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Agrícola

COA/CIA – A inteligência no campo

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Nos grandes grupos sucroenergéticos estes centros de controle e monitoramento em tempo real vêm se tornando os maiores aliados da gestão agrícola

Natália Cherubin

Assim como a expansão da automação industrial favoreceu o surgimento do COI (Centro de Operações Industriais) dentro das unidades sucroenergéticas há pelo menos 15 anos, com a evolução e a implementação de novas tecnologias embarcadas em tratores, plantadoras, colhedoras e caminhões, surgiu um novo departamento de inteligência agrícola: o COA (Centro de Operações Agrícolas), também chamado de CIA (Centro de Inteligência Agrícola).

A nova área – nova porque a maioria das usinas vem passando por um processo de consolidação de tecnologias e metodologias de análise de dados ao longo dos últimos quatro anos – é responsável pelo monitoramento, análise de processos e indicadores de desempenho, e validação das operações agrícolas em tempo real (24hx7dias). O intuito é tomar as decisões no tempo mais rápido possível, trazendo mais eficiência, agilidade e redução de custos às operações mais importantes da usina.

O CIA/COA engloba todos os processos agrícolas – desde o planejamento agrícola, processos produtivos (plantio, preparo, colheita), logística, transporte e administração de pessoas, suprimentos (planejamento de compras de peças e insumos), fornecimento de cana e arrendamento, manutenção automotiva, tecnologia de informação – e também da indústria, no que se refere à matéria-prima como controle de impurezas minerais e vegetais, TCH, ATR, validação e auditoria interna sobre a sinergia entre estes processos e a aderência do orçado x planejado x realizado.

“A missão é analisar cada procedimento e identificar padrões de erro nos processos, antecipando as operações para que estes não ocorram, otimizando a produção agrícola. Este departamento se tornou os ‘olhos e ouvidos’ na gestão das unidades sucroalcooleiras”, explica Matheus Tobias Fernandes, gestor do Agronegócio e especialista no tema.

Hoje a principal ferramenta utilizada para a coleta das informações que serão analisadas no COA/CIA vem dos computadores de bordo instalados nos equipamentos. Com esta tecnologia é possível gerar uma gama gigantesca de informações 24 horas por dia e sete dias da semana.

Os computadores de bordo e os rastreadores foram o pontapé inicial e são os principais indicadores ainda usados nos COA/CIAs. No entanto, novas tecnologias vem sendo implementadas como utilização de satélites com inteligência artificial para detecção de focos de incêndios, por exemplo, que automaticamente avisam o CIA e as brigadas de incêndio por meio de e-mail e mensagens de texto. Para a mesma finalidade podem ser usadas câmeras speed-dome que têm capacidade de giro em 360º e alcance de até 7 Km, possuindo sensores infravermelhos que detectam fogo.

Neste sentido, o georreferenciamento aplicado ao CIA é essencial para o efetivo monitoramento das operações. “Somente com o mapeamento rural conseguimos implantar o CDC – Certificado Digital da Cana, automatizando tanto o controle da matéria-prima quanto a logística agrícola. Com o CDC em exercício, conseguimos rastrear a cana que é trazida em cada caminhão e, com sistemas integrados e comunicando entre si, mensurar qual foi o custo de produção por talhão com tratos culturais, hora/homem, hora/máquina e apoiar estrategicamente a alta gestão em tempo real. Com automação e tecnologia conseguimos diminuir custos de produção e extrair ao máximo o potencial produtivo do equipamento, da cultura e dos operadores”, explica Fernandes.

SÃO MARTINHO VIVE TRANSFORMAÇÃO DIGITAL

Em 2019, um novo COA foi inaugurado na Usina São Martinho como parte dos investimentos em projetos que visam a automação dos processos industriais e agrícolas da companhia

O Centro de Operações Agrícolas da São Martinho foi idealizado há muitos anos, juntamente com o seu COI. No entanto, em meados de 2019, um novo COA foi inaugurado na Usina São Martinho, em Pradópolis, SP, como parte dos investimentos em projetos que visam a automação dos processos industriais e agrícolas da companhia.

Entre 2016 e 2018, ao identificar que a falta de cobertura de internet dentro das suas áreas de produção agrícola era um dos principais gargalos para a digitalização das atividades, desenvolveu, em parceria com o CPqD (Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicações) e com financiamentos do BNDES e FINEP, uma tecnologia de transmissão de informações LTE (Long Term Evolution) para prover conectividade em áreas rurais e remotas.

De acordo com Walter Maccheroni, gestor de Inovação da São Martinho, em 2019 a tecnologia foi implantada e começou a operar através de seis torres de telecomunicação já existentes na Usina São Martinho, provendo cobertura 4G para 130 mil ha. “O principal objetivo deste primeiro ano de operação foi a estabilização da rede 4G e a transmissão dos dados, gerados por mais de 700 veículos agrícolas da usina para o COA. Em seguida, estes dados são armazenados como um Big Data para processamento e integração aos demais sistemas da São Martinho.”

Além das coletas de informações em tempo real, o COA é responsável pelo monitoramento, via vídeo e imagens de satélite, de toda a área de colheita da usina para prevenção e combate a incêndios, e para mapeamento e controle de pragas.

“Nosso COA é capaz de coordenar remotamente a manutenção de máquinas no campo e gerenciar dados de todas as bases meteorológicas instaladas na unidade. As operações agrícolas como plantio e colheita são monitoradas em tempo real pelos operadores do COA que podem avaliar as metas diárias de forma instantânea e parâmetros como consumo de insumos agrícolas e combustível pelas plantadoras e colhedoras. Esses são alguns exemplos práticos, mas sabemos que o potencial dessa tecnologia é ainda maior”, destaca Maccheroni.

A estratégia da empresa é ter o COA o mais próximo da operação a ser monitorada. Desta forma, cada usina do grupo terá o seu próprio COA ao longo de 2020 e 2021. “Os dados coletados pelas quatro unidades serão direcionados para uma base integrada única ou Big Data São Martinho para ser melhor explorado por tecnologias de Advanced Analytics”, adiciona o gestor de Inovação da companhia.

Todas as principais atividades agrícolas, como preparo do solo, plantIo, tratos culturais, colheita e transporte, já são monitoradas em tempo real pelo COA, através da rede 4G da São Martinho. É possível monitorar o comportamento dos principais componentes de cada veículo e equipamento em operação, a rotação e temperatura do motor, posição geográfica, velocidade média, status de desempenho operacional, ativos disponíveis ou em manutenção, entre outras informações. Desta forma, a São Martinho consegue melhorar a eficiência de uma série de operações com impactos significativos na redução de custos – por exemplo, no consumo de combustível dos veículos agrícolas.

“O monitoramento em tempo real das operações agrícolas nos permite tomar decisões mais imediatas na ocorrência de problemas, prever eventuais falhas na operação e identificar sinergias entre os equipamentos em campo. Nossa expectativa com este projeto é ganhar, no custo de produção, entre R$2 e R$3 por tonelada de cana colhida”, revela Maccheroni.

MELHOR PLANEJAMENTO E PROGRAMAÇÃO

A Raízen, ao implementar o CIA, reduziu o número de equipamentos em 15%

A Cerradão, localizada em Frutal, MG, faz uso de tecnologias de registro da informação agrícola desde que inaugurou, em 2009. No entanto, os dados que eram coletados de forma manual foram passando por uma digitalização ao longo dos anos e a consolidação do monitoramento agrícola online e em tempo real aconteceu no ano de 2018.

Matheus Uzelotto Lopes, gerente Agrícola da Cerradão, afirma que com o CIA tem sido possível fazer um melhor acompanhamento dos equipamentos no campo, antecipando paradas, analisando se os rendimentos estão dentro do ideal, tanto nas frentes de colheita quanto nas frentes de preparo, plantio, tratos e as operações de apoio.

“Podemos acompanhar o nível de combustível dos equipamentos, nível de parametrizações operacionais como velocidade, rotação e temperatura de trabalho, afim de auxiliar as decisões de manutenção e eficiência de trabalho. Fazemos também melhor direcionamento de rotas dos equipamentos, garantindo que nenhum esteja fora da rota. Estes são os principais pontos de vantagem do monitoramento online e 24 horas”, salienta Lopes.

Outro ponto importante, segundo ele, são os relatórios diários com relação ao serviço prestado e a análise das produtividades, possibilitando tomadas de decisões tanto sobre o sequenciamento de operação quanto da cobrança de rendimentos e acompanhamentos de custo.
“Um dos ganhos mais visíveis são os de planejamento e programação, sendo em intervenções mecânicas ou em comboios, além do sequenciamento das frentes de colheita ou de produção agrícola. Saber o que está acontecendo e como está decorrendo durante o dia faz com que o trabalho do próximo dia seja feito com mais preparo e decisões mais assertivas.”

RENDIMENTO OPERACIONAL

Na BP Bunge Bioenergia, o departamento é chamado de Central Smartlog e fica localizado na sede da empresa em São Paulo. A companhia iniciou o processo monitoramento da sua frota em 2017 e, segundo Mário Dias da Costa Filho, gerente de Mecanização Agrícola Corporativo da BP Bunge, até o ano passado, oito unidades eram monitoradas por este sistema. Por enquanto, apenas as atividades de CTT estão sendo monitoradas. “Para 2020 todas as 11 unidades da BP Bunge estarão contempladas na nossa torre de controle e temos projeto de expansão para as demais áreas agrícolas.”

Dentre as tecnologias utilizadas pela companhia estão a telemetria; o certificado de cana digital; que garante a rastreabilidade da matéria-prima a nível de fazenda e talhão; o despacho de caminhões automático com uso de um sistema programação logística integrado com a telemetria, que melhora significativamente a otimização de caminhões canavieiro; acompanhamento de imagem do pátio de caminhões na indústria com sistema de CFTV; comunicação a distância em cinco estados diferentes por Sistema de Rádio Integrado; e conectividade via satélite, antenas que levam conectividade para as frentes de serviço.

Hoje, na sede em São Paulo, 52 pessoas, trabalhando 24×7, são responsáveis pela análise, monitoramento e programação logística da frota agrícola e gestão de informações a serem tratadas com os times operacionais da BP Bunge. “Estamos conseguindo, com este sistema, redução de tempos perdidos e, consequentemente, o aumento das horas produtivas dos nossos ativos. No entanto, os maiores ganhos estão no rendimento operacional e redução de estrutura”, destaca Costa Filho.

VISÃO MAIS CENTRALIZADA

O maior grupo sucroenergético do Brasil, a Raízen, investe em um sistema centralizado de monitoramento desde 2015. O projeto, incialmente chamado Pentágono, entrou em operação com a denominação CIA – Central de Integração Agroindustrial – já na safra 2016/17. Incialmente, de acordo com Thaís Fornícola, gerente de governança operacional e Alessandra Veigas, coordenadora de projetos da Raízen, a companhia fazia apenas o controle do CTT e Apoio.

“Quatro safras depois, fomos integrando outros processos agrícolas dentro do controle centralizado. Na safra 2019/20 operamos com sete processos diferentes. Além do CTT e do Apoio, monitoramos as operações de plantio, preparo, manutenção, biomassa e vinhaça. A expansão se deu depois da companhia analisar os resultados efetivos que essa centralização propiciou. A partir do momento em que conseguimos estabelecer um modelo de acompanhamento centralizado, propiciamos uma série de otimizações dentro do campo, tanto em equipamentos e até mesmo oportunidade de sinergia do ponto de vista de otimização logística”, revela.

Hoje, para captação e análise de dados, a companhia usa basicamente as informações que são enviadas pelos computadores de bordo das máquinas. No entanto, muito antes do uso de tecnologias foi primordial a criação e desenvolvimento de processos bem definidos e padronizados.

“A entrada de novos monitoramentos, como o preparo, plantio e manutenção, exigiu que tivéssemos um formato de acompanhamento, ou seja, modelos de relatórios, informações e qual era a frequência de comunicação necessária de estabelecer com o campo. Uma vez definido, funcionando e com resultados efetivamente comprovados, entramos com a tecnologia”, afirmam.

A questão da conectividade é resolvida de várias formas. Além da área de TI, a Raízen tem uma área que suporta, com tecnologias de comunicação, os equipamentos no campo. Segundo Thaís, a companhia analisa a qualidade do sinal nas áreas onde opera e diante das dificuldades que identifica, estabelece planos de ação.

“Em locais onde observamos dificuldade de sinal, optamos por usar concentradores com chips multioperadoras que capturam os sinais das operadoras que estão melhores no momento para que as informações sejam enviadas em tempo real. Em locais onde o sinal é muito complicado, como na região de Goiás, trabalhamos com a tecnologia de antenas via satélite que possibilitam a comunicação, afinal, a chave da atuação centralizada é a comunicação efetiva”, explica Thaís.
O CIA da Raízen está localizado no CAR (Central Administrativa Raízen) em Piracicaba, SP. São aproximadamente 170 pessoas, em regime 24×7, que atendem todas as unidades produtoras do grupo.

“O grande ganho é ter uma visão mais centralizada. Com a visão centralizada conseguimos antecipar alguns potenciais problemas e com a agilidade na tomada de decisões é que ganhamos em produtividade. Conseguimos apoiar o campo em indicadores que são críticos de produtividade, como, por exemplo, as horas de corte. Com o monitoramento conseguimos aproveitar as oportunidades e desenvolver ações que vão garantir a operação da máquina no máximo de horas possível”, explica a coordenadora de projetos da Raízen.

A empresa não abre os números sobre os resultados obtidos por conta do seu CIA, mas afirma que é expressiva a redução dos custos com manutenção. Além disso, revela que, ao implementar o CIA reduziu o número de equipamentos em 15%.

COA DO FUTURO

Ao passo que ainda existem muitas tecnologias a serem lançadas para o aperfeiçoamento do controle em tempo real, outras já estão disponíveis e prontas para uso. “O ápice da automação será quando não tivermos intervenção humana na criação, alimentação e comunicação das informações. Agir sempre preventiva e preditivamente para mitigar qualquer desvio que leve à queda na produtividade. No entanto, o mais importante é a unificação e integração das informações. Hoje, a chave do sucesso é a informação. Como ela é gerada, transmitida, coletada, tratada e analisada”, opina Fernandes.

A partir dos dados capturados pelos sensores distribuídos nas máquinas e demais ativos agrícolas, a São Martinho já consegue armazenar e estruturar toda a informação em seu Big Data. Isto, na opinião do gestor de Inovação da companhia, será a base para o desenvolvimento de ferramentas digitais capazes de potencializar ainda mais os ganhos com a conectividade.

“A Ciência de Dados será fundamental neste movimento de transformação digital, com o apoio de tecnologias como Advanced Analytics e Inteligência Artificial. Para que isso seja possível, contamos com o apoio do Ecossistema São Martinho de Inovação, formado por universidades, centros de pesquisa, startups, empresas privadas e organismos financiadores de inovação. Nosso objetivo é agregar valor ao negócio por meio do cruzamento dos dados de diferentes origens e pelo desenvolvimento de ferramentas que possam reduzir os custos agrícolas e aumentar a produtividade da lavoura”, acrescenta Maccheroni.

A Cerradão quer que seu CIA seja cada vez mais usado para análises e tomadas de decisões da Manutenção. “Esperamos fazer um acompanhamento mais consolidado em produtividade dos equipamentos e mantenimento dentro dos parâmetros ideais. Tentando remunerar, de forma variável, as diferentes qualidades dos nossos colaboradores”, explica o gerente Agrícola da Cerradão.

A BP Bunge tem como foco aumentar o nível de automação e ciclos automáticos em suas operações para garantir mais confiabilidade nos dados operacionais. “Esperamos também contar com a implementação de Inteligência Artificial para atuação de forma preditiva, gerando recomendações para melhor eficácia nas tomadas de decisão.”
A Raízen está testando nas suas operações o RPA (Robotic Process Automation) vislumbrando a aberturas automáticas de chamados, envios automáticos, relatórios e até mesmo cálculo de produtividades. Além disso, na programação e roteirização de caminhões para CTT e Apoio, a companhia tem testado alternativas de inteligência artificial. “Esse é o futuro. A medida que o campo avança com tecnologias embarcadas nos equipamentos, conseguimos trazer inteligências para aperfeiçoar os processos, deixando nosso time muito mais voltado às questões analíticas.”

Segundo Fernandes, em um projeto piloto que iniciou em 2018 na Usina São João, foi registrada uma economia de R$ 3,5 milhões apenas nos seis primeiros meses de implantação, fator que viabilizou o investimento inicial, visto que a economia foi obtida em curto prazo.

“Quando o CIA/COA está bem estruturado e faz parte da sinergia na organização, ele tem autonomia em todos os processos produtivos atuando, otimizando e agindo efetivamente em diversos indicadores. Consequentemente, temos melhores resultados na produção de etanol, açúcar e energia. Então, apesar do alto investimento em tecnologia, contratações, treinamentos e cursos, sim, o investimento é viabilizado quando o setor é implantado de forma coerente e direcionado de forma correta”, destaca Fernandes

Ele destaca, porém, que o fato de possuir a tecnologia, a mão de obra qualificada e o fluxograma bem delimitado, não garantem eficiência operacional. É também imprescindível que o departamento tenha uma pessoa chave na área analítica, que desenvolva os estudos e tratamento das informações de forma rápida. Outro ponto importante é bom funcionamento e calibração dos equipamentos tecnológicos, que também são fundamentais para coleta de dados com veracidade e rapidez.

“Uma equipe de técnicos especializados em telecomunicações, eletrônica e elétrica automotiva faz toda a diferença na hora de manter a parte de hardware sempre funcionando da melhor forma possível”, conclui Fernandes.

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