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UISA dá a volta por cima com planejamento e gestão focada em inovação
Contratado em 2016 e longe dos holofotes, o hoje presidente da UISA, José Arimatéia Casalverini, com a ajuda de sua equipe e dos colaboradores, vem arrumando a antiga “casa” Usinas Itamarati para um novo momento: a UISA.
Contratado para equacionar as dívidas da companhia, que na época de sua entrada atingiam R$ 3,2 bilhões, entre débitos fiscais, com fornecedores e com instituições financeiras, o atual presidente da UISA conta, em entrevista exclusiva para a RPAnews, como foi ultrapassar os desafios e como ajudou não só a reerguer a unidade, como também retomar os bons números e fazê-la crescer em meio à crise.
RPAnews: Como foi assumir participar de toda essa transformação da UISA? Quais foram os maiores desafios?
José Arimatéia: O maior desafio era o montante da dívida, que era significativo. Entender o que essa dívida significava e como ela se relacionava com a capacidade de gerar resultado da UISA, sem dúvida, foi o grande desafio. Agora, eu faço um contraponto disso com o que eu considero a grande oportunidade. A estrutura de produção agrícola da UISA é espetacular. Então, trabalhamos com a ajuda de consultores para tentar entender claramente qual era o potencial de produção agrícola, o que essa região poderia nos oferecer e qual era a melhor estratégia de abordagem na questão da produtividade agrícola. Foi o contraponto desse grande desafio que nos permitiu construir um projeto de recuperação da produtividade do canavial – que fechou em 2018 com cana própria com 94 por ha- e trazer esses números para a realidade foi o que destacou a possibilidade de negociar as nossas dívidas, ou seja, quando investidores financeiros perceberam que havia uma capacidade real de geração de caixa na usina, que ela era capaz de entregar resultados superlativos, foi quando o grande desafio de renegociação das dívidas se tornou superável.
O ganho de produtividade tem a ver com a implementação de novas tecnologias…quais foram os investimentos que garantiram esses ganhos?
O pesquisador Marcos Landell, do IAC, nos ajudou a fazer um diagnóstico. E a partir dos insights dele, percebemos que precisávamos melhorar nosso conhecimento do ambiente de produção, ou seja, mapear o ambiente de produção. Trabalhamos então com a Ambicana. Além disso, com o professor Gaspar, fizemos todos estudos para a realização da nutrição vegetal. Montamos um time muito bom com a missão de entender os ambientes de produção e fazer o planejamento varietal adequado aliado a um modelo bastante técnico de nutrição e defesa vegetal. Nossa equipe agrícola foi muito colaborativa no sentido de contribuir com esse plano e de adotar o modelo agrícola como uma ferramenta de longo prazo. Construir um ambiente favorável para produtividade se expressar foi fundamental.
Mas é claro que tivemos que cuidar também a indústria. Em termos de rendimento, tempo aproveitado, produtividade. A indústria, pela escala, ajuda muito, mas claro que tivemos que fazer investimentos de entressafra expressivos. Quanto maior a moagem, maior será a necessidade de manutenção. Mesmo assim, paulatinamente, fomos recuperando a indústria e hoje ela está compatível com a média do setor. O objetivo é ter uma usina nos princípios da indústria 4.0, com automação e no top five de rendimento.
Nos anos 2000, a Usinas Itamarati chegou a ser a maior do Brasil, moendo 6 milhões de t, número que acabou caindo ao longo dos anos seguintes. Hoje moer muito é importante como foi no passado ou trabalhar com bons resultados é mais importante ser financeiramente mais saudável?
Essa é a pergunta certa. Não adianta moer muito se você está pagando arrendamento caro, se está trazendo cana de longe, se você tem ineficiência de CTT, se tem muita área de baixa produtividade por hectare. Não adianta eu ter cana em áreas onde a colheita é dificultada, não adianta ter 6 milhões de t com média de 60 a 70 TCH. Então, moer muito é bom porque traz ganho de escala, mas tem que moer muito transformando isso em um vetor de redução de custos. Sendo assim, mais do que o crescimento frontal, queremos o crescimento vertical. Queremos mais cana nas mesmas áreas. A gente não quer expandir por expandir. Queremos que cada crescimento de produção seja um fator de redução de custos. Por exemplo, fizemos um modelo em que a usina era 75% cana própria e 25% de terceiros. Mudamos para um modelo 50%-50%. Como? Arrendando terra própria para fornecedores competentes.
Nos concentramos em ter um raio médio pequeno, aproveitando o transporte mais eficiente, e no tamanho da operação agrícola que seja compatível com os níveis adequados de custo. Escala por si não diz nada. Ela é significativa na medida em que funcione como um vetor de redução de custos e aumento de produtividade.
Como foi o processo do repasse de áreas para produtores. Como ficou essa relação entre UISA e fornecedores?
Foi uma operação ganha-ganha. Criamos um projeto Fortalecer, fizemos implementações, apresentamos para um conjunto de fornecedores as regras, todos os mecanismos que tínhamos de incentivo. Foi uma forma de oferecemos a eles condições para crescerem em volume e em um ambiente estruturado, com arrendamentos compatíveis com o custo de produção. Estabelecemos regras de incentivo. Junto com a transferência das áreas criamos o incentivo financeiro a renovação de canavial. Transformamos isso numa ferramenta de fortalecimento porque criamos metas de qualidade, de plantio e vinculamos isso a aceleração do pagamento de dívidas antigas e a novos benefícios. Aliado a isso, criamos uma corrente ganha-ganha. Um fornecedor de 100 mil toneladas virou um fornecedor de 200 mil t com apoio técnico, com ajuda da nossa equipe no sentido de cálculos de viabilidade e investimento. Separamos essa área do agrícola, criamos uma gerencia de originação de matéria-prima, para gerir esse relacionamento. Toda a cana, seja própria ou de terceiros é tratada no mesmo nível hierárquico dentro da usina, e isso funcionou bem.
E, sem dúvida, acredito que o caminho é esse. A criação de sistemas integrados de produção é o caminho. Essa relação usina-fornecedor pode ser tratada de várias formas e cada região tem suas especificidades, mas acredito que temos que pensar na construção de sistemas integrados de fornecimento de matéria-prima, que sejam mutuamente benéficos. A nossa característica regional e dos nossos fornecedores permitiu que fizéssemos isso muito rapidamente.
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Como foi a safra 2019/20 para a UISA?
Acabou no final do mês de novembro. Esse ano nós tivemos a pior seca na nossa região desde 1988. Foi uma seca severa com estresse hídrico brutal de junho a outubro. Não choveu. Foram quase 146 dias sem chuva e 169 dias em estresse. O fato de termos 26 mil há, dos quais 7 irrigados/fertirrigados, ajudaram a mitigar. Mas foi uma seca notável. Isso fez com que perdêssemos um pouco o desempenho de canavial, claro. Mesmo assim, ficamos satisfeitos porque foi um evento extremo que provou a nossa resiliência. A produtividade média em área própria, que estava prevista para ficar bem acima dos 94 deve ficar em torno de 92 TCH, ou seja, tivemos uma produtividade muito adequada. Não tivemos perdas no sentido de ter que replantar ou erradicar áreas.
Estamos ampliando nossa capacidade de irrigar para nos prevenirmos no futuro. Temos um modelo muito bem estruturado de utilização de fontes de água com outorgas. Vamos ampliar a capacidade de irrigar as mesmas áreas. No futuro pensamos em aumentar as áreas, mas num primeiro momento vamos apenas aumentar a lâmina de água na mesma área.
Qual é a previsão para o início da produção do etanol de milho?
Esperamos ter etanol de milho e DDG no final do primeiro semestre de 2021. Vejo o mercado nacional de etanol em um cenário muito benigno nos próximos anos. E o Mato Grosso será consumidor muito importante da demanda gerada pelo RenovaBio, pelo crescimento de consumo que temos verificado e pelos compromissos da COP21. Acredito que o etanol de milho é uma das fontes que irão viabilizar a consolidação definitiva do etanol na matriz energética brasileira. A competitividade no milho como matéria-prima no Mato Grosso é incontestável e se você associa as vantagens competitivas e de custo do milho a vantagem de termos geração de energia e biomassa própria, um projeto de usina flex como a nossa é muito competitivo. É quase uma obrigação a gente fazer.
Fala-se muito do biogás como coproduto do setor, no entanto, todos os protótipos de biogás ainda não chegaram em um custo de produção competitivo. Como a UISA pretende produzir biogás?
As novas tecnologias de biogás acabaram de ultrapassar o patamar da viabilidade técnica e econômica. Temos certeza de que estamos entrando nisso no momento certo. Já existem tecnologias especificas já entrando em operação que são extremamente competitivas. Então, vejo que chegou o momento do biogás e estamos enxergando isso como uma oportunidade.
Em uma operação como a nossa ou como qualquer outra indústria de processamento de matérias-primas agrícolas que você processa um monte de carbono, quanto de valor se está extraindo das moléculas de carbono? Quanto de tudo que você transforma nas moléculas de carbono você está transformando em benefício econômico ao meio ambiente? A vinhaça, a torta de filtro são fontes ricas que devem ser aproveitadas e a biodigestor é o caminho natural de aproveitamento dessas matérias-primas. Esse é um desafio que vale a pena enfrentar.
Expectativa para a safra 2020/21? O que esperar?
Temos um planejamento estrito para cinco anos. Nós prevemos 5,5 milhões de t e estamos nos preparando para isso. Como estamos começando os últimos testes do modelo para orçamento, podemos ter uma pequena variação entre 5,4 a 5,6 milhões de t, mas o target do plano de cinco anos é atingir os 5,5 milhões para 2021. Com relação ao Renovabio estamos concluindo nossa auditoria e entrando em consultoria pública. O RenovaBio certamente não é a panacéia que veio acabar com todos os males, mas certamente é um gatilho importante da retomada do investimento, da criação de alternativas para o setor.
Mas. No entanto. Desse modo. Mas. No entanto. Desse modo. Mas. No entanto. Mas.
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