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Cana irrigada: Série termina e revela mais um MITO sobre irrigação em cana

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Chegamos ao final da série sobre cana irrigada. E Vinicius Bof Bufon, pesquisador da Embrapa Cerrados, traz mais um MITO que ronda o assunto irrigação em cana-de-açúcar. Confira:

Produção irrigada de cana não é economicamente viável: MITO

Esse é mais um mito. Primeiramente, é fundamental perguntarmos se haverá sustentabilidade econômica para o setor sucroenergético brasileiro se continuarmos produzindo nos moldes atuais, com produção de sequeiro. Acreditamos que a resposta para essa pergunta é negativa dada à tendência de redução contínua das margens financeiras das lavouras, à instabilidade dos mercados internacionais, aos riscos climáticos crescentes e aos avanços tecnológicos e de eficiência experimentados pela concorrência, como o açúcar de beterraba, o etanol de milho, os carros elétricos, entre outros.

Por isso, entendemos que é urgente verticalizar o setor sucroenergético brasileiro, principalmente na fase agrícola. Ou seja, há uma real necessidade de elevar drasticamente seu patamar de produtividade e reduzir cada vez mais o uso de insumos por meio do ganho de eficiência. Para isso, atualmente, não há estratégia melhor do que converter uma fração da área de produção de cana de sequeiro em área de produção irrigada. Hoje, essa é a única alternativa prontamente disponível para mudar substancialmente, em curto e médio prazos, os patamares de produtividade e o custo do setor sucroenergético brasileiro.

No Brasil, com boa gestão, temos recursos hídricos abundantes para isso e também o que há de melhor no mundo em termos de engenharia de irrigação e de ferramentas para gerenciamento de irrigação. O que precisamos é unir forças – da pesquisa, das empresas de irrigação e do setor produtivo – para comunicar, informar, capacitar e evidenciar ainda mais a viabilidade técnica e econômica dessa estratégia.

Diversos grupos e produtores que são referência em inovação tecnológica já caminham a passos largos nessa direção – muitos até com estratégias sigilosas para acentuar sua vantagem competitiva. Mas precisamos que essa seja uma realidade de todo o setor e não apenas de poucos grupos.

Um erro recorrente é avaliar a viabilidade econômica de sistemas irrigados e considerar única e exclusivamente o ganho de produtividade de colmos. De fato, o ganho de TCH (Toneladas de Colmos por Hectare) é um ponto muito importante e, além de aumentar receita, tem um impacto direto na diluição dos custos. Mas há muito mais do que isso. Conseguimos, no sistema irrigado, níveis de ATR (Açúcar Total Recuperado) iguais ou superiores aos de áreas de sequeiro (leia mais em revistarpanews.com.br/cana-irrigada-conheca-mais-um-mito). Por isso, aumentamos substancialmente a produção de açúcar por hectare, tanto pelo aumento de TCH quanto pelo aumento de ATR.

Como consequência, temos reduções acentuadas no elemento de maior custo da operação agrícola – corte, transbordamento e transporte (CTT). Primeiro, reduzimos o custo de corte. Apesar de a tecnologia atual das colhedoras não permitir operar com a mesma velocidade nos canaviais irrigados, a quantidade de cana colhida por hora aumenta bastante, reduzindo o gasto com corte por tonelada de colmo ou de ATR colhidos. Com a evolução das colhedoras, essa vantagem em canavial irrigado só aumentará.

Além disso, por causa da maior produtividade de ATR por hectare, a distância dos transbordos para receber cada tonelada de ATR diminui. Consequentemente, cai a despesa de transbordamento. E, finalmente, com as maiores produtividades do sistema irrigado, conseguimos verticalizar a produção da usina como um todo e atender a capacidade de moagem utilizando uma área menor, concentrando a produção em menor raio médio mais próximo à usina. Dessa forma, haverá redução do custo por tonelada de ATR transportada. Resumindo, a produção irrigada implica em redução acentuada de CTT.

O segundo elemento mais oneroso da fase agrícola é o plantio, incluindo aqui o custo da terra. No final de um ciclo de produção irrigada, quando formos renovar o canavial, teremos produzido muito mais toneladas de ATR do que seria possível em uma área de sequeiro, tanto pela maior produtividade de ATR por hectare quanto pela maior longevidade do canavial. Consequentemente, teremos muito mais toneladas de ATR para diluir os custos de plantio e da terra. Ou seja, essas despesas também são menores no sistema irrigado de produção de cana.

Outro ponto inclui os ganhos de eficiência em todas as demais operações agrícolas. Se operamos em menor área para produzir a mesma quantidade de ATR, reduzimos os custos de capital (inclusive com maquinário), de mão-de-obra, administrativo e tudo mais. E ainda podemos considerar as facilidades e ganhos de eficiência na gestão ocasionadas pela redução da área.

Vejamos a alguns exemplos: a maior parte do monitoramento de pragas e doenças tem um custo por área, por hectare, independente do seu nível de produtividade. Se a usina produzir sua demanda de cana em uma área 20% menor, reduzirá quase 20% no valor pago por essa operação.

As despesas com herbicida variam por área e ainda podem ser menores considerando que o sistema irrigado propicia menos falhas nas lavouras e maior velocidade de fechamento da entrelinha, impactando o custo do controle de ervas daninhas.

Outras operações que têm seu custo afetado na mesma proporção do encolhimento da área são o mapeamento e correção de solo, manutenção de estradas e carreadores, aplicação de maturadores, adubação foliar, aplicação de fungicida etc.

E ainda não colocamos na balança o ganho gerado pelo aumento de produtividade e eficiência e pela redução de custo das áreas de sequeiro, uma vez que elas podem ser direcionadas para os melhores ambientes e com a melhor janela de plantio, ao alocarmos a produção irrigada nos piores ambientes da usina.

Com uma fração da área da usina adotando sistema irrigado de produção e a fração de sequeiro alocada nos melhores ambientes e janelas de plantio, também se reduz muito a susceptibilidade aos riscos climáticos e o nível do impacto das secas nas quebras de safra, abrandando despesas associadas a quebras de contrato, seguros, compra de cana spot etc.

Ademais, no contexto geral da usina, ao aumentar a produtividade média usando uma área menor para entregar a mesma moagem, podemos reduzir o número de contratos de arrendamento e de fornecedores, abrir mão não só das áreas mais distantes, mas também das áreas com piores relevo e solo, maior risco de incêndio, de litígio, entre outros. Qual a importância desses aspectos na sustentabilidade do negócio?

Dito isso, considerando apenas os ganhos diretos (sem contar os vários ganhos indiretos apontados acima), calculamos um payback aproximado de três anos para o investimento em área irrigada. Depois desse prazo, o produtor terá pelo menos entre 10 e 15 anos de vida útil dos equipamentos para usufruir dos ganhos do sistema irrigado.

Os dois argumentos mais relevantes contra a viabilidade econômica, na verdade, não têm relação com a viabilidade do sistema em si. O primeiro é a falta de domínio da tecnologia para extrair seu potencial.

Como em qualquer outro sistema, a única solução é buscar apoio técnico e começar a exercitar o sistema irrigado em uma pequena fração de sua área – evoluindo com a curva de aprendizado e de domínio da tecnologia. Como esse aprendizado demanda certo tempo, não começar o quanto antes pode custar a sobrevivência do negócio. Lembremos que, no setor sucroenergético, os casos de recuperação judicial e falência já são tremendamente superiores aos de abertura de novas empresas.

O segundo argumento é a fragilidade financeira para iniciar os investimentos nos sistemas de irrigação. Para isso, não há outra solução a não ser estruturar um plano diretor de investimento para essa finalidade. Também é uma estratégia viável utilizar os ganhos das primeiras etapas de investimento em produção irrigada para custear sua expansão para novas áreas. Isso é mais plausível do que imaginar que a expansão da área irrigada será custeada pelos ganhos cada vez menores da área de sequeiro.

Para mais informações: cerrados.imprensa@embrapa.br; vinicius.bufon@embrapa.br

 

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