamento e dos juros aplicados, a partir das demandas das pastas e dos custos apresentados pelas instituições financeiras.
Bittencourt evita cravar, mas um aumento de juros nas linhas de financiamento agropecuário é considerado praticamente inevitável pelo governo.
Há tendência de juros mais elevados, dado que a taxa Selic saiu de 10,5% ao ano quando o Plano Safra passado foi construído para os atuais 14,75% ao ano, com perspectiva de elevação para 15% ao ano em junho, o que encarece o custo de equalização para o Tesouro. “Essa diferença coloca pressão para aumentar a taxa, mas se vai aumentar e o quanto vai aumentar, ainda será definido “, observou.
A definição quanto ao valor final do Plano Safra também deve ocorrer na última etapa, mas a Fazenda já sinalizou que a cifra tende a ficar próxima ao do ano passado, incorporando os recursos direcionados por CPRs. “O mínimo é repetir o que teve nesse ano com um porcentual de crescimento. A tentativa é sempre crescer em recursos, o que é um desafio”, disse Bittencourt.
Outro desafio, aponta, é diminuir a pressão sobre o Tesouro ao mesmo tempo em que os recursos para o financiamento do setor agropecuário sejam ampliados com a perspectiva de fomento à maior produção e, consequentemente, contribuição para redução da inflação de alimentos.
Agência Estado/Isadora Duarte