Como dizia meu tio Zé, que trocava açúcar por carne seca lá nas bandas de Piumhi:“Quem quer adoçar demais a vida, às vezes acaba azedando o caixa.” Pois bem. A Raízen, gigante do setor energético brasileiro, parece ter ouvido um sábio parecido. Após um prejuízo de R$ 2,5 bilhões no último trimestre e uma dívida que pulou para R$ 34,2 bilhões, a empresa decidiu fazer o que muita dona de casa faz quando o salário aperta: reorganizar a despensa e voltar ao básico.
Em entrevista recente ao Investing.com Brasil (13/05/2025), o novo CEO Nelson Gomes — que assumiu o comando em novembro passado — foi direto: é hora de focar nos negócios principais e botar ordem no galinheiro.
“Estamos de volta ao core business”, disse ele, referindo-se ao açúcar, etanol e bioenergia — os pilares que sempre sustentaram a companhia. Nada de inventar moda com açúcar branco na bolsa de Nova York ou operações sofisticadas que pareciam mais cassino do que estratégia.
A ordem agora é simplificar. Nelson já começou cortando cargos de alto escalão: cerca de um terço da diretoria será desligada. E a empresa suspendeu novos projetos de etanol de segunda geração (E2G) — vai concluir o que começou e rever o resto. Nada mais de plantar cana em terreno alheio antes de colher o que já está no próprio quintal.
A dívida subiu 78,9% em um ano, e a alavancagem chegou a 3,2x o EBITDA. É dívida que dói até em usina hidrelétrica. Para enfrentá-la, a Raízen promete desinvestimentos cirúrgicos, controle de custos e menos romance com projetos que não trazem retorno.
Não é recuo. É reencontro. Não é crise. É cura. E como disse o próprio CEO: há “um senso de urgência bastante grande” — coisa rara em empresas grandes, que costumam se mover como navio em manobra.
A Raízen parece ter entendido que, no mercado atual, confiança, simplicidade e foco valem mais que aditivo premium.
Vamos acompanhar. E torcer para que, no final das contas, o que adoça o caixa não seja só o açúcar — mas uma boa estratégia, bem misturada com coragem e clareza.
*Wladimir Eustáquio Costa é CEO da Suporte Postos, especialista em mercados internacionais de combustíveis, conselheiro e interventor nomeado pelo CADE, com foco em governança e estratégia no setor downstream.
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