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Edição 189

Como a nova lei sobre terceirização vai impactar o setor?

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De acordo com o autor, se bem aplicada, a terceirização poderá trazer inúmeros benefícios as usinas e produtores de cana

*Fábio Luiz Pereira da Silva

O termo terceirização corresponde ao ato pelo qual o empregador delega a outra pessoa jurídica a execução de serviços necessários ao seu empreendimento. Neste caso, a execução de serviços se dá por meio de empresa interposta, que assume a responsabilidade pelos recursos humanos e materiais necessários. Temos, assim, uma tríplice relação jurídica, que envolve: 1) o tomador dos serviços terceirizados; 2) o prestador (empresa interposta); e 3) a mão de obra (empregados), que se vincula e é remunerada pelo fornecedor dos serviços.

Este fenômeno não tinha previsão na legislação brasileira com abrangência geral. Há apenas algumas leis próprias, aplicáveis apenas a determinadas atividades. Agora, a Lei nº 13.429, de 2017, visando dar segurança jurídica em torno do assunto, regulamentou, de maneira ampla, a terceirização no Brasil.

O QUE DIZ A NOVA LEI?

Em primeiro lugar, é preciso dizer que a nova lei trata de dois temas: 1) o trabalho temporário; 2) a prestação de serviços por terceiros (terceirização).

1) Trabalho temporário, inclusive no meio rural

A nova lei excluiu a vedação que existia na anterior quanto ao trabalho temporário em ambiente rural. Assim sendo, a partir deste momento o trabalho temporário também está permitido para serviços agropecuários, o que pode ser muito benéfico para as indústrias sucroenergéticas. De agora em diante, além de ser permitido em meio rural, o trabalho temporário tem as seguintes regras:

a) Somente pode ser firmado com empresa de trabalho temporário (intermediadora) que esteja registrada no Ministério do Trabalho. Não é permitida a intermediação por pessoa física;

b) Deve haver contrato escrito entre a tomadora dos serviços e a empresa de trabalho temporário, devendo conter todas as regras do art. 9º da lei;

c) Este contrato pode ser estipulado quando houver necessidade de substituição transitória de pessoal permanente (em períodos de licença-maternidade, por exemplo), mas está vedado para a substituição de trabalhadores em greve;

d) Também pode ser ajustado para atender demanda complementar de serviços oriunda de fatores imprevisíveis ou, quando decorrente de fatores previsíveis, tenha natureza intermitente, periódica ou sazonal, o que é muito comum em ambiente rural, dada a sazonalidade das lavouras;

e) A empresa contratante deve garantir condições de segurança, higiene e salubridade dos trabalhadores, quando o trabalho for realizado em suas dependências ou em local por ela designado;

f) A tomadora dos serviços estenderá ao trabalhador da empresa de trabalho temporário o mesmo atendimento médico, ambulatorial e de refeição destinado aos seus empregados, existente nas dependências da contratante ou local por ela designado;

g) O contrato de trabalho temporário pode versar sobre o desenvolvimento de atividades-meio e atividades-fim a serem executadas na empresa tomadora de serviços;

h) O contrato de trabalho temporário não poderá exceder ao prazo de 180 dias consecutivos, podendo, se mantidas as condições da contratação, ser prorrogado por até 90 dias;

i) Fica vedado estipular contrato de experiência com o trabalhador temporário, contratado posteriormente pela tomadora de serviços;

j) O trabalhador temporário somente poderá ser colocado à disposição da mesma tomadora de serviços em novo contrato temporário após 90 dias do término do contrato anterior;

k) Se não respeitados os requisitos retro, haverá caracterização de vínculo de emprego diretamente com a tomadora dos serviços;

l) A contratante é subsidiariamente responsável pelas obrigações trabalhistas referentes ao período em que ocorrer o trabalho temporário, isto é, não há responsabilidade solidária;

m) O contrato de trabalho celebrado entre empresa de trabalho temporário e o trabalhador será, obrigatoriamente, escrito e dele deverão constar expressamente os direitos assegurados.

Segundo Silva, serviços como
plantio de cana poderão ser
terceirizados

Lembrando que, além dos direitos já consagrados na legislação aos trabalhadores em geral, os temporários têm direito, ainda, a remuneração equivalente à percebida pelos empregados de mesma categoria da empresa tomadora.

2) Terceirização

A Lei nº 13.429, de 2017, também regulamentou, de forma ampla, a terceirização no país, a qual passou a ser admitida em quaisquer atividades, exceto aquelas com normas próprias, como no caso da vigilância bancária. Muito tem se debatido em vários veículos de comunicação acerca do alcance e efeitos da nova lei, inclusive com “previsões” sobre futuros entendimentos da Justiça do Trabalho em torno do tema.

É certo também, como fartamente divulgado, que o Governo Federal já cogitou editar Medida Provisória para alterar a nova lei, bem como sinalizou incluir adaptações na Reforma Trabalhista que se avizinha. Entretanto, enquanto nada disso ocorre, analisando objetivamente a nova norma, a partir de agora está autorizada a criação de “empresa prestadora de serviços a terceiros”, permitindo a terceirização de serviços “determinados e específicos”. Deste modo, tem-se claro que a terceirização aprovada não é irrestrita. Como sempre defendemos, a terceirização, ainda que de atividade-fim, está sempre atrelada à especialização do serviço a ser desempenhado. Por isso, a lei estabelece que somente será possível para atividades específicas e determinadas, devidamente individualizadas no contrato. Este instrumento, portanto, passou a ser documento primordial para o bem proceder da terceirização e, desta forma, deve ser muito bem redigido e acompanhado.

Outros pontos importantes da nova lei:

1) Não existe mais a distinção entre atividade-fim e atividade-meio, que antes constava da Súmula nº 331 do TST, sendo permitido agora terceirizar serviços em qualquer delas, observado que os serviços devem ser determinados e específicos;

2) A empresa prestadora de serviços contrata, remunera e dirige o trabalho realizado por seus trabalhadores, ou subcontrata outras empresas para realização desses serviços, passando a ser permitida então, a “quarteirização” da gestão da mão de obra;

3) É vedada à contratante a utilização dos trabalhadores em atividades distintas daquelas que foram objeto do contrato com a empresa prestadora de serviços, os quais, como já dito, devem ser determinados e específicos;

4) Os serviços contratados poderão ser executados nas instalações físicas da empresa contratante ou em outro local de comum acordo entre as partes;

5) Garantia de condições de segurança, higiene e salubridade aos trabalhadores terceirizados;

6) Possibilidade de estender ao trabalhador da empresa de prestação de serviços o mesmo atendimento médico, ambulatorial e de refeição destinado aos empregados da tomadora;

7) Responsabilidade subsidiária da tomadora dos serviços terceirizados referentes às obrigações trabalhistas do período em que ocorrer a prestação de serviços;

8) Além dos requisitos do art. 4º-B da nova lei, será necessário capital mínimo para as empresas prestadores de serviço, graduados de acordo com a quantidade de empregados, variando de R$ 10 mil a R$ 250 mil;

9) Obediência às obrigações previdenciárias previstas na Lei 8.212, de 1991, com retenção de 11% da fatura de serviços de cessão de mão de obra a título de contribuição previdenciária;

10) Inaplicabilidade às empresas de vigilância e transporte de valores, permanecendo as respectivas relações de trabalho reguladas pela legislação especial.

Como frisamos, para que haja efetiva segurança jurídica na contratação de serviços terceirizados, há necessidade de contrato escrito, com os requisitos do art. 5º-B incluído pela nova lei. Ademais, há necessidade que o contrato seja minucioso, bem redigido, com previsão de comprovações periódicas relativas às obrigações da prestadora de serviços, além de multas e outras penalidades. Por outro lado, de nada adiantará um contrato bem elaborado se não houver uma prévia análise da idoneidade da contratada, bem como o posterior monitoramento e a fiscalização das atividades, evitando a precarização das relações e, consequentemente, responsabilização da tomadora dos serviços. Por fim, é relevante salientar que a nova lei não está autorizando o encerramento de contratos de trabalho para constituição de empresas pelos demitidos e recontratação como “pessoas jurídicas”, o que se denomina “Pejotização”. Esta prática, se adotada, continua a ser considerada fraude e dela decorrerão as consequências já previstas em lei para os infratores.

BENEFÍCIOS PARA O SETOR

Bem aplicada, a terceirização pode trazer inúmeros benefícios para o setor. Por exemplo, o serviço especializado de plantio mecanizado, a partir deste momento, pode ser terceirizado para empresa idônea e capacitada para execução desta atividade. Vale lembrar que a terceirização envolve não só o custo da mão de obra, mas também de equipamentos de alto valor, cujo uso não é necessário o ano todo para a usina. Já para empresas especializadas, o equipamento poderá ser utilizado por mais tempo, com prestação de serviços a diversos tomadores, justificando o investimento e produzindo economia de escala.

Por outro lado, é bom salientar que a terceirização irrestrita, sem a necessária precaução contratual e de pesquisa de idoneidade financeira da empresa contratada, bem como desacompanhada da fiscalização contínua dos serviços executados, pode levar à precarização do trabalho prestado, implicando na responsabilização da usina e invertendo a relação custo-benefício.

*Fábio Luiz Pereira da Silva é coordenador da Área Trabalhista do Escritório Pereira Advogados

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