Conecte-se conosco
 

Últimas Notícias

Combustível do Futuro sai do papel com bilhões (de promessas) no tanque

Publicado

em

Protagonista na política de descarbonização do governo, lei deve destravar aportes de grande porte no setor de biocombustíveis; números variam de R$ 130 bilhões a R$ 260 bilhões

Uma das vitrines da política de descarbonização e transição energética do governo federal, a lei que institui o programa Combustível do Futuro foi sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva nesta terça-feira, 8 de outubro.

Já na largada, a lei motivou entusiasmo, com anúncios de bilhões em investimentos – e promessas de muitos outros aportes bilionários à frente por parte do setor de biocombustíveis. Os valores variam conforme a fonte, mas ninguém pensa pequeno.

O governo estima, por exemplo, que a lei vai destravar aportes totais de R$ 260 bilhões. Já o presidente da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica), Evandro Gussi, afirmou, em discurso, que o setor de etanol, biometano e combustível de aviação deve investir mais de R$ 130 bilhões nos próximos anos.

Para dar mais consistência às promessas, o evento, realizado em Brasília, reuniu grandes empresas do segmento, que assinaram cartas de compromisso com o governo. Considerando apenas as sete companhias que subiram ao palco, em Brasília, a soma dos aportes previstos é de cerca de R$ 20,2 bilhões – a maioria deles já anunciada.

O maior desses investimentos é o da Raízen, de R$ 11,5 bilhões, seguido por Inpasa (R$ 3,4 bilhões), Grupo Potencial (R$ 3 bilhões), Virtus GNL, Eneva e Edge (R$ 1,3 bilhão), FS Bioenergia (R$ 500 milhões), Be8 (R$ 400 milhões) e Shell, Senai-SP e Raizen (R$ 120 milhões). Boa parte dos aportes já haviam sido divulgados anteriormente.

O projeto da Raízen engloba a implantação de nove unidades de etanol de segunda geração, biometano e biogás, segundo a companhia, com prazo de execução previsto para os próximos anos. A empresa tem duas plantas de E2G em operação, localizadas nas cidades de Piracicaba e Guariba, no interior de São Paulo, e mais sete plantas em fase de projeto ou construção, nos estados de São Paulo, Mato Grosso do Sul e Goiás.

A Inpasa, maior produtora de etanol de milho da América Latina, vai implantar a segunda fase da usina de etanol de milho em Sidrolândia (MS), com capacidade de produção de 1,25 milhão de litros por dia. A companhia também vai finalizar sua usina de etanol em Balsas (MA), investimento de R$ 1,2 bilhão anunciado há um ano, e construir sua oitava biorrefinaria em Luís Eduardo Magalhães (BA), uma das cidades polo do agronegócio, aporte que foi comunicado em setembro passado.

As companhias Virtus, Eneva e Edge, da Cosan, por sua vez, vão se juntar para a criação do primeiro corredor rodoviário verde de transporte de gás natural, com 3 mil quilômetros de extensão. Em sua primeira fase, a ser implantada até 2026, deve ligar os portos de São Luís, no Maranhão, e Santos, em São Paulo.

Já investimento da FS Bioenergia, pioneira na produção de etanol de milho, envolve um primeiro projeto de captura e estoque de carbono no solo junto à unidade de produção de etanol da empresa em Lucas do Rio Verde (MT).

O Grupo Potencial, do Paraná, vai aportar R$ 600 milhões para ampliar a capacidade de produção de sua usina de biodiesel localizada em Lapa, na região metropolitana de Curitiba, passando de 900 milhões de litros para 1,6 bilhão de litros de biodiesel por ano.

“Será a maior planta de biodiesel do mundo em um único complexo”, afirma o vice-presidente de operações do Grupo Potencial, Carlos Eduardo Hammerschmidt. As obras devem ser executadas no ano que vem, com conclusão prevista para 2026.

Além disso, a empresa paranaense também está construindo uma nova esmagadora de soja, em um investimento de R$ 2 bilhões e conclusão prevista para o primeiro semestre de 2026. A Potencial espera produzir, nessa esmagadora, 25 milhões de litros por mês.

O documento assinado pela gaúcha Be8, que tem hoje usinas de biodiesel em Passo Fundo (RS) e em Marialva (PR), prevê construir uma planta produtora do biocombustível em Uberaba (MG). “Estamos assumindo o compromisso de continuar investindo muito nessa cadeia produtiva desde a matéria-prima à indústria e o Combustível do Futuro vai trazer uma onda de investimento (para o segmento)”, disse Erasmo Carlos Batistella, presidente da Be8, em discurso.

“É importante destacar a mobilização de todo o setor produtivo e a consciência e compreensão da classe política da importância do desafio climático que vivemos e que resultou na aprovação do projeto de lei pela ampla maioria nas casas legislativas”, acrescentou.

Fechando a lista está o investimento feito em conjunto por Raízen, Shell e Senai, anunciado na semana passada, para a construção de um centro de pesquisas em bioenergia em Piracicaba (SP), que ficará junto ao Parque Tecnológico local e terá a missão de “desenvolver soluções de descarbonização a partir da cana-de-açúcar”.

Em paralelo, a Caramuru Alimentos, que não esteve presente no palco do evento para firmar uma carta compromisso, anunciou um pacote de seis investimentos, totalizando R$ 2,2 bilhões, em diferentes partes do país.

Os planos preveem uma planta de produção de proteína concentrada de soja em Itumbiara (GO), um terminal rodo-hidroviário em Miritituba (PA), um sistema de carregamento de navios no Porto de Santana, no Amapá, a ampliação da capacidade de processamento de soja da planta de Ipameri (GO), a instalação de uma planta de glicerina farmacêutica bidestilada em Sorriso (MT), e de uma unidade de etanol de milho em Nova Ubiratã (MT).

“Esses investimentos não apenas reforçam o comprometimento da Caramuru Alimentos com o desenvolvimento sustentável, mas também são reflexos diretos da nova Lei do Combustível do Futuro, que viabiliza a criação de uma infraestrutura moderna e eficiente para o escoamento de produtos e a produção de combustíveis renováveis”, disse o diretor presidente da Caramuru, Júlio Costa, em comunicado à imprensa.

Os avanços da nova lei

Encaminhado pelo governo há pouco mais de um ano, em setembro de 2023, o projeto de lei sancionado agora foi aprovado em março passado na Câmara dos Deputados e, há pouco mais de um mês, em 4 de setembro, recebeu o aval do Senado.

O texto aumenta os percentuais de mistura de etanol na gasolina e de biodiesel no diesel fóssil e cria programas de incentivo para o desenvolvimento de biocombustíveis como SAF (combustível sustentável de aviação), diesel verde e biometano.

O presidente Lula sancionou o texto e discursou durante a Liderança Verde Brasil Expo, maior feira do país sobre tecnologias de descarbonização, realizada em Brasília.

“O Brasil é o país que vai fazer a maior revolução energética do planeta Terra e não tem ninguém para competir com o Brasil”, disse o presidente, ladeado por vários ministros, como o de Minas e Energia, Alexandre Silveira, e o da Agricultura, Carlos Fávaro, pelo presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, pelo vice-presidente Geraldo Alckmin, e pela ex-presidente e chefe do banco dos Brics, Dilma Rousseff.

“O Brasil vai sair na frente porque tem vocês, empresários, que vão produzir, tem a Embrapa. Nós temos um monte de gente preparada para não ficarmos dependentes de ninguém. E vai depender de nós porque, quando a gente cria uma matriz energética para oferecer ao mundo, aumenta a nossa responsabilidade”, acrescentou Lula.

A nova lei amplia a possibilidade de mistura de etanol à gasolina, variando entre 22% e 35%. Hoje, o teto dessa composição é de 27,5%, com um mínimo de 18% de etanol. Já a mistura de biodiesel no diesel comum, hoje de 14%, deve subir um ponto percentual a partir do ano que vem, até chegar a 20% em março do 2030. Depois disso, a mistura poderá chegar a 25% até 2035.

O aumento da mistura deve representar oportunidades para a soja. A elevação da mistura de biodiesel ao diesel deve exigir uma elevação de 296% no volume de óleo de soja, nas contas da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove). O cálculo leva em conta as 4,8 milhões de toneladas de óleo usadas em 2023, quando a mistura autorizada pelo governo era de 12%.

A expansão projetada deve contribuir para um aumento expressivo da quantidade de esmagadoras de soja e de usinas de etanol. Hoje, a capacidade de processamento de oleaginosas no país é de 72,3 milhões de toneladas, montante que representa um avanço de 4,5% em relação aos números do ano passado, quando haviam sido esmagadas 69,2 milhões de toneladas de soja.

O Brasil hoje possui 132 unidades industriais de esmagamento de soja. Dessas, 113 estão ativas, com capacidade de processamento de 204.793 toneladas por dia, de acordo com a Abiove.

A lei sancionada hoje pelo governo também deve incentivar a adoção do combustível sustentável de aviação (SAF, na sigla em inglês). Os operadores aéreos terão de reduzir as emissões de gases do efeito estufa geradas nos voos domésticos utilizando SAF. A redução começa em 1% em 2027 e, ao longo de uma década, vai subindo gradativamente até alcançar 10% em 2037.

O SAF ainda não é produzido comercialmente no Brasil, mas grandes empresas como Acelen, Petrobras e BBF já têm projetos para fabricar o combustível em diferentes regiões do país, a partir de matérias-primas como palma, soja, milho, macaúba e sebo bovino.

Já em 2030, a América do Sul deve alcançar uma produção de 1,1 milhão de metros cúbicos de SAF por ano, de acordo com a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), do governo federal. “O uso do SAF em larga escala e a renovação dos aviões são as iniciativas mais efetivas para descarbonização em curto e médio prazo”, disse Francisco Gomes Neto, CEO da Embraer, em discurso durante o evento.

Com informações da AgFeed/Italo Bertão Filho
Cadastre-se e receba nossa newsletter
Continue Reading