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Bioenergia

Tributação dos CBios ainda gera dúvidas e pode ser judicializada

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A falta de uma diretriz oficial sobre como recolher os tributos PIS e Cofins sobre a compra e a venda dos Créditos de Descarbonização (CBio) – o primeiro mercado regulado de carbono do país voltado ao estímulo de biocombustíveis, que começou a operar neste ano – pode gerar autuações da Receita Federal e, segundo especialistas, levar à judicialização da questão caso não haja uma definição infralegal.

Na raiz do problema está o caráter único do CBio, que em sua criação não foi caracterizado nem como um ativo financeiro nem como um produto do objetivo final dos produtores de biocombustíveis, mas sim como um “ativo ambiental” – figura jurídica inexistente até então.

Essa indefinição paira sobre um mercado que já movimentou quase R$ 700 milhões desde o início das negociações dos papéis na B3 até o último dia 24. E as negociações continuam avançando, conforme se aproxima o prazo para que as distribuidoras, que são obrigadas a comprar os CBios, comprovem o atendimento às metas de descarbonização estabelecidas para este ano (e da última semana de 2019). Cada CBio equivale a 1 tonelada de carbono de emissão evitada.

A tributação de imposto de renda sobre a venda dos CBios já havia sido equacionada na chamada “Lei do Agro”, que determinou uma alíquota de 15%, retido na fonte. “Mas a lei só disse que o imposto de renda não entra na base de cálculo [do emissor do CBio]. Não tratou do PIS/Cofins, o que deixa uma lacuna aberta”, afirma Felipe Destri, sócio do BMA Advogados.

“A natureza dessa receita [se é operacional ou financeira] é importante para que se defina como ela é tributada no regime não cumulativo, e é importante nas discussões sobre as apropriações de créditos – ou se não é o caso de crédito, caso seja considerada receita financeira”, afirmou Fernanda Sá Freire, sócia do escritório Machado Meyer.

Caso os produtores de biocombustíveis que estão vendendo esses títulos reconheçam essas receitas como operacionais, a alíquota de PIS/Cofins para as empresas no regime não cumulativo (no qual se encaixa a ampla maioria das empresas do agronegócio) é de 9,25%. Mas, caso se trate de uma receita financeira, a alíquota é de 4,65%.

No caso de uma empresa que se enquadre no regime cumulativo, a alíquota é de 3,65% para as receitas operacionais. “Mas se o CBio não é a atividade principal da empresa, se isso não faz parte do seu objetivo social, ela pode defender que não tenha cobrança PIS e Cofins no regime cumulativo”, observa Destri.

Na opinião de Freire, o CBio se aproxima mais das características de um ativo financeiro, já que o título é vendido por agentes financeiros na B3, passa pela escrituração dos bancos e pode ser negociado por especuladores. “A lei não tem uma definição clara sobre o que é receita financeira, nem restringe o que não é”.

Porém, a advogada reconhece que o CBio tem particularidades que escapam aos de um ativo financeiro normal. “Quando se pensa em receita financeira, pensa-se em acréscimos com operações financeiras, e aqui não é bem isso”, pondera ela.

Já a favor da interpretação de que o CBio é uma receita operacional pesa o fato de que o ativo só é gerado como resultado da atividade de fabricação de biocombustível após a certificação do produtor e da comprovação da venda do produto renovável à Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). “Por isso, também é factível entender que o CBio deva ser tributado como outra receita qualquer da empresa”, disse Diogo Martins Teixeira, também sócio do Machado Meyer.

A indefinição sobre o PIS/Cofins dos CBios não afeta apenas quem vende os títulos, mas também quem compra. Se as distribuidoras reconhecerem as despesas com os títulos como de caráter operacional, poderão reconhecer créditos de PIS/Cofins referentes a essas transações, dizem os tributaristas. Já se a despesa com CBios for entendida como meramente financeira, esses créditos não poderão ser reconhecidos.

Na visão de Leandro Artioli, que também é sócio do BMA Advogados, as distribuidoras enfrentam outra indefinição, sobre se o custo com os CBios pode ser dedutível da apuração do IR como despesa operacional. “Deveria ser, porque ela é obrigada a adquirir os CBios”, sustenta.

A saída para a tributação do PIS/Cofins pode ser uma instrução normativa da Receita. Em nota ao Valor, a União das Indústrias de Cana-de-Açúcar (Unica), que representa as usinas do Centro-Sul, principais participantes do RenovaBio, disse que aguarda uma instrução do fisco, mas avaliou que “a questão em nada afeta o andamento do programa”. Procurada, a Receita se pronunciou.

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